sábado

Estudante

Publicado a 17-06-08
Um livro de Psicologia Aplicada. Um caderno cheio de apontamentos. Uma pasta com uma resma de fotocópias de matéria dada na aula. Uma sebenta acabada de comprar como auxiliar de estudo. Uma bolsa com esferográficas e marcadores de cores diversas. Uma chávena de café. Um prato cheio de migalhas. Um pacote de lenços. Um pedaço vazio ao canto da mesa que faz parte do sofá encostado à jukebox do Espaço Magnolia. Lúcia envolve-se num estudo compenetrado. Tudo o que acontece ao seu redor, escapa à sua atenção. Até mesmo o facto de as mesas do Espaço já terem as cadeiras em cima e a funcionária estar prestes a encerrar o estabelecimento. Para além de Lúcia, há um cliente que ainda se mantém dentro do Espaço. Mas acaba de sair. Lúcia tem um ar irritado, descontrolado, ainda assim silencioso. Clarisse acaba de arrumar a última cadeira. Durante cinco segundos pára e olha para a sua última cliente. Ela realiza que uma das moradoras do Edifício Magnólia está noutro mundo. Liberta um sorriso e chega junto ao sofá onde Lúcia está sentada. Depois de riscar um pedaço de folha do caderno, ela bate com a ponta da lapiseira no conjunto de folhas, partindo um pedaço de carvão. Só depois de suspirar com força, Lúcia apercebe-se da realidade. Clarisse está diante de si, ainda com o avental encobrindo o seu corpo, com o cabelo apanhado e o pescoço húmido.
- Estás bem? - pergunta a funcionária.
- Não me consigo safar com isto. Nunca me vi tão lixada para passar a uma cadeira.
- Posso ajudar?
- Preciso de ajuda...Definitivamente. Mas nesta não creio que me possas ajudar.
- Então no que é que eu te posso dar uma mãozinha?
- Tenho assim um ar tão expressivo de quem precisa de ajuda?!
- Tens um ar abatido. Disso tenho a certeza...Não é costume ver-te assim, Lúcia.
- Sabes lá a minha vida....
- Vou só desligar a máquina de café e fechar a porta. Depois disso tenho o tempo todo para me contares a tua vida...
Lúcia leva as mãos à cara, assumindo o cansaço que a hora e o esforço pelo estudo esbateu na sua face. Ela bate com a lapiseira em cima do caderno, procurando perceber se ainda tinha paciência para continuar o estudo. Tentando descortinar em poucos segundos se teria coragem de desabafar os seus problemas emocionais com a funcionária de um café. Fecha o caderno e olha para Clarisse. Em tempo reduzido, a empregada passa o pano pelo balcão, desliga a máquina do café, desliga a maioria das luzes que iluminam o Espaço e percorre o estabelecimento até à porta de entrada. Cerra as cortinas, muda a placa do estado de funcionamento do café e encerra a porta. Retorna o passo e depois de confirmar que apenas sobrava uma ligeira luz de presença, aproxima-se da jukebox e introduz uma moeda. Carrega num botão e de seguida volta a sentar-se no sofá, junto a Lúcia. A face de Clarisse é reveladora. Demonstra seriedade. Demonstra dedicação. Revela tacto. Transparece confiança. Em silêncio, ela move a cabeça para a última cliente da noite e prende a respiração. Lúcia suspira e rende-se ao conforto.
- Não me consigo concentrar. Não dá! É impossível. E eu sei que já é tarde. Mas não consigo estudar em casa... Não tenho vontade, não tenho cabeça e sufoco só de estar ali.
- É a Tania?
- Uhm?!...Ah...A Tania?!!
- Sim!...Achas que não é visível que vocês as duas têm qualquer coisa?
- Pois...quer dizer...talvez tenhas razão...mas nós agora...bom.. não temos qualquer coisa... tivemos...
- Queres falar?
Lúcia cinge o olhar na amiga. Na novel amiga. Na amiga de circunstância. Clarisse é uma funcionária exemplar. Conhece os clientes. Aproxima-se com tacto deles. Sabe quando é o momento certo para um sorriso, para uma palavra, para um gesto. Sem pedir nada. E os clientes aproximam-se dela. Sentem-se envolvidos. Pelo seu sorriso, pela sua ternura. Pela sua surreal forma de ser. Clarisse é apenas mais um pedaço sublime deste Espaço. O elemento humano, mas transcendente à realidade. E a jovem morena que mora no 2º esquerdo sempre guardou um carinho especial pela funcionária. Claro que toda a gente que entra no Espaço o sente. Mas esse é o dom de Clarisse. Ser genuinamente especial aos olhos de cada cliente. E agora que ela acaba de entrar na bolha fervilhante de Lúcia, agora que ela conquistou a confiança dela para um desabafo, tudo é possível. Porque isto já é mais do que uma amiga de circunstância.
- Fiz merda....Fiz uma grande merda e a culpa nem sequer é minha...
Com palavras pesadas, com pensamentos que fluem como um barco no meio de uma tempestade, Lúcia desabafa. Conta o que se passou no 2º esquerdo. Desde o inicio. Desde que ela conheceu a Tania e arrebatou uma porção inimaginável do seu coração. Ilusão ou paixão, as palavras dela sobre a vivência no peculiar apartamento prosseguem para tudo o que tem estado preso num nó seco na garganta. Os primeiros beijos, a rendição de Tania, o beijo do namorado dela, a Joana, a paixão no jacuzzi, as noites quentes em ambos os quartos e tudo o que antecedeu o fatalidade da revelação na sala do apartamento. Clarisse ouve. Sem evidenciar o cansaço que naturalmente invade o seu corpo depois de um dia cheio de trabalho, a jovem morena escuta as peças do dilema que afecta a sua cliente e amiga. Encosta-se à almofada vertical do sofá e coloca um cotovelo no topo do mesmo. A mão segura a cabeça e um sorriso discreto caracteriza o seu semblante.
- Nem sequer a Joana quis acreditar.... Ninguém acredita se eu disser que pensava contar-lhe naquela noite sobre o beijo...
- Eu acredito...
Quarenta e dois minutos depois de Lúcia confessar à funcionária que tinha feito asneira, a estudante recebe as primeiras palavras reconfortantes, desde que Tania lhe fechou a porta na cara. Aquela confissão de Clarisse gera impacto. Talvez ela nem o tenha dito com convicção. Mas encheram o peito de Lúcia. E ela pura e simplesmente cessa de falar. Olha para Clarisse e procura uma reacção. Porque ela acaba de congelar. A funcionária do Espaço Magnolia expande o sorriso. Bonito, comovente, sensual. Lúcia sente um arrepio interior. Algo a invade e ela não sabe o quê. Algo mudou aqui dentro e ela tenta perceber onde. A ténue luz ambiente tranquiliza a mente, é um facto. É surreal que uma moeda na jukebox faça rodar tanta música sublime incessantemente. O sofá parece mais mole do que quando Lúcia se sentou ali, depois da hora de jantar. Ainda assim, ela sente um impacto forte a recair sobre si. Clarisse não se move. No entanto, parece que ela se aproxima constantemente. Será o cansaço dos olhos de Lúcia? Será apenas uma confusão de percepções na sua mente? Na verdade, a estudante fixa agora toda a imagem da amiga. Os dedos entrelaçados nos cabelos negros. O corpo tem tendência a pender para diante. Até os enormes seios de Clarisse parecem mais descobertos, mesmo que debaixo do top azul. Ela pressente as pupilas dos olhos da funcionária a dilatarem. As maçãs do rosto ruborizam suavemente, mas é evidente que existe algo químico a transformar-se. Lúcia percebe. Lúcia entende. Lúcia respira fundo. Morde o lábio inferior e cerra as mãos. Os lábios de Clarisse palpitam. E quando Lúcia se prepara para humedecer os olhos cansados, fechando as pálpebras, vê a cabeça de Clarisse aproximar-se.
- Não!...Não consigo fazer isto... - confessa Lúcia.
- Fazer o quê? - pergunta Clarisse com um suposto ar de surpreendida.
- Ias beijar-me...
- Eu ia beijar-te ou tu achas que eu te ia beijar?
Depois de acelerar o ritmo da respiração, Lúcia volta a sentir um nó na garganta. Cansada, confusa e agora envergonhada. Ela de facto não pode confirmar que Clarisse a ia beijar. Foi uma percepção, talvez uma ilusão. Possivelmente uma ideia que a sua própria mente quis criar. Porque Lúcia não consegue negar a si mesma a apetência por uma jovem como Clarisse. Bonita, sensual, carnalmente voluptuosa, serenamente cativante. Estaria a enganar-se a ela própria, se considerasse que a funcionária do Espaço Magnólia não a atrai sexualmente. E não é de agora. Apesar de todas as inerências. Não obstante o facto de a sua cabeça ainda estar a reagir a um desespero sentimental, Lúcia mergulha num desejo com poucas chances de retorno.
- Não sei... Desculpa... estou baralhada... Desculpa... Desculpa se achava que te estavas a atirar a mim...
- Não peças desculpa...
- O que queres que diga?
- Se te decides por beijar-me ou não...
Lúcia está perdida. Noutra ocasião, noutro local, ela já teria arrumado os livros, os cadernos, a mesa inteira, e ter-se-ia entregue ao cansaço, deitando-se na cama. Mas ela está no Espaço Magnólia. Há algo que a move. Que a obriga a manter-se acordada, que a incita a sonhar. Nem tentando ela consegue esquecer a Tania e tudo o que tem envolvido pensar nela. Mas há um aperto no coração. Muito forte. Há casaco de forças que a prende e que impede o regular funcionamento do seu quotidiano. E se não há solução à vista quanto ao perdão da colega de casa, ela sente que de alguma forma tem que gritar. Tem que libertar a ansiedade que se espalha pelo seu corpo. O vazio que se tem acumulado no seu espírito atormenta-se. Na indecisão da jovem estudante, Clarisse invade os lábios da cliente. De imediato, a mão da funcionária segura a face intranquila de Lúcia. A estudante sente-se arrebatada. Na pressão frenética de ideias dentro da sua mente, ela sabe que aquele beijo contraria tudo aquilo com quem tem vindo a batalhar nos últimos dias. Mas enfim, a sua vivência tem sido uma constante contradição de quereres, desejos e concretizações. Clarisse beija divinalmente, cheira a feitiço e carrega em si a certeza de ambicionar uma relação carnal feminina.
- Agora que me beijaste, vais querer ir embora? - pergunta Clarisse.
- Não...
Esta é a resposta mais confiante que Lúcia se recorda de ter dado nos últimos tempos. A entrega da funcionária é confirmada quando o seu peito volumoso se descobre por completo. Clarisse despe o top com um sorriso e percebe o fascínio que toma conta da face da amiga. Surreal. O Espaço remodela-se. Ganha um novo sentido. Modifica o seu ambiente. E não é só a iluminação que altera as tonificações de cada recanto. No sofá, a aura que se intensifica parece que pinta um enorme foco de luz nas duas jovens. Porque toda a energia se concentra ali. Nas mãos de Lúcia que procuram tocar no corpo da funcionária. Na boca fina de Clarisse que faz vibrar a pele macia da cliente. Em cada peça de roupa que se desfaz no chão do café. No empurrão que aperta a moradora do Edifício contra o encosto do sofá, ao mesmo tempo que recebe mais um beijo fogoso. Na ponta dos dedos que tatua a pele húmida de Clarisse. Nos cadernos que caem da mesa, pelos movimentos bruscos das mulheres. Na música que fortalece o ambiente de emoções fortes. No tecido do sofá que aquece os corpos despidos. Na dança que elas roçam entre si mutuamente, na tentativa de conhecer a carne da amante. E tudo deixou de ser o que se entendia como normal. Lúcia entrega-se a alguém no meio de um turbilhão de sentimentos. Clarisse torna o local de trabalho num autêntico recanto erótico, intimo e seu. Por esta noite, o sofá deixou de ser um local de refeições. Após a hora de encerramento, o Espaço Magnolia é a concretização de um desejo transcendente.
É inesperado. A noite já nem sequer consegue acompanhar o decorrer das horas. É tarde. Muito tarde. Não há movimento na rua. É mágico. O interior do Espaço é mais privado do que nunca. Em cima do assento do sofá, Clarisse está deitada de lado, vestida apenas com uma tanga rendada azul. À sua frente, também em cima da almofada do sofá, Lúcia está deitada de lado, envolta no braço direito da nova amante. A área é reduzida, as jovens não são propriamente esguias, mas o desejo torna tudo possível. A mão de Clarisse é aventureira. Meiga, perspicaz, intensa e ousadamente aventureira. Por entre as coxas sobrepostas de Lúcia, ela roça os dedos nos lábios vaginais. Pressente as reacções dela e beija o ombro tépido e macio da estudante. Lúcia suspira. Sente o braço esquerdo da amante preso entre a almofada e o seu corpo, com a mão a segurar o enorme seio. Ela tem os mamilos quentes e os bicos rijos, fruto da ansiedade misturada com a excitação. Ao mesmo tempo, sente as mamas da amiga a roçar nas suas costas. Lúcia quer concentrar-se e ter consciência de quem é na verdade a rapariga que a está a masturbar. Porque o cansaço é evidente em todas as reacções da jovem. A suavidade com que Clarisse acaricia o seu sexo deixa-a ainda mais relaxada, mais absorvida numa emancipação do sono. Mas ela quer. Ela precisa que explorem os seus anseios, os seus medos, as suas explosões intimas de desejo. Não é Tania que está nas suas costas. O corpo que se aperta nas suas costas é semelhante. O toque das mãos é quase idêntico. As mamas que se esborracham contra a coluna fazem lembrar os seios grandes, gelatinosos e redondos da sua colega de casa, outrora amante, agora utopia. Clarisse dedica-se. Tem consciência do cansaço da sua cliente e toma conta dela. Faz questão de entregar gestos e caricias, transportando-a para onde a funcionária entende que é o caminho. E esse trilho é macio. É intenso. Reconhece-se com a palma da mão cheia da funcionária, percorre-se no ventre terno de Lúcia, divaga-se no peito de Clarisse que se move, roçando em toda a extensão das costas da amante. A estudante aceita-se na condição de apoderada. Controla a sua respiração, fecha levemente os olhos e vagueia na surrealidade do momento. A mão esquerda acaricia o seu outro seio. A mão direita segura a mão da amante. Talvez a conhecer o membro que ela não conhece. Talvez a pedir um pouco mais. Clarisse insiste na caricia ao exterior da vagina de Lúcia. Ainda assim, a ponta dos seus dedos quer mais. Procura penetrar, mas é muito apertado. Na persistência dessa apetência, a responsável pelo encerrar da porta deste café movimenta o joelho direito e abre espaço entre as pernas da rapariga. Com as coxas abertas, o sexo mais liberto, Lúcia deixa que os dedos anelar e médio da mão direita da amante consigam perfurar por entre os seus lábios vaginais. Um gemido. Um suspiro. Uma vibração em todo o corpo que altera o batimento do coração de Lúcia. A jovem funcionária entende o nervosismo da amiga. Com o punho sobre a anca dela, a circulação da rapariga masturbada parece fervilhar. Clarisse liberta um sorriso e prossegue a ousadia. Com uma coxa erguida, pousada sobre o joelho da amante, Lúcia continua a entregar-se à paralisia corporal, ainda que excitada intimamente. Coloca o pé na ponta da mesa e abre ainda mais a sua rata. Pressionada com o joelho de Clarisse, bem como os dois dedos que penetram com vigor no seu âmago, Lúcia derrete-se. A sua mão esquerda agarra os dedos da amiga, transportando até à boca o indicador direito de Clarisse. A jovem chupa o dedo à medida que percepciona a excitação que invade a sua mente. As ancas de Lúcia movimentam-se ligeiramente, incitando a parceira a masturbá-la com mais convicção. E Clarisse sabe o que faz. Delira com o que faz. Esfrega a rata alheia com mais intensidade e com mais ritmo, perturbando a serenidade da amante. A imagem é sublime. Num local inusitado, numa hora despropositada, o Espaço Magnólia vive um momento absolutamente excitante, proibido e excêntrico. Em cima do sofá, algo é libertado. Poderá ser o casaco de forças psicológico que Lúcia quer romper. Poderá ser o desejo carnal de Clarisse a atingir o seu ponto mais alto. Poderá ser a posição ousada e indescritivel que este adereço do café experimenta. Amanhã alguém se vai sentar aqui para tomar o pequeno almoço. Amanhã alguém vai escolher esta mesa para partilhar um batido com uma pessoa amiga. Amanhã esta será um dos poucos lugares vagos para conseguir almoçar uma salada. Amanhã, depois de tantos pedidos distintos, Clarisse vem trabalhar com a certeza de que este lugar lhe pertence. Como uma posse que jamais alguém procurará igualar. Amanhã, não importa a hora, este sofá terá ganho uma história, um sentimento, uma magia, um traço único desenhado pelas mãos de Clarisse no sexo de Lúcia. Porque será memorável voltar a imaginar o orgasmo que a inquilina do 2º esquerdo solta neste instante, em que a mão da funcionária parece ser engolida pela rata da amante e que com gemidos profundos, a estudante chupa o dedo da parceira. Amanhã, este sofá deixa de pertencer ao estabelecimento. Por agora, Lúcia sente as mãos da amiga a vaguearem pelo seu corpo. Sente os lábios dela a beijarem-na depois do orgasmo. Sente o peito da funcionária a debruçar-se sobre o seu. Amanhã, Clarisse ainda vai levar o dedo da mão direita à boca. Suavemente, levemente. Irá com certeza conseguir sentir um leve sabor da vagina encharcada de Lúcia. Amanhã, o sofá alcançará um lugar especial na memória da duas jovens e na fantasia de quem alguma vez ousar sonhar que duas mulheres se envolveram sexualmente e espiritualmente ali.
- Tenho que ir... - confessa Lúcia, abrindo os olhos a custo.
- Não precisas...
- Sabes que sim. Não te posso levar para minha casa. Não tenho coragem de adormecer com alguém...Para além do mais, estou morta de cansaço.
- Estás melhor?...
- Amanhã irei percebê-lo...
- Se tomares o pequeno-almoço aqui comigo, talvez mo possas dizer...
- Clarisse...desculpa...não sei se isto foi um erro ou não. Mas mesmo que não seja, eu não quero nenhum envolvimento.
- Nem eu o pedi...Nem to vou pedir. Compreendo o que sentes mais do que possas imaginar...Curtimos. Eu gostei. Tu também pareces ter gostado. Um dia voltaremos a repetir. Quando...não sei... Só quero que tenhas uma boa recordação do que aqui se passou.
- Já tenho...
- Então, pode ser?... Amanhã?...
Hoje, em que os olhos de Lúcia já não se aguentam abertos. Hoje, que algo pareceu diferente na vida de Lúcia, por uns momentos. Hoje, que ela experimentou algo inigualável. Hoje, que um pedaço do que aprisiona a sua mente foi solto. Hoje, que a paixão e o desejo carnal superaram qualquer ilusão amorosa. Hoje, Lúcia é uma mulher tranquila. Quando acordar, tudo voltará ao mesmo. Possivelmente. Mas quando se sentar neste sofá, com dezenas de pessoas à volta, com um sumo de laranja natural e uma torrada, Lúcia irá soltar um sorriso efémero, surreal mas consolador.

sexta-feira

Professora

Publicado a 16-06-08
Na condição de ser professor. Na subtil honra de ensinar outrem. Na progressiva e incessante capacidade de obter conhecimento e difundi-lo. Na postura séria, confiante e de respeito que dai pode advir. Nas infinitas virtudes comunicativas e psicológicas que o podem caracterizar. A dedicação de Maria José pelo seu estatuto de professora universitária faz espelhar a imagem de uma mulher concreta, audaz e decidida. Na teoria, claro. Como ser humano, carregado de racionalidade, sentimentos, paixão, opinião e quantos outros elementos capazes de influenciar a linear utopia da frieza, Maria José está exposta às fraquezas que revelam os seus receios, os seus desejos, os seus segredos e as suas ansiedades. Ninguém é perfeito. Nem mesmo encarnando o perfil de uma das mais nobres e antigas profissões da Humanidade.
A porta do 1º direito. Respira harmonia. Transpira graciosidade. Ganha vida com as mãos de Maria José assim que ela abre a porta ao seu cunhado. Henrique entra com naturalidade pela porta dentro, sorrindo para a mulher.
- Olá, Henrique... Vieste ver se o teu apartamento está em condições?....
- Tenho que zelar pelo bem das minhas preciosidades.
Um elogio. Palavras doces. Gestos únicos e irrepetíveis do homem que mexe com a professora de uma forma original e inexplicável.
- Sabes que estou meio ocupada...não sabes? - diz ela.
- O puto está ai?
Um ataque. Suave, sem malícia. Dirigido à fraqueza da mulher pela sua maturidade conselheira. Uma palavra assim saída da boca de Henrique tem um efeito perturbador na consciência de Maria José. Ainda assim, ela estica os lábios e entrega um olhar de reprovação pelo comentário.
- O Paulo está a trabalhar...Mas eu estou à espera de um aluno...Estou a preparar a hora de explicações.
- Vou incomodar?!...
- O que estás aqui a fazer, Henrique? Eu disse-te ao telefone que podíamos combinar para outra altura.
- Estás linda hoje.
Uma saia. Azul escura. Seda. A blusa florida que cobre o tronco dela com uma moda primaveril encaixa no ar reluzente que o seu cabelo curto loiro espalha. Ao elogio, Maria José despedaça-se.
- É a renda?... O condomínio? Eu já tinha dito à vizinha que o pagava amanhã.
- Cheiras tão bem como da primeira vez que te conheci.
- Henrique...e se combinarmos para amanhã? Na faculdade. Almoçamos. Falamos do que quiseres.
- Gosto de te ver assim com um ar feliz.
- O que é que tu queres, Henrique?...Não vês que estou ocupada?
- Porque é que me andas a evitar?
- Não te estou a evitar...
- Parece que estás com medo de mim...
- Porque haveria de estar?
- Por receio da evidência.
- Que evidência, Henrique?
- Diz que não anseias por estar comigo...
Um gesto. A mão de Henrique invade a anca de Maria José, assim que o corpo dele se encosta à postura ligeira da mulher. Ela sente-se arrebatada. Se as palavras dela acompanhassem a reacção do seu corpo, Maria José já teria demonstrado um sinal de prudência. Talvez tivesse afastado o corpo. Talvez recusasse a mão imponente de Henrique numa curva sumptuosa da sua figura. Talvez lançasse mais um olhar reprovador ao homem que a segura. Talvez dissesse algo evidente e concreto. Maria José inspira fundo e fecha levemente os olhos, ao invés de tudo o que poderia fazer. Balançada nas mãos dele. Embalada no charme inconfundível do homem. Embevecida no carinho do cunhado. Entusiasmada pela procura da simbiose do senhorio. Excitada pela confrontação sexual apresentada por Henrique. Ela quer resistir. Ela sabe que tem que resistir. É imperioso que a tentação não absorva o seu bom senso.
- Henrique...
- Tu não queres...Eu sei que tu não queres.
- Henrique...por favor...
- Eu sei...é o carteiro...não podes...não deves...
- Não, Henrique...não faças isso....
- Eu não quero fazer nada...Eu sei que o amas e que não me queres....tu não queres isto...pois não?
- Henrique!
Mas ele conquista-a. Inevitavelmente. Porque ele é o amante dela. O amante que a resgatou de uma apatia sentimental. O amante que lhe ensinou uma nova perspectiva de ver verdades escondidas. O amante que desencadeou o turbilhão de uma nova vida. O amante improvável. O amante proibido. O amante desejado. O amante irrecusável. Henrique hipnotiza o bom senso de Maria José e ela cede. Era imperioso que a professora não esgotasse a racionalidade dos seus sentimentos. O beijo que a sua boca procura nos lábios do seu cunhado é um salto sem pára-quedas. A dedicação de Maria José baseia-se na previsão, antecipação e moderação da sua capacidade de mudar o conhecimento de outros. Mas neste momento, é ela que está entregue à dedicação de Henrique. A cognição da mulher está nas mãos de um amante que sempre foi seu.
Como uma imagem. Como um pedaço de algo que lhe pode pertencer. Como algo a ser observado. Para reflectir. Para pensar. Até mesmo para se deixar levar e guardar toda a excitação. Como um pensamento. Como uma ideia que vai subsistir por toda a sua consciência. Um atropelo de desejo. Uma inconsciência não delimitada pela serenidade da personalidade e pela maturidade da idade. Como uma aprendizagem em tempo incerto. Como uma ambição intima que se transforma em ímpetos corporais. Pensar. Agir. Reagir. Reformular. O sofá é demasiado apetecível e confortável. Querer. Sentir. Desejar. Respirar. Desfrutar. O tempo escasseia na mente de Maria José e no desejo de Henrique. Entrar. Sair. Penetrar. Gemer. A mulher está deitada nas almofadas da peça de mobiliário da sala. Mesmo defronte da mesa de centro, onde várias papeladas demonstram que ela se estava a preparar para um hora de explicações. As suas pernas estão abertas, levantadas e dobradas. A sua blusa ainda lhe cobre o tronco, mas a saia já não lhe cobre as coxas. Está puxada para cima, vincada, presa à cintura. Pedir. Inspirar. Tocar. Assimilar. O corpo dela assume uma posição fetal, mas em vez de estar deitada de lado, está de barriga para cima. As suas mãos procuram segurar-se. O seu coração necessita de se aguentar. A sua consciência tenta suportar. Morder. Dilatar. Dar. Sonhar. Henrique está deitado em cima da amante. Também ele está praticamente vestido. Tem apenas as calças e os boxers presos aos joelhos. O seu corpo prende-se por entre as pernas da cunhada, ao mesmo tempo que penetra nela. Apaixonar. Guardar. Chamar. Permear. Há um abraço fascinante na envolvência dos dois amantes. Ela está embrulhada nele, envolta nos braços carinhosos de Henrique. O queixo dela sustém-se no ombro dele, ao mesmo tempo que a voz da mulher pede e geme. As mãos dele seguram a cabeça da professora, chamando o desejo dela para si. Os seios apertados da quarentona apertam no peito do proprietário do 1º direito. As pernas de Maria José envolvem-se na cintura dele, esmagando as ancas de Henrique. A rata da mulher dilata-se, as coxas dela levantam-se um pouco mais e ele entra nela, sem movimentos muito bruscos. Terebrar. Consolidar. Falar. Acariciar. O desejo de Henrique transformou-se na concretização da ansiedade de Maria José. Ela sempre soube que isto era inevitável. Ela nunca quis negar que ainda deseja o corpo, a maturidade, a envolvência, o calor que ele carrega e o conhecimento que o seu cunhado detém de si mesma. É uma afronta à graciosidade da professora. Ao seu bom senso. À sua moralidade de perceber o amor, a paixão e a intimidade. Foi assim que Henrique a libertou de uma prisão mental de quase vinte anos. Foi desta forma que Henrique sempre entrou na vida dela. E Maria José nunca recusou. A mulher sempre foi frágil perante a virilidade dos gestos dele, a benevolência das atitudes do homem, a elegância com que ele entra na sua mente e no seu corpo, o desejo, o fervor e a ansiedade que a saída dele provoca em cada pedaço de si. Maria José precisa do homem. Reve-se no que ele já lhe entregou. Abraça-se às penetrações do seu sexo vigoroso. Deleita-se com a forma como ele a prende a si. Aquecer. Falar. Transformar. Suplicar. Em cima do sofá, por entre um ar quente que se respira na sala, junto das folhas que não resistem à brisa que sopra no espaço, os dois amantes fodem com uma entrega indefinida, indescritível, interminável. Porque o tempo existe mas deixou de morar ali. Maria José abre e fecha os olhos conforme a intensidade das penetrações e das caricias de Henrique. Quando tem os olhos abertos, ela entende o alcance da paixão dele. Percebe que aquela sala transformou a sua forma de amar, desejar, exigir de si mesma. O seu corpo vibra. O pescoço humedece, os lábios tremem, as mãos cingem uma força vigorosa nas costas dele. Com os olhos abertos, Helena delira com a foda que aceitou do seu amante. Perceber. Exigir. Vibrar. Alcançar. Quando os seus olhos cerram, algo se dissipa. O seu corpo cede e os gemidos intensificam-se. Ela vem-se e toda a sua percepção se modifica. Uma ideia surreal, que percorre vários pedaços momentâneos da sua vida, enche-lhe a imaginação. Com os olhos cerrados, Maria José pergunta a si mesma o papel do carteiro neste instante da sua vida. Fincar. Abrir. Inserir. Rasgar. Gritar. Intensificar. Suar. Apertar. Retirar. Exprimir. Delirar. Aproximar. Vir. Libertar. Foder.
A campainha toca e o abraço desfaz-se. Henrique continua a segurar a nuca da mulher, encostando a face ao seu peito. O seu sexo entrou por completo na vagina de Maria José. O peso do seu corpo insiste na ideia de que ele a possuiu e que detém algo demasiado importante na vida da professora. Ela sabe quem é. Sabe onde está. Mas não sabe o que pensar. A exigência do momento. A pressão do acontecimento inesperado, bloqueia a sua percepção. Com as mãos, ela exige ao amante que se retire de cima dela. Henrique obedece. Ele está consciente. Desestabilizou a professora. Retirou-a de uma postura confiante e acima de tudo confrontou o respeito que ela pode sentir pela sua personalidade e até pela dedicação que tem às tarefas que faz. À porta do Edificio Magnolia pode estar qualquer pessoa. Nem Maria José sabe. Pode ser o aluno que ela aguarda para mais uma hora de explicações, da qual ela levou a manhã inteira a preparar. Pode ser um vizinho. Pode ser alguém do qual ela nem está a perspectivar. Mas também podem ser cartas. Contas, publicidade, correspondência da faculdade. Pode ser o carteiro que faz a ronda junto à hora de almoço. Pode ser Paulo. Maria José levanta-se e ajeita a saia. Amarrotada. Suja. Carregada de evidências de um momento que ela queria recusar mas não conseguiu. Há um semblante sinistro na face da professora. Certifica-se que a blusa está composta e que Henrique já vestiu as calças. Com as maçãs do rosto rosadas, com o pescoço envolto em suor, com um nó na garganta, Maria José abre a porta. Jovem, caloiro, rapaz de aldeia, educado. O aluno que requisitou os serviços da professora para uma hora de explicação debate-se com uma situação estranha. Assiste ao sorriso imenso e prolongado da mulher e depara-se com o silêncio do homem que ele não conhece. Maria José pede ao aluno para entrar, feliz por saber que não era Paulo que tocava à campainha. Apresenta o homem como senhorio da casa e pede ao jovem aluno para se sentar no sofá. O mesmo onde ainda se deve guardar um leve aroma sexual. Apesar de perceber a desarrumação na mesa de centro, o rapaz não ousa formular pensamentos perversos sobre o que pode ter ocorrido antes dele ter chegado. Henrique começa a despedir-se. Percebe que está a mais nesta situação. Não obstante a ousadia de entrar pelo lar dela adentro, seduzi-la e encantá-la para uma foda intensa, Henrique respeita a carreira da sua cunhada. Nem se atreve a lançar qualquer comentário que seja. Apesar disso, antes de sair, ela segura com delicadeza o braço macio da mulher, dá-lhe um beijo na maçã do rosto e sorri para ela. Ao mesmo tempo, percebe o sentimento que transparece na cara suada dela. Maria José sabe que cedeu. E encontrar uma forma de olhar de novo para Paulo, não sendo impossível, é ansiosamente dificil.

quinta-feira

Empresários

Publicado a 12-06-08
É uma familia. Vive numa casa com todas as condições. Acolhedora, bem decorada, intima e dotada dos equipamentos necessários para viver mais em casa. No entanto, a familia que reside no 1º esquerdo do Edificio Magnólia ocupa pouco tempo em conjunto. Exceptuando o jantar, e ainda assim nem sequer é uma rotina, o casal e os dois filhos raramente vivem a casa como uma família. De manhã, toda a gente sai de casa a horas diferentes. Primeiro, Rodrigo. Toma banho sozinho, beija a sua mulher ainda na cama, e come qualquer coisa na cozinha com o filho mais novo, antes de sair com a carrinha para o trabalho. O adolescente, que já se prepara para ir para a escola, ainda consegue estar com a mãe, que se levanta minutos depois. Quando o filho mais velho está em casa, acompanha Helena no pequeno almoço. Isto até ela sair de casa, directa para o escritório. Talvez cada um dos membros possa justificar esta distanciamento com o trabalho, com a dedicação que entregam diariamente às tarefas que enchem os seus dias. Mas eles sabem. Eles escondem. Eles habituam-se. Há uma grande dificuldade em conciliar conversas, segredos, partilhas de sentimentos, gestos, sentimentos. São uma família. Sem dúvida. Amam-se, de uma forma genuína. Protegem o seio da família, num jeito peculiar. Transmitem fraternidade, se for possível definir este sentimento. Mas é inegável que o empenho profissional engole o tempo desta família quase perfeita.
São quase dez horas. Rodrigo já cumpriu o seu primeiro serviço. À hora estipulada, com o orçamento indicado ao cliente, num profissionalismo competente. Depois de passar pelo escritório e confirmar que a sua mulher efectuou o mapa de trabalho do dia seguinte, o empresário antecipa-se ao pedido da sua próxima cliente. Filipa pediu à empresa do casal um planeamento de um sistema de vigilância numa vivenda geminada. Filipa é uma mulher madura. Filipa nasceu numa aldeia do interior do país e com vinte e dois anos veio para esta cidade, abraçando um desejo de menina. Filipa tem trinta e seis anos, loira e com um corpo bem modelado, com curvas vistosas. Filipa passa por uma mulher sensual, no entanto isso apenas serve para esconder a sua aparência falsamente esbelta, absurdamente desleixada e de uma faceta espalhafatosa. Filipa é secretária da mesma empresa de camionagem onde o marido trabalha. Sim. Filipa é casada e tem um filho.
Reunião em casa. No mínimo duvidosa. Aliás, pelos olhares trocados por ambos na garagem do Edifício, a reunião será tudo menos um encontro profissional. Já no elevador, percebe-se que a discussão sobre o plano tem que ficar adiada. Não se fala de negócios quando os lábios dela estão a ser comidos pela boca dele e quando as mamas dela estão a ser apalpadas pelas mãos de Rodrigo. A mulher tem um corpo fogoso. O rabo é perfeito e ela faz questão de o exibir com as calças de lycra algo pindéricas. Os seios são redondos e saltam à vista com o top sem alças que Filipa veste. Brancos, suaves e palpitantes, dão a sensação de não quererem ficar cobertos com o pedaço de tecido. Ela ansiava por este momento. Uma das razões que a levou a contratar a firma de Helena e Rodrigo foi a atracção carnal que sentiu de imediato pelo homem. E era uma questão de tempo até Filipa conseguir agarrar o desejo de Rodrigo. Ele cede. Traz a mulher casada para o lar do seu casamento. Porquê? Na mente dele não está a tesão de poder desfrutar de uma mulher como a sua cliente loira. Não. Na sua imaginação está a ideia de que Helena, neste instante, pode estar com Alberto no escritório. No seu inconsciente, está uma ideia recalcada de vingança. Se a sua esposa pode envolver-se com clientes, então ele também sente poder fazer o mesmo.
No quarto de casal. A traição consome-se. Filipa está ajoelhada no chão, próxima da cama desconhecida. Com dedicação, com vigor, com excitação, com um deboche irresponsável, a mulher abocanha o sexo de Rodrigo. Sem paixão. Não existe um pedaço de consciência na entrega corporal. Ele agarra os cabelos loiros da amante e incentiva-a a chupar. Gosta da forma quente e selvagem como a mulher coloca o seu sexo dentro da boca, agarra os seus testículos e roça a língua e os lábios em toda a carne. Filipa não se apaixonou pelo empresário. Não sentiu algo diferente na sua consciência quando o viu pela primeira vez. Não repensou o seu casamento duas vezes, julgando encontrar um homem diferente. Para ele, Rodrigo sempre foi apenas sexo. Ela sentiu algo diferente na primeira vez que entrou no escritório e o encontrou. Uma arrepiante sensação de querer devorar este homem vigorosamente charmoso. E é isto que ela demonstra, ao gemer enquanto chupa, ao levantar o olhar enquanto engole o pénis, ao chupar com mais força a cada gemido do amante. O seu top já deixou descobrir os seios por completo. Grandes, firmes, pálidos, com os bicos entesados. Roçam nas coxas dele, destapadas das calças que estão agora junto aos seus tornozelos. Não há que desmentir. Filipa chupa bem, sabe o que faz, gosta da forma como o faz. E Rodrigo sente-lo. Excita-se com cada envolvimento da boca dela. Tem as pernas a tremer com a intensidade do broche. O que acontece de seguida é uma explosão de desejo, uma libertação de loucura, um deleite hipnotizante. Filipa saboreia. Rodrigo vibra com a entrega da mulher. Ela retira o sexo da boca e enquanto o segura, levanta a cabeça e olha para o amante com um sorriso.
Em cima da cama. A mulher já está despida. As suas roupas espalham-se no chão. O seu desejo estende-se em cima do colchão. Com as pernas abertas, virada para ele, Filipa anseia para que o desejo carnudo dela a penetre. Rodrigo sente que a mulher se entrega de uma forma demasiado fácil. Desde o primeiro olhar que ela lhe dirigiu, o homem sabia que estava a ser seduzido. Numa noite intima com a esposa, Rodrigo atormentou-se com a ideia de imaginar Alberto, o seu cliente, nesta mesma cama com Helena. E desde então, uma fúria invadiu-o. Filipa tornou-se o escape ideal para este tormento corrosivo. Ela transformou-se num alvo apetecível para o despejo dos seus ciúmes. Diante de Rodrigo, está uma mulher quente, que tem tanto a perder como ele. E no fundo, sentem que estão os dois a ganhar. O homem segura as pernas dela. Levanta-a, tomando posse do corpo da mulher. O seu instinto comanda-o. A rata inchada e húmida de Filipa é estimulante. Palpita com a ansiedade. Dilata-se com a sede de ser penetrada. Entrega-se sobejamente ao sexo de Rodrigo. Ele deita-se sobre a amante e expande as coxas dela. Filipa tem as pernas no ar e coloca as mãos em cima das costas dele. Na cama de um casal habituado a traições. No leito de uma história familiar. No local mais inusitado de um lar, Filipa pertence ao homem que a traz para esta casa desconhecida. Enquanto mexe as ancas, enquanto faz entrar o seu sexo entesado dentro da vagina da sua cliente, enquanto prova o fruto proibido de outra mulher casada. Enquanto toda a cópula ocorre, Rodrigo saboreia os seios peculiares de Filipa e pensa no motivo que o fez procurar uma nova amante. Segura os seios redondos e gelatinosos e recorda a chamada de voice mail de Alberto. Chupa os bicos rijos e imagina o homem no escritório a galantear Helena. Beija o vale dos seios, aperta as mamas contra a sua face e deduz na sua mente se a sua esposa se vem com um homem mais velho que ela. Lambe as mamas excitantes e só consegue imaginar o corpo nu da mulher a quem ele colocou a aliança entregue às mãos maduras de Alberto. Rodrigo fode a mulher com despudor, com garra, com firmeza. Ele irrompe pelo sexo da mulher, com a face apertada nas mamas de Filipa. Mas ele não está ali. Ele está no escritório da sua empresa. Ele assume o papel de Alberto a foder Helena em cima da secretária. Porque ele pressupõe com uma certeza perigosa, de que a mulher a esta hora da manhã só quer deliciar-se com um sexo de um cliente. Nessa mesma pressuposição, Rodrigo deleita-se da mesma forma com a excitação que uma cliente lhe pode dar.
O édredon engelhado. Um suave odor à excitação que se solta dos poros de Filipa. Um estranho ruído saído da boca da mulher casada vai confirmando a Rodrigo de que a amante é histericamente especial. A posição dela é aguerrida. De gatas sobre o colchão, ela empina o rabo, mesmo junto à cintura do homem. Ajoelhado por detrás da mulher, ele agarra nas nádegas ruborizadas dela. Acaricia-as, expande-as, deixando uma brecha para poder penetrar. Apesar da indecisão dele, não obstante a excitação que Filipa manteve durante uns segundos pelo facto de não saber onde o amante iria entrar dentro de si, Rodrigo acaba por encher a rata da loira. A mulher afasta um pouco mais as pernas e sente a carne masculina a abrir o seu intimo. A boca de Filipa abre-se e solta um longo gemido. Depois, ela sorri. Os seus olhos cerram suavemente e ela goza as penetrações do seu novo amante. Rodrigo procura entrar o mais fundo possível, antes de parar novamente para reflectir. Diante de si está uma mulher quase estranha. Tem as costas húmidas mas carregadas de desejo. Ainda assim, ele percebe que não é paixão que o move. Não foi um sentimento inevitável, intenso e inesperado que o invadiu quando convidou a sua cliente Filipa para uma reunião mais intima. Não foi a apetência irresistível por uma mulher, que mesmo denotando curvas sensuais, está longe de ter um perfil que deixe Rodrigo extasiado. Aliás, ao longo de todo o envolvimento, a cada penetração, ele apercebe-se que Filipa se entrega a ele como se poderia render a qualquer homem maduro que a fizesse sentir loucamente entesada. Não importa o risco que possa correr. Não interessa o que daí pode advir. Por isso, não é paixão que move Rodrigo a foder a mulher com dedicação. Enquanto a mulher deixa cair a cabeça sobre o colchão, agarra o édredon com os dedos e liberta gemidos descontrolados, Rodrigo vem-se na rata da mulher, sabendo que é a fúria ciumenta que controla esta foda.
Pacificação. Rodrigo está deitado na cama, com o sexo ainda entesado. Ele olha para o tecto. Helena e Alberto ainda fodem na sua mente. Mas o seu momento já terminou. Filipa também está estendida na cama ao seu lado. A loira deita.se de costas para cima, com o rabo ligeiramente empinado. A face dela mantém um sorriso apesar do ar exausto. O olhar dela dirige-se ao seu novo amante. Ela está satisfeita por mais um momento extra-conjugal bem sucedido.
- Posso fumar um cigarro? - pergunta ela.
- Não...ela iria perceber.
- Bolas...sabes que me entesa fumar depois de foder?...
- Também te mata...
- Há quanto tempo fazes isto?
- O quê?!
- Trair a tua mulher...
- Não sei ao certo...
- Há quanto tempo não consegues viver sem resistires a outra rata?
- As coisas não funcionam assim. Eu...
- Há quanto tempo?...
- Três anos e meio...
- Com quem?
- Com a única grande amiga que ela tinha nesta cidade. Afastou-se dela por vergonha. A minha mulher nunca chegou a perceber. Mas eu continuei a vê-la durante seis meses.
- Achas que vale a pena? Todas as traições. Todas as mentiras. Todas as aventuras.
- Claro que não. Eu sei que estou a trai-la. Sei que ela não merece. Sei que ninguém merece. Mas é mais forte do que eu. Sei que um dia vou ser apanhado ou até eu vou desistir de ser tão cabrão.
- Não vais.
- Achas que me conheces para afirmar isso?
- Sei que não vais. Sou casada há onze anos e infiel há dez anos e meio. Antes de trocar as alianças era a rapariga mais santa da minha aldeia. Sonhava com um casamento eterno, com um marido que me protegesse e com a pureza do amor. Tenho um filho com oito anos e continuo a comer o professor dele na hora de almoço. Todas as sextas feiras. Amo o meu marido. Sou uma mulher dedicada. Uma mãe atenciosa. Mas desde que comi o cunhado dele, seis meses depois de estar casada, que não consigo deixar de ser infiel.... Ele estava a cinco metros de mim e não percebeu nada. E isso ainda me continua a entesar... Acredita no que eu te digo, Rodrigo. Não vais conseguir deixar de trair a tua mulher.
- Não sou como tu...
- Claro que não és....
Mas estão a partilhar a mesma cama. É este o sentimento que o olhar de Filipa tenta transmitir ao pensamento do homem que a recebe no seu quarto, depois da frase solta irónica.
Seis horas. Uns minutos mais. Helena chega a casa na mesma rotina de sempre. Mas a ansiedade move-a. A sua casa está vazia. O marido cumpre uma parte importante do seu dia de trabalho, com serviços em casas de clientes. O seu filho mais novo tem um jogo de futebol marcado com amigos. O seu filho mais velho está na universidade, onde segundo ele, a namorada o acompanha desde o inicio da semana. Helena tenta ser racional e fazer o raciocínio que outrora não tinha coragem de desenvolver. Na mente da mulher, está a ideia de que Rodrigo não foi trabalhar, Sandra não foi para a cidade universitária e o seu filho não está com a namorada depois das aulas. Para Helena, é uma certeza quase óbvia de que o seu marido e a sua jovem amante estão juntos em qualquer lugar insuspeito, cometendo uma traição desmesurada. Se ela o está agora a aceitar fazer, porque é que o seu marido não haveria de estar? Miguel esperou por Helena à porta do Edifício Magnólia e subiu com ela ao 1º esquerdo.
Encontro em casa. A desculpa está montada. A justificação é mais do que plausível. A margem de erro é mínima. Miguel tocou à campainha da casa dos filhos de Helena à procura do adolescente, para também ele ir jogar à bola. O atraso do jovem fez com que ele se cruzasse com a mãe em vez de ser com o irmão do seu melhor amigo. O filho mais novo da mulher irá sempre corroborar esta versão, porque na verdade, Miguel faltou ao encontro com o rapaz. Helena tem o álibi, mas acima de tudo, tem uma justificação íntima e pessoal para ceder novamente aos encantos do irresistível jovem. Nos encontros com Miguel, ela sempre se feriu a si mesma, na sensação de estar a cometer uma traição incomensurável. Envolver-se com alguém tão novo, precisamente o melhor amigo do seu filho, é algo que corrói o seu bom senso. E mesmo que ela tenha tentado prometer a si própria que iria resistir à tentação, algo mais forte tomou conta de si. O ciúme. A inveja. A vingança. Se o seu marido pode comer uma rapariga nova, que para além do mais é namorada do seu próprio filho, Helena também sente que não deve controlar os seus desejos mais inusitados. Isto é irracionalidade. Ela sabe. Ela pensa nisso. Mas imaginar Rodrigo a foder Sandra na cama de solteira da jovem arrasa a sua consciência. E despir o vestido no hall de entrada do apartamento, diante do jovem entesado, não lhe parece assim tão pecaminoso.
No centro da cama. Com os dedos dos pés fincados no édredon que já foi puxado para trás. Com os calcanhares a segurar o seu corpo. Com os joelhos dobrados diante da presença dele. Com o corpo dele entre as suas pernas abertas. Com as mãos finas no peito dele, a equilibrar o seu corpo. Com o olhar fixo no sorriso dele. Helena está em cima da cama, nua, numa posição de tronco erecto que lhe permite ter o o amante debaixo de si, sob as suas ordens e os seus desejos. Miguel está deitado de barriga para cima, na cama que não lhe pertence. O seu semblante transpira uma confiança exacerbada, mediante o sorriso que não sai da sua face. Ele sabe que consegue enfeitiçar a mulher madura e trazê-la para junto de si. Quase de uma forma que lhe retira qualquer responsabilidade do acto. A mulher casada, mãe de filhos, quarentona, entrega-se a ele de uma forma inevitável. E fazer deslizar dois dedos por entre os lábios vaginais húmidos de Helena parece demasiado fácil. Mas ao mesmo tempo é intenso, estimulante, escaldante. A posição da mulher torna o processo de masturbação ainda mais simples, mais deleitoso. Ela fecha suavemente os olhos e deixa-se levar. Miguel penetra-a com os dedos macios e desliza-os pelos lábios, ao mesmo tempo que o polegar toca levemente no clitóris. Sim, Helena está enfeitiçada. Sabe que é a mão do jovem que a toca. Goza cada momento. Ainda assim, por detrás dos seus olhos escuros fechados, na profundeza da sua consciência, está a transformação de uma imagem que ela quer apagar, mas que pura e simplesmente não consegue. A mão jovem de Miguel é tenaz. Atenciosa. Meiga. Aventureira. Tímida mas ansiosa. Indecisa mas macia. E estas características devem assentar que nem uma luva às mãos de Sandra quando esfrega o sexo do seu marido. E a visão que ela tem, no obscuro da sua imaginação, torna realidade esta ideia. Porque enquanto Helena geme e procura controlar a respiração com a masturbação, ela pressente o orgasmo que o seu marido liberta diante da face da jovem. Perverso, mas inevitável. É também desta forma que Miguel consegue fazer explodir o clitóris da sua amante.
Por entre os lençóis. Helena está sentada em cima do seu amante. Os joelhos fazem força no colchão e os dedos dos pés suportam a estabilidade do resto do seu corpo. Dentro da sua rata está o pénis comprido de Miguel. E ela já não está ali. Assume uma posição de domínio perante o parceiro, mas está sedada pela carne vigorosa do homem que está debaixo de si. Se estivesse na mente da sua mãe, o filho mais velho de Helena estaria provavelmente aterrado. O seu pai parece apoderar-se da sua namorada. A mãe entrega-se com pouca aparência de remorsos ao seu melhor amigo. E isto também invade a mente de Helena. É forte. É assombroso. É irreversível. Ela pula em cima do corpo de Miguel e pressente cada penetração. A sua cabeça pende um pouco para a frente, um pouco para trás. Os seus cabelos vão-lhe cobrindo a face. Ela morde o lábio carnudo inferior e sente de novo as mãos suaves dele. Desta vez nos seus seios morenos e bicudos. Carinhoso e penetrante. Os seus gestos deixam a mulher extasiada. Encantada com a forma como o jovem entra dentro de si, Helena pende o seu corpo ligeiramente para trás e coloca as mãos no colchão, nas suas costas, ao lado dos joelhos dele. Cada movimento é uma erupção de sentimentos carnais, que se espelham na forma como o seu corpo reage. Mas por mais que Helena possa sentir um prazer, de novo orgásmico, na foda com o amigo do seu filho, ela carrega em si a imagem do seu marido a vir-se na rata de Sandra.
Repouso. Os joelhos dela continuam dobrados. Mas o seu tronco está deitado sobre o corpo do amante. Miguel acaricia os cabelos negros da mulher e guarda a respiração dela, que vai tranquilizando suavemente. De olhos abertos, ela procura voltar a si. Perceber porque é que tudo isto voltou a acontecer. entender porque é que o ciúme a move. Aceitar que há uma mistura perigosa na entrega da paixão. As suas mãos estão presas entre o colchão e as costas dele.
- Posso fazer-te uma pergunta? - solta ele.
- Eu tenho medo das tuas perguntas, Miguel.
- O que farias se o teu filho descobrisse?
- Porque é que perguntas isso?!! Achas que ele sabe de alguma coisa?! Contaste-lhe?!
- Não!...Relaxa...Mas...nunca pensaste nisso?
- ...Claro que já. Todas as noites. Em cada momento que olho para ele, sinto que não me consigo perdoar. E morro de cada vez que imagino a reacção dele, se ele soubesse.
- Mas continuas a fazê-lo, Helena.
- A culpa é tua...
- Desculpa?!...
- Eu sei que não é....A culpa é toda minha. É difícil saber o que fazer... o que pensar... o que não pensar. O meu erro foi ter aceite a primeira vez. Deveria ter recusado. Eu sei que deveria.
- Achas que é tarde para voltar atrás?
- Miguel....já não há volta a dar! Eu ando a comer o melhor amigo do meu filho. Que raio de mãe sou eu que para além de ser infiel ao marido, ainda se envolve com os amigos dos próprios filhos?! Eu não quero que duvidem que gosto do meu filho. Não quero! Mas sei que isto é errado. Engano-me a mim mesma quando quero pensar que até és maduro. Mas tu és...sempre foste... vais continuar a ser... Eu estou aqui com um garoto! E sinto-me incrivelmente louca quando estou contigo. Só posso estar louca. O que se passa comigo?! Se ele descobre...acho que a minha vida deixa de...Bolas, estou a cometer um erro tão grande!!
- Queres parar? Queres cortar com isto? Queres que eu deixe de aparecer?
- ....Não sei...
Ele fica incrédulo, olhando para a mulher que entretanto ergue a cabeça, denotando uma imensa desorientação.
A familia é um puzzle. As pessoas são ilhas que se procuram encaixar numa união familiar. Os laços que se geram dependem do tempo que todos dispendem mutuamente. Se uma familia tem compromissos a horas diferentes em lugares diferentes, há laços que se cortam. Se os sentimentos não correm na mesma direcção, moldam-se em formas distintas, é natural que as peças do puzzle custem a encaixar. A amante de Rodrigo saiu do 1º esquerdo de imediato. Levantou-se depois de ter lançado a frase irónica e deixou o homem com um enorme peso de consciência. Enquanto Filipa se vestia, ele encaixava o seu papel, ao ter-se envolvido com uma cliente da qual ele única e simplesmente sentiu tesão. Miguel decidiu sair debaixo do corpo de Helena, ao perceber a confusão da mulher madura. Na ingenuidade pouco inocente do jovem, ele quis guardar, ao final da tarde, uma certa distância de uma evidência clara. Helena corrompe todo o papel de mãe e esposa ao enfeitiçar-se com o sexo recebido de um rapaz. Ele sai do apartamento e ela fica na cama. Nua e inconsolável. São duas peças. Sabem as formas que representam num casamento e o encaixe que devem criar com dois elementos fundamentais. Os seus filhos. A dedicação ao trabalho, exigente e carregado de responsabilidade, serve-lhes de camuflagem para vidas duplas, para puzzles com lados distintos. E a imperfeição já nem sequer mora aqui ao lado.

quarta-feira

Instrutor

Publicado a 09-06-08
- Eu não preciso de ti, Matilde...
- Achas mesmo?
O Espaço Magnolia prepara-se para encerrar. Há clientes que saem, mas há clientes que teimam em ficar até todas as cadeiras estarem em cima das mesas, até o chão começar a ser limpo pelos funcionários, até a jukebox cessar, até as cortinas dos vidros serem corridas, até restar uma pequena luz ambiente, até muito depois de ser colocada a placa na porta com a inscrição "Encerrado". A pessoa que encerra o estabelecimento poderia até não gostar do incómodo criado por alguns clientes. Mas este espaço de tempo faz parte da rotina dos empregados do Espaço. Afinal, o lugar é mesmo surreal. Modifica as pessoas. E a dedicação dos trabalhadores do café faz com entendam que um dos motivos para alguns clientes resistirem tanto tempo, é para viver a magia que se vai desvanecendo quando o estabelecimento encerra. Porque o Espaço Magnolia transforma-se depois da hora de fecho. Rafael e a sua jovem amante estão neste momento a sentir isso. Num dos sofás, já sem qualquer bebida para tomar ou pedido para fazer, insistem em continuar a conversa que já dura há alguns minutos. Vasco, o empregado de serviço, aceita. Magia. Surrealismo. Dedicação.
- Tu não és homem de não atender chamadas, Neves...Rejeitar, talvez. Atender e mandar-me à merda, é possível. Mas não deixas que o telefone toque incessantemente.
- Onde queres chegar?
- Tu pensas em mim... Tu sonhas comigo. Tu precisas de mim. Eu sei-o.
- E eu é que sou o presunçoso...
- Tu queres arranjar uma forma de me levar para a cama e não te sentires culpado à frente da putazinha.
- Eu vou-me embora...Vou esquecer que estive aqui contigo. Vou tentar rejeitar as tuas chamadas mais vezes...
- Mente-me, Neves... Diz-me que não estás ansioso por comer a minha rata.
- Tu és louca...O Vasco quer ir para casa. Eu também vou. Acho que devias fazer o mesmo.
Não é essa a ideia de Matilde. A jovem sobrinha da outra amante de Rafael está preparada para sair. Depois de jantar, depois de ligar duas vezes para o telemóvel do instrutor de equitação, depois de tocar à campainha do 3º esquerdo, depois de ninguém atender, depois dela encontrar o homem a entrar no Espaço, Matilde estava pronta para o levar a uma discoteca, na baixa da cidade. Rafael recusou. Rafael mandou-a embora. Rafal não conseguiu ceder às palavras escaldantes da rapariga, bem como à mini-saia que ela veste ou ao top com um decote profundo. Matilde prende o homem dos seus desejos a um café que já dura há meia-hora. E na cabeça de Matilde estão duas opções. Ou ele a acompanha em danças quentes num sitio carregado de barulho ou a leva já para a cama. E até Rafael sabe que é difícil resistir à tentação. Ainda assim, despede-se de Vasco, pede desculpa e sai do Espaço Magnolia. Sem qualquer outra solução, a rapariga corre atrás dele. Entre a porta do Espaço e a entrada do Edificio, Matilde agarra no braço do homem. Ele suspira, com um ligeiro sinal de aborrecimento. Inesperadamente, a jovem salta para o colo de Rafael, segurando os braços ao pescoço dele. O homem sente-se desprevenido. O homem não a pode simplesmente largar no chão. O homem leva as mãos ao rabo da jovem e segura o corpo dela. A boca cremosa dela está quase colada aos lábios de Rafael. Os olhares trocam-se.
- Por favor, fode-me....Eu sei que também queres.
- És uma miúda tão mimada, Matilde...
Rafael sente-se preso à vontade da jovem. A tentação de ter o corpo dela nas suas mãos. A intensidade de sentir a suavidade, o calor e a carne das nádegas de Matilde confunde o discernimento masculino. As garras sensuais da sobrinha de Cristina crivam-se no desejo de Rafael.
Está quente. O calor acumulado durante o tempo em que o sol bateu com toda a sua força contra as janelas do topo e as paredes do patamar, tornou o local incómodo. A noite já vai longa mas ainda há um bafo que se faz sentir junto à porta de acesso ao terraço. No último lance de escadas do Edificio Magnolia, a presença de dois corpos faz aumentar a temperatura. Ouvem-se gemidos. É um tom de voz notoriamente excitado, entusiasmado, ansioso. A meio deste lance de escadas, Matilde está encostada à parede. Tem as alças do top pelos cotovelos e o seio esquerdo desnudado. Tem o pescoço suado, tem os cabelos a taparem-lhe parte da face. Tem o rabo suave encostado à parede tépida e os pés não assentam no chão. As mãos dela agarram-se à nuca do seu amante. Aperta a cabeça do homem contra o seu corpo, entre as pernas. Para além da respiração intensa e pesada que ofega da sua boca, para além do entusiasmo que a sua rata trespassa para o resto do seu corpo, Matilde sabe que não precisa de se concentrar em mais nada. Rafael segura todo o peso do corpo da jovem sobre os seus ombros. A sua estatura encorpada permite-lhe carregar a figura da amante e ao mesmo tempo deliciá-la. Ele tem as mãos no rabo macio de Matilde, abrindo um pouco mais as pernas dela. E em tudo isto existe uma dedicação única. Para além de encostá-la à parede e manter os seus pés a metro e meio do chão, Rafael procura dar um prazer controlado à jovem, lambendo o sexo feminino com mestria e ao mesmo tempo saboreá-lo. Os lábios vaginais de Matilde estão inchados e colam-se à boca do homem. Ela sente cada toque da lingua, cada mordidela terna no clitóris, cada sopro na pele ansiosa. Ela voa quando a boca dele penetra na sua rata. Ela sente o peito a explodir quando o seu âmago é resgatado pela sede do amante. Ela acalma o coração quando ele pára vagarosamente de lamber e roça os lábios nas suas virilhas. E o desafio de Rafael é manter a jovem no ponto que ele pretende. A gemer, baixinho. A tremer, sem exageros. A vibrar, em cada canto do corpo dela. A mantê-la calma, sem nenhum imprevisto desconfortável. Apesar da hora já ser tardia. Mesmo que aquele lance de escadas não seja muito frequentado pelos outros moradores. Ainda que fosse dificil alguem pressupor que estaria alguém a ter relações sexuais num patamar de acesso do Edificio. Rafael sabe que todo o cuidado é pouco. Conhece também os orgasmos da jovem Matilde. Intensos, descontrolados, audíveis e extravagantes. E o que está a acontecer no quinto e sexto degrau do último lance de escadas é apenas uma cedência de Rafael. Uma fraqueza de alma, uma inevitável derrota à tentação. O corpo de Matilde é jovem e escaldante. É descomprometido e puro. É um deleite para todos os sentidos e é-lhe entregue de mão beijada. Esta cedência ao desejo descomprometido é momentânea. Rafael não a quer levar para casa, não a quer deitar na sua cama, não quer que ela adormeça ao seu lado, não quer a conversa de circunstância ao pequeno-almoço. Não com a mimada Matilde. Por tudo isto, o minete em local ousado, em posição arrojada, é a forma ideal de ceder às garras dela.
Ele é instrutor. Para Rafael não é uma questão de tempo, mas sim de oportunidade. O sexo oral dura há já alguns minutos e há apenas um sinal de que pode continuar indefinidamente. Matilde sabe o que o homem está a fazer. Entende o porquê. Saboreia a razão. Delicia-se com a atitude. Fantasia com a entrega. De olhos fechados, cabelo a suar, pescoço húmido e seios entesados, ela sente o seu prazer prolongar-se. Ele dispõe de todas as suas capacidades para lamber, acariciar, chupar e beijar a rata da jovem. É um processo. É uma aprendizagem. É uma forma de saber dar aquilo que ela não espera receber de outro homem. Matilde sabe que mais ninguém a lambe como Rafael. Matilde entende que vale a pena procurar Rafael e exigir que ele a foda. Matilde oferece todo o seu desejo, paixão e loucura a um homem que não a quer, apenas a come. É uma crua verdade, mas Matilde aceita-a. É uma atitude fria, mas Rafael submete-se a ela. Porquê? O que leva um homem confiante de si mesmo, descomprometido, detentor de um leque de mulheres que anseiam por um final de tarde com ele, a ajoelhar-se perante o desejo de uma rapariga presunçosa? Ele não precisa dela. Ele sabe a que ponto ela se pode colar a ele. A jovem é excitante, é irresistivel. É hipnotizante. É uma alma alucinante, num corpo diabólico. O minete que ele lhe entrega com tanta dedicação, com uma convicção de que a vai prazentear, com a certeza de que o toque da sua boca vai ficar tatuado nos lábios vaginais, é um feitiço. E apesar de Rafael saber que não deve continuar com tamanha loucura, ele não deixa de colocar os seus dotes à disposição da tesão de Matilde.
É novo para ela. É poderoso. É potente. É um desbravar de uma nova sensação. É um descobrimento pessoal e íntimo. Matilde vê-se. A sua rata lateja. O seu clitóris incha. Ela encharca-se na cara dele. As suas pernas fecham-se e apertam a cabeça do homem. Tudo isto ela sente mas não pode exteriorizar. O seu peito quer brotar. A sua voz quer libertar-se. A sua loucura que extravasar. Mas não pode. Não consegue. Não se sente capaz de tal. Não porque tenha vergonha ou até tenha respieto pelos moradores deste Edificio. Matilde não grita porque tudo em si bloqueou. O seu corpo demonstra o orgasmo em acções consequentes de uma imensa entrega sexual de Rafael. Mas ela sente-se arrebatada por uma sensação que invade o seu interior. E a jovem não consegue reagir. A sua respiração bloqueia, o seu olhar parece sair da órbita. Um formigueiro invade os seus pés e as suas mãos. A rata é um poço que explode. O coração é um balão que rebenta. Até Rafael parar de chupar o clitóris, ela sente-se possuída.
Ela já pousou os pés no chão. Ele ainda lhe segura uma das coxas, apenas para que ela não se deixe cair. O homem procura recuperar o fôlego. As mamas da jovem roçam na t-shirt do homem. O olhar dele está fixado em si. Matilde sente-se fraca, absorvida de qualquer energia, arrebatada por um prazer imenso. Ela nem consegue falar. Levanta os olhos e estuda a face dele.
- Não preciso disto, Matilde...Posso dá-lo a qualquer outra mulher. Não duvides disso. Mas preciso de te confessar que é dificil resistir-te. Por isso é que preciso que te vás embora...Por favor, vai... Nunca vou ser teu e um dia mando-te à merda de vez... Por favor, Matilde... Sai daqui!...
A respiração dela ainda está descontrolada. Porque agora ela já consegue respirar. E mesmo que ainda não tenha recuperado o fôlego, Matilde volta a entregar-se. A sua boca atrevida, algo debochada, fofa e liberta de responsabilidades, cola-se aos lábios de Rafael. Com sede, com fervor, com desejo. O beijo é vazio. De sentimento. De sentido. De compromisso. Entre eles, fluiem apenas os sabores da rata da jovem que se colam aos lábios dele. Entre eles há apenas um gesto falso de paixão, do qual Matilde não consegue evitar. Ela vai sair. Com o sexo inchado, as cuecas na mão e uma brisa de frustração a percorrer o seu peito. Ele vai esconder-se. Dentro do 3º esquerdo, depois de passar pela porta da sua vizinha, que ainda têm uma luz acesa. Eles já não se encontram há alguns dias e isso deixa-o vazio e eles moram lado a lado e o homem não consegue justificar e ele sente-se culpado. A vizinha e amante está com um cliente, certamente. Isso faz-lhe confusão à alma. É assim que ele se desculpa a si mesmo por se entregar à jovem mimada Matilde.

terça-feira

Encarregada. Vendedora. Técnico.

Publicado a 06-06-08
Devoção. É isso que mantém a mente de Laura atenta em cada passo da preparação de um jantar. Não é um jantar qualquer. Não é apenas uma mera refeição preparada para o namorado e para a filha, onde a condimentação é um factor essencial para que haja gosto no que se degusta. Desta vez não. Há um motivo especial. Há uma razão essencial para que a devoção da mulher ultrapasse os limites. Há uma intuição que a faz exigir mais de si mesma. E isto funciona em cada pedaço da sua vida. Na cozinha, onde algo divinal é sempre cozinhado. Nas tarefas domésticas, em toda a perfeição que a sua casa merece. No amor à filha, eterno e cadente. Na paixão com o namorado, onde até um simples beijo pode ser um prazer sublime. E no trabalho. No labor que executa diariamente com dedicação. Nada é deixado ao acaso. O que é para fazer no momento seguinte, já está feito. Por esse motivo, Laura é Encarregada de uma loja de pronto-a-vestir de luxo e só pode ter um orgulho imenso nisso. Por toda esta personalidade, este jantar caracteriza-se por uma devota demonstração de bom gosto, requinte e encantamento.
- Porque é que te dás a tanto trabalho, Laura?
- Talvez porque gosto de ti, porque gosto de comer bem e porque nos faz bem uma noite com um jantar assim.
- Não era preciso.
Pouca coisa pode ser precisa para Tania. Pouco a segura a algo. Pouco lhe podem dar que suporte o peso no coração. No espaço de dez minutos, ela perdeu um namorado e uma amante. E é difícil encontrar formas de suster um impacto tão forte na mente. Um convite para jantar parece sincero. Despretensioso. Inconsequente. Um serão diferente com pessoas que a podem ajudar a abstrair do lar que desabou sobre si. Deste casal, Tania não pode exigir nada. Nem o casal vai exigir dela. Só pode ser um momento agradável. A jovem trabalha numa loja de roupa. É vendedora. Dedicada. Esmerada. Eficaz. Vigorosa em cada tarefa que executa. Jovial na forma como recebe os clientes e entusiasma a equipa. Tania trabalha numa loja de roupa de alta costura no centro comercial da cidade e isso tem sido o seu escape. Para além de partilharem a condição de vizinhas, Laura e Tania são colegas de trabalho na mesma loja. Há cerca de sete anos, a jovem colocou um currículo no espaço comercial onde a mulher se encarregava de gerir. Apesar de algum atrito inicial entre as duas, Tania tinha o perfil necessário para o que Laura pretendia. Daí em diante, para além da empatia constante, havia uma simbiose de trabalho. Tal facto traduziu-se em sucesso profissional. A dedicação deu lugar ao entusiasmo. E hoje, nenhuma delas se imagina a trabalhar distante uma da outra.
- Já sabes qual é o teu lugar, Tania. Queres vinho rosé? Fica à vontade e serve-te. - diz Afonso.
O facto de morarem no mesmo andar, do mesmo edifício é mera coincidência. o 2º esquerdo tinha um quarto para alugar e Tania necessitava de um sitio para ganhar a sua independência a um preço acessível. Nem Laura sabia que a sua funcionária estava à procura de casa, nem Tania sabia onde a sua encarregada morava. O conhecimento mútuo da condição de vizinhas só foi conhecida quando a jovem deu conhecimento à sua superior de que a sua morada tinha alterado. Não obstante o entendimento profissional, as duas colegas partilharam uma amizade que apesar da diferença de idades, ganhou força no reconhecimento das qualidades uma da outra. Quando Afonso surgiu na vida de Laura, a aproximação foi ainda mais intensa. Cafés no intervalo do trabalho, conversas longas no Espaço Magnolia, viagens no mesmo carro até ao centro comercial, confissões sobre namorados, cusquices sobre sexo, pressuposições de fantasias, aparentemente inatingiveis. Tania, Laura e Afonso partilham desde há algum tempo momentos em comum. E estes pedaços nunca se enrolaram com a intimidade do casal, com o relacionamento que a jovem mantinha com o namorado e com a parceira da apartamento e amante. A amizade entre os três adultos nunca se misturaram com a vida sexual. Pelo menos no que toca a relacionamento carnal concreto.
- Está muito bom, Laura... Eu não sei como fazes isto, mas está delicioso.
E sim, a Tania é o objecto de desejo e fantasia de muitas noites quentes de Laura e Afonso. Ela é a colega de trabalho que o casal sonha em trazer para a sua cama. A jovem sabe disso. Pressente as atitudes do casal. Muito do que é falado é num tom de brincadeira. Mas até a ingenuidade de Tania entende que o intuito é verdadeiro. Se ela dissesse que sim, algo forte aconteceria. Ela denota-o nas palavras ousadas de Laura. Ela sente-o nos olhares intensos de Afonso. Mas esconde a inevitabilidade que o casal parece demonstrar. Retira do prato um pedaço do salmão e leva-o à boca. O seu olhar divaga. A conversa dissipa-se. O jantar prossegue. A filha de Laura já saiu da mesa. Dirigiu-se ao quarto onde brinquedos que a fazem sonhar conseguem retirá-la de um mundo de adultos, cheio de conversas aborrecidas.
- Ainda não me respondeste, Tania...Como é que estás?
- Estou uma merda... Estou uma grande merda...
- Sabes que não te podes deixar vir assim abaixo.
- O meu namorado é um cabrão de primeira e deixei-me levar por um romance patético... Acredita, tenho mesmo que me vir abaixo.
- Tens que te levantar... De alguma maneira.
- Achas que consigo voltar a acreditar nos homens?
- Porque não? - pergunta Afonso.
- Foi com ele que perdi a virgindade. Tudo o que sei gostar e amar foi devido a ele. E pelos vistos não o fiz da melhor forma.
- A culpa não é tua...
- Se eu não tivesse os olhos tão tapados...Bolas, sabes o quanto me sinto usada?
- Ele já voltou a falar contigo?
- Tenho tido uma média de cinco chamadas por dia dele e mensagens absurdas.
- Respondeste-lhe?
- O que é que ia dizer? "Sim, vamos falar sobre todas as cabras que comeste a rata enquanto eu esperava por ti"? Não tenho nada a dizer-lhe! Aliás, não quero ter mais nada a ver com aquele merdas...
- Eu entendo, Tania.
Laura coloca a palma da mão sobre os dedos de Tania. É dificil entender o que pode passar na cabeça desta jovem, quando se sente duplamente traída. O mais penoso é talvez sentir a passividade e ingenuidade perante o que estava a acontecer. Talvez Tania sempre tivesse percebido que Filipe não era fiel. Talvez ela se quisesse enganar a si mesma. Mas ninguém quer ser magoado. Ninguém se quer magoar a si mesmo. Então porque é que Tania fechou os olhos durante tanto tempo? Uma lágrima solta-se do olho dela. Tania procura escondê-la. Ainda assim, ela sabe que esta sala é o único sitio onde a sua lágrima pode ter algum valor. Laura sorri para a colega e amiga, levantando-se depois para preparar café para os três. Afonso olha para Tania, procurando esboçar uma reacção que tranquilize a vizinha.
- Gostava de ser como vocês, Afonso.
- Como nós?
- Sim... Saber partilhar. Encarar os ciúmes como algo que nos fortalece. Eu sou uma fraca. Quando fico com ciúmes, escondo-me...E depois odeio-me. E depois choro sozinha.
- Sabes que podes sempre contar connosco para esquecer os ciúmes...
- Pois...mas eu acho que sou larga demais para caber na vossa cama.
Ouvem-se risos. Mais uma vez, há um convite subtil, uma forma descontraida de sugerir um envolvimento. Mais uma vez, Tania sabe rodear a proposta, brincando com a ideia. Ainda assim, as palavras de Afonso conseguem confortar a jovem, numa certa medida. Laura traz os cafés.
- E a Lúcia? - pergunta Laura directamente.
- O que é que tem?
- Como é que estão as coisas?
- Não sei...Sinceramente, não sei.
- Têm falado?
- Temos...Sim, temos... Quer dizer, nunca mais foi o mesmo. Mas conseguimos estar juntas. É confuso... Ela fala-me... Eu também não consigo deixar de lhe responder... Tento não estar ao pé dela, mas parece que é impossivel....e...
- O que é que falaram?
- Sobre nós...
- E o que é isso "sobre nós"?
- A Lúcia quer sair de casa. Acha que se eu não a consigo perdoar não há razão para vivermos debaixo do mesmo tecto.
- Consegues perdoá-la?
- Não sei... É complicado. Foi demasiado forte. Foi uma mentira muito grande. Foram demasiadas coisas que eu não sabia. E quando confiamos demasiado nas pessoas, parece que a facada é maior.
- Não me respondeste com franqueza. Vais perdoá-la? Sim ou não?
- ...Não...Sim...Eu quero perdoá-la. Mas não consigo. Entendes?
- Talvez...
- Vais deixá-la sair de casa?
- Não.
- Ela vai sair?
- Não.... Quer dizer...acho que não. Pelo menos quando ela acordou disse-me que não.
- Desculpa?! Quando ela acordou??
- Sim. Antes de ontem.
- Antes de ontem o quê, Tania?
- Eu e a Lúcia...Eu e ela....Nós adormecemos juntas antes de ontem....
- Assim, sem mais nem menos? Na mesma cama?
- Sim...mas foi porque....tivemos uma discussão...ela estava a chorar e a fazer a mala e a vestir-se e...eu estava a chorar e a berrar com ela...e eu não queria que ela saisse e...e depois eu beijei-a e...
Laura mantém um ar incrédulo. Quer largar um sorriso de troça, mas também quer perceber a sucessão de acontecimentos no 2º esquerdo. Decide ficar calada e esperar que por si só, Tania desabafe.
- Tomei um banho com ela.... Era isso ou tomar banho de água fria...Nada de mais. Não é a primeira vez e....falámos. Falámos... Acho que foi falar.... Ela pediu-me para entender o que aconteceu...Eu disse que não conseguia...Ela queria pedir que eu a perdoasse. Via-se nos olhos dela...Disse-lhe que já não conseguia confiar em ninguém. Comecei a disparatar...
- O que é que disseste?
- Disse-lhe que ela queria foder toda a gente... O Filipe, a Joana....eu... Ela começou a chorar e saiu da banheira... Eu sei que disse merda... Mas é aquilo que tenho sentido. Nem sequer o consigo evitar.... Mas sei que não devia ter dito aquilo....Fui ter ao quarto dela... Nem me fui vestir e ela deixou de dizer fosse o que fosse e eu tentei dizer-lhe que não conseguia esquecer que ela me escondeu coisas e....Bolas, porque estou eu a tentar justificar-me?!...
- Queres tentar perdoá-la, Tania...
- Não, não quero, Laura! Só não quero que ela se vá embora.
- E no entanto, ages como se quisesses que ela saisse...
- Talvez...foi por isso que discutimos...Nem sei como aconteceu. Mas...quando ela parou de chorar, segurei-a. Ela estava nua e com a pele suave e nem sei o que me passou pela cabeça...Deitei-a na cama e...ela adormeceu...
- E tu adormeceste com ela....
- Sim...
- Isso devia ter melhorado alguma coisa.
- Mas não melhorou. Só piorou.... De manhã, a Lúcia acordou e ia levantar-se para fazer o pequeno-almoço dela. Agarrei o braço dela e perguntei se ela ia embora. Respondeu-me que não.
- E então?
- Antes dela sair para as compras, ela olhou directamente para mim...Tinha um ar de derrotada. Disse-me que...Disse-me que de facto estavamos as duas a cometer um erro. A tentar resolver uma paixão que nunca poderá existir...
- E o que respondeste?
- Não respondi. Deixei-a sair...
- Tania...
- Ela tem razão....Não nos vamos entender. Quem é que estou a tentar enganar? Eu é que devia sair. Fui eu que cedi à tentação. Fui eu que achei que não teria mal nenhum guardar uma pequena paixão. A verdade é esta...Como posso eu levar o Filipe a mal, se eu própria o traí? Talvez ele é que tenha razão. Ponho-me a pensar como é que me deixei levar por uma tentação parva.
- Acho que estás a exagerar...
- A Lúcia tem razão....Isto não nos leva a lado nenhum. Eu não consigo perdoá-la mas quero fazê-lo. A Lúcia sente que eu não vou conseguir gostar dela. Pelo menos para a fazer feliz... E estamos nisto.
- Dá um tempo...
- Não sei... Estou tão confusa... Eu não quero que ela se vá embora. Mas tem sido dificil morarmos juntas. É muita coisa misturada.... Ela deve estar a chegar e nem sei como vou olhar para ela...
- Queres dormir cá? - pergunta Laura, gentilmente.
- Obrigada...Mas não... O melhor mesmo é eu ir embora, também... As noites só acalmam quando entramos cada uma no seu quarto e esperamos pelo dia seguinte.
Laura inspira fundo. Tania limpa as lágrimas. Afonso divaga o olhar. O jantar está a terminar e há um incoformismo no ar. A encarregada de loja percebe a confusão da amiga. Procura pensar numa solução, mas nem ela percebe o que vai na cabeça da sua vizinha. Jamais Laura conseguirá imaginar o que Lúcia poderá achar de tudo isto. E no decorrer de tudo isto, Tania está efectivamente perdida. O namorado não deve guardar um único ressentimento de ter despoletado uma cena insólita. Lúcia não consegue justificar o beijo que ela não quis aceitar. Perdoar é complexo. Esquecer é impossivel. Um apartamento parece minúsculo demais para tanto sentimento disperso.
- Sabes que estamos aqui ao lado, sempre que precisares... - solta Laura.
- Obrigada...Vemo-nos amanhã na loja.
Tania levanta-se da mesa e pega na sua mala. Com um ar cabisbaixo, com um semblante vazio, com a respiração presa, ela avança em direcção à porta de saída, ao mesmo tempo que a anfitriã começa a recolher os pratos. Afonso prepara também ele para saltar da cadeira, mas após inspirar fundo, decide exprimir o que a sua mente vinha a reflectir.
- Tania...eu sei que não vais aceitar passar cá a noite.
- Não...não vou...E agradeço o vosso convite. Tenho o coração a bater tanto e tenho um ódio tão grande a tanta coisa que podia acontecer alguma coisa que nos iriamos arrepender todos....
- Também não é caso para tanto... - continua Afonso - Esta noite não. Esta noite vai servir para pensares.
- Pensar no quê? Estou farta de pensar! O que é que há para pensar?....
- Talvez fizesse bem a vocês as duas uma separação...Nem que fosse por algum tempo.
- Não vou mandá-la embora, Afonso!
- Poderias passar uns tempos aqui em casa.
- Desculpa?!
Tania fixa o olhar em Afonso. O seu ar abatido transforma-se agora numa postura de incredulidade. Laura também não consegue esconder a surpresa. O convite revela-se ousado. Vindo da boca de Afonso parece mesmo atrevido. Ainda assim, denota-se no olhar do jovem a sinceridade e objectividade no que diz. A tranquilidade com que as palavras saem da boca dele transmitem confiança. É inegável. É a dedicação dele. O jeito como comunica, a capacidade de querer alcançar as pessoas, o indesmentível carisma em expressar o melhor de si, no momento certo. Talvez faça parte da sua aprendizagem profissional. Talvez seja algo intrísseco a ele. Mas a forma como ele usa as suas capacidades profissionais na sua vivência social, apenas demonstra algo. A sua dedicação ao que faz.
- Estarás a dois passos da tua verdadeira casa. Pensarás somente naquilo que te deixa tranquila. Não terás que ser confrontada com aquilo que neste momento te magoa. Não tens que sentir receio em entrar em casa. Sabes que gostamos de ti. Sabes que te vamos apoiar, aconteça o que acontecer. Vem viver connosco... Sabes que temos um quarto de hóspedes. Temos o nosso quarto, mas isso é outra conversa...
- Não sei.
- A Laura aconselhou-te a dares tempo. Mas eu acho que não é o tempo que resolve os nossos problemas. Talvez também não seja a distância. Mas se a tua mente se abstrair e se separar daquilo que a magoa, mais fácil será aceitar isso e colocar por trás das costas. O ódio na tua mente não desaparece, mas desvanece.
E Tania acredita nele. E Laura envolve-se no convite do namorado, apoiando as palavras dele. A encarregada lança um sorriso à amiga, como uma confrontação com o pedido sincero. Tania sente-se tentada a responder. Na confusão da sua mente, parece fácil dizer que sim.
- Deixem-me pensar...pode ser?
Ela respira fundo. Morde o lábio inferior, deixando no ar a ideia de que o convite lhe agradou. Mas a noite já vai longa e confessar uma resposta positiva pode ser precipitado. Há uma ansiedade na sua face. Laura entende que ela pretende chorar, mas não o quer fazer ali. Aproxima-se dela, entrega-lhe um beijo na maçã do rosto e pega no braço dela, para a acompanhar à saída. Antes de sair da sala. Antes de entrar em casa e fechar-se no quarto. Antes de se entregar mais uma noite às lágrimas. Antes de encerrar mais um dia, Tania liberta um sorriso silencioso a Afonso. As palavras dele acabam de iludir o caminho do destino.

segunda-feira

Acompanhante

Post 100
Publicado a 02-06-08
- Ana, por favor... Tudo o que vires, ouvires e sentires esta noite, neste lugar... guardas para ti. Para sempre. Assim que saíres, aconteça o que acontecer, é como se isto que aqui tens à tua frente não existisse. É isso que te peço.
Parece um noite mágica. O céu pinta estrelas surreais. O carro cessa o seu andamento mesmo em frente à enorme fachada do edifício secular. Elisabete desliga a ignição e olha com um sorriso para a sua amante. Ana entende cada palavra da jornalista que a convidou para uma noite diferente. Confiante, mas com uma boa dose de ansiedade perante o desconhecido, a jovem ouve aquilo que a mulher tem para dizer. Porque qualquer passo em falso pode ser fatal.
- Quero que tenhas em mente o que aceitaste. Estas pessoas não estão aqui para brincar. É mais do que um jogo. Deixa-me ser sincera. Se não ages de acordo com as regras deles... a tua vida como a conheces, deixa de existir. Vão perseguir-te. Vão humilhar-te perante todas as pessoas que conheces e gostas. Vão fazer-te arrepender de esconder todos os segredos que eventualmente possas ter... E... Fui eu que te convidei, Ana. A minha carreira e o meu casamento também estão em jogo.
- Fica descansada, Elisabete. Sabes que sou uma mulher profissional.
- És uma mulher fantástica, Ana... Disso eu tenho a certeza.
As duas portas do veículo abrem-se. Dois homens com farda de paquete agem com delicadeza perante mais duas pessoas a chegar a este local surreal. Um dos funcionários entra para o lugar do condutor e conduz o carro, pertença da jornalista, até à garagem do hotel. Um edifício clássico, situado nos arredores da cidade, num local algo inóspito. Com três andares, o hotel assemelha-se a uma albergaria e a sua estrutura estende-se ao longo de um enorme terreno. Jardins imponentes nas traseiras, piscina exterior e interior e uma arquitectura datada dos anos cinquenta. Assim que Ana coloca o pé no primeiro degrau da escadaria vistosa, ela entende que o espaço é elitista. Apenas um restrito grupo de pessoas de classe alta terão possibilidade e ousadia para reservar uma noite neste local de repouso. Elisabete segura o braço da jovem, procurando dar-lhe uma orientação.
- Como te tinha dito, uma vez por mês, não é possível fazer reservar um quarto para este dia. É como se o hotel estivesse lotado... É como se isto deixasse de ser um mero hotel para gente rica...
Depois de passar os arcos da fachada central, as duas mulheres entram pela porta principal do hotel. E fazem-no de uma forma estranhamente vistosa. Sobre o seu corpo, elas vestem um uniforme surreal. Apesar de calçarem uns sapatos pretos de salto alto, as mulheres estão fardadas com um hábito preto de monge franciscano. E todas as pessoas em seu redor parecem encarar tal facto com naturalidade. Desde o funcionário que lhes abriu a porta até ao senhor que lhes dá as boas-vindas junto à recepção e lhes indica o caminho a seguir. O hábito dá-lhes um ar sensual. O pedaço de pano escuro está apenas preso pela corda branca na cintura. As mangas são largas e cobrem as mãos delicadas delas. Com o capuz pelas costas, elas mantém um sorriso confiante. Ana nunca entrou ali, mas é como se soubesse exactamente o que fazer. Elisabete já experimentou a sensação de entrar neste hotel peculiar. Entusiasmada com o que está por vir, ela trata de perceber que Ana sabe ao que vem. Em última instância, é a jornalista que abre a porta do espaço à jovem.
- Põe o capuz... Assim que passarmos aquela porta, tenta disfarçar a surpresa.
Ana respira fundo. Repete o gesto da sua cliente e coloca o capuz sobre a sua cabeça. A sua face fica praticamente escondida. Imediatamente depois de atravessar um enorme corredor, é aberta por outro funcionário uma porta que dá acesso a um ambiente completamente diferente da ideia de um qualquer hotel. O passo de Ana congela. O olhar dela incendeia-se. A jovem procura ter uma abrangência visual de todo o espaço. Apesar de ter a visão algo deturpada pelo tecido que é colocado à frente do seu olhar, ela consegue perceber a dimensão do que ocorre. Uma sala enorme, habitualmente usada para conferências, jantares de gala, casamentos e festas ocasionais tem agora um propósito de uso completamente distinto. Diante da excêntrica Ana, acompanhante de luxo profissional e jovem madura, está um cenário singularmente extravagante. Um conjunto de orgias eróticas e sexuais enche os diversos cantos do salão. Estarão, possivelmente, cerca de vinte pessoas a entregar os corpos a diversos parceiros. Em comum, todos eles têm o facto de continuarem com os hábitos vestidos. Ou pelo menos seguros à cabeça pelo capuz. O resto dos corpos estão despidos. Alguns com roupa interior sensual, outros sem nada que os envolva, outros mesmo objectos eróticos anexados a diferentes partes corporais. É uma visão algo grotesca, tal é a intensidade do sexo praticado em grupo. Ana está abismada. Elisabete fez questão de lhe referir antecipadamente o que ela iria ver dentro deste hotel. A jovem sabia que iria ver algo transcendente. Sexo em grupo. Orgias. Entrega sem limites. Partilhas escaldantes. Tudo no mesmo espaço. Ela julgava-se preparada para tudo o que a sua mente conseguiu imaginar. Mas a imagem que Ana tem de todo o salão foge por completo à capacidade imaginativa da sua mente. Ela tenta disfarçar a surpresa. Mas é inevitável a atitude de espanto.
- Avisei-te... Estás pronta? - pergunta a jornalista.
- ...Sim...Sim, estou.
- Lembra-te do que te disse. Tudo o que sentires aqui dentro será o teu maior segredo. Para sempre. Ah, e aconselho-te a aceitar todas as bebidas que o funcionário do hotel te entregar.
- Porquê?
- Digamos que eles preferem que a tua mente esteja com uma boa dose de álcool do que com a mente sã.
Como algo já perspectivado, um homem que segura uma bandeja recheada de copos de cristal coloca-se diante das duas mulheres. Ana olha repentinamente para a amante e logo depois para o funcionário. Em silêncio, ele parece oferecer-lhe uma bebida. Ana sente que tem que aceitar. Pega no copo e coloca-o junto ao abdómen. Elisabete repete o mesmo gesto e dá um gole imediato. O funcionário acena com a cabeça um cumprimento gestual e retira-se.
- Vamos fazer um brinde? - pede Elisabete - À noite mais surreal da tua vida.
Ana levanta o copo. Os vidros tocam-se e o brinde é feito. Mas a jovem não gosta da forma como as palavras de Elisabete soaram. Para Ana, numa noite assim, não seria necessário fazer votos para que a noite corresse bem. Talvez não tenha sido esse o intuito das palavras da jornalista. Todavia, fica uma sensação de desconforto na boca de Ana, assim que ela dá o gole na copo de champanhe. As regras da orgia são para cumprir. Escrupulosamente. A jornalista informou Ana que as regras são feitas para que tudo possa correr sem incidentes. Sem sobressaltos. Sem episódios que façam ruir a encenação que aqui é criada. Para além das bebidas, da manutenção do hábito e da discrição de identidade, há uma obrigatoriedade no uso de métodos contraceptivos e elementos lubrificantes. Sem excepção. Elisabete decide avançar pela sala. Pelas mesas, sofás, cadeiras, bancos e que tantos outros adereços que enchem aquele espaço.
- Não te esqueças das regras... Se as cumprires, tudo vai correr bem... Anda, quero mostrar-te quem manda aqui.
Passo por passo, as duas mulheres circundam a sala. Ana é mulher habituada a sexo. Ela própria o pode confessar que pouca coisa a surpreende ou a deixa inibida. Mas a envolvência sexual que exala de cada canto afecta o estado de espírito da jovem. Nem ela o consegue negar. Não é a primeira vez que ela vê sexo em grupo. Ocasionalmente, tal acontecia no clube onde trabalhou. Não é sequer a primeira vez que ela cede a experimentar orgias. Mas o número de pessoas que estão aqui envolvidas, a naturalidade com que elas praticam actos sexuais intensos e acumulam diversos parceiros em simultâneo, os sítios onde tais actos são praticados e teatralidade do que acontece para onde quer que ela olhe, deixa-a suspensa em si mesma. Ana tenta encontrar a melhor forma de reagir a tudo isto. Nem está sequer em causa a decisão de participar na magnânima orgia. Ela quer. Ela está excitada. Ela sabe o que está a fazer. Mas o período de adaptação ainda não terminou. E Elisabete aconselhou-a a medir cada passo que executa. A tentar conhecer quem está presente e acima de tudo não julgar. Para Ana, isso é fácil. O que para ela se torna mais complexo é não se sentir julgada. Porque por mais que ela veja as pessoas compenetradas nas fodas, nas quecas, nas cópulas, nas fornicações que ocorrem, também não deixa de ser verdade que ela sente-se intrusa ali. Sente alguns olhares a dirigirem-se a si. Mesmo escondida no capuz, há quem já tenha percepcionado do novo elemento nesta extravagante orgia.
- Aquele ali... Com o hábito branco... Ele já percebeu que estás aqui.
- É ele o Bispo? - pergunta Ana curiosa.
- Sim. Ele é director deste hotel. Como deves perceber, é ele quem manda... É ele que rege o que se vai passando em cada canto desta sala.
Quase no centro do enorme salão, sentado em cima de uma dúzia de almofadas volumosas, está aquele que é designado por Bispo. A vestimenta branca dele diferencia-o de qualquer outro elemento. O capuz também lhe cobre parte da face, mas toda a gente sabe quem ele é.
- É ele que escolhe os Padrinhos.
- Quem são os Padrinhos?!
São elementos confiados pelo Bispo. Vestem de preto, com hábitos iguais aos de Ana e Elisabete. Mas distinguem pela forma como agem. Um Padrinho é designado pelo director do hotel para ter convidados a seu cargo. Quando alguém é convidado a entrar neste grupo restrito e imensamente discreto em relação ao resto do mundo, tem que passar pela mão de um Padrinho. Antes mesmo de se envolver com qualquer outro presente, o recém chegado é escolhido. E daí em diante, até sair do espaço do hotel, é o Padrinho que decide com quem o seu "afilhado" se envolve.
- Que nome têm os convidados?
- Burgueses?
Um Burguês é sempre alguém que foi convidado por um elemento que já frequenta o hotel. Com a autorização prévia do Padrinho, ele entra mediante a aceitação das regras estipuladas e com a predisposição de ser acolhido por um subordinado do Bispo. É então o director do hotel que decide o Padrinho a ser atribuído.
- São Padrinhos que estão ao pé do Bispo?
- Sim. Ao todo eles são oito. São pessoas da máxima confiança, como deves perceber. Um dos três que estão perto dele deverá ser o teu Padrinho.
- E quando vou saber quem é?
- Pode ser a qualquer instante. Quando o Bispo decidir.
- E quem são as mulheres deitadas ao lado deles?
- São as prostitutas que são contratadas.
Para além do director do hotel, dos Padrinhos, dos convidados e dos funcionários que enchem a sala, existem prostitutas e prostitutos contratados para satisfazer os presentes. Nem sempre os Burgueses estão suficientemente tranquilos para se envolver mutuamente. As mulheres e homens contratados servem para quebrar o gelo, trazer novas fantasias, satisfazer caprichos dos diferentes elementos presentes, estimular diferentes experiências eróticas e sensuais.
- Como é que eles se chamam?
- Acompanhantes.
A jovem inspira fundo. Um arrepio atravessa-lhe a espinha. De imediato, ela olha para o Bispo, depois para um dos Padrinhos. Cinge a atenção num casal de Burgueses que fornica em cima de uma mesa de carvalho, junto às vidraças. E finalmente, Ana guarda uns segundos de atenção numa Acompanhante que masturba uma Madrinha nas almofadas que representam o altar do poder.
- Eu vou tentar ficar contigo, mas se um dos Padrinhos te vier recolher, ficas por tua conta.
- Eu não fico com o teu Padrinho?
- É pouco provável. Acredita, eles vão testar-te.
- Estou preparada.
Elisabete sorri. Os lábios da jornalista são viciantes. Adornam a boca brilhante e cremosa da mulher que procura guardar a sua ainda protegida o maior tempo possível. Ana sente-se confortada com o sorriso da amante. Ao mesmo tempo, continua a acompanhar o passo dela. As duas mulheres caminham ao lado de homens e mulheres que se consomem sexualmente. Mesmo colados a elas, estão dois homens a foderem uma mulher com cerca de 35 anos. Os três adultos estão deitados numa enorme carpete, sem qualquer pudor. Ela, de cabelo curto, loiro, sorridente, com o hábito ainda vestido, subjuga-se à vontade deles. Senta-se em cima de um dos homens, que se percebe ser um Acompanhante. O homem que a penetra por trás parece ser um Burguês, mas Ana não consegue desvendar o papel da mulher ali. Detentora de um rabo sensual e de uns seios bicudos, ela demonstra estar a viver múltiplas sensações com ambas as penetrações.
- É uma Burguesa. - clarifica Elisabete - Das mais antigas aqui dentro. É chefe de enfermagem no Hospital.
- Conheces estas pessoas?
- Quase todas. Esta aqui em frente é uma das Madrinhas. Namora há algum tempo com outro Padrinho.
- Parece que a conheço.
- É uma das administradoras do centro comercial da cidade.
A mulher, a gozar os seus trinta anos, está entre dois adultos, a rondar a mesma idade. Um casal maduro, sedento de partilhar a paixão e fantasia sexual com uma mulher comprometida. A amante lambe a rata da Madrinha, que se senta sobre o sexo inchado do marido da parceira. À beira do orgasmo, a Madrinha incita a mulher a chupar-lhe o clitóris, ao empurrar a cabeça dela para si. Apesar da excitação da posição que os três partilham, a atenção de Ana é desviada para uma poltrona, uns metros adiante. Um homem, ainda envolto no hábito, com um pénis ainda por entesar, está sentado com um ansioso. Ainda assim, em seu redor estão quatro mulheres com vinte e muitos anos. Corpos esculturais, aparência vistosa, maquilhagem a adornar a face de boneca e uma postura de desejo simulado. Mulheres que sabem exactamente o seu papel, não obstante o pedaço de carne presunçosa que se lhes apresenta, procuram satisfazer os caprichos masculinos. A loira está de pé, em cima da almofada da poltrona. Tem as mãos dele nas suas coxas, ao mesmo tempo que lhe lambe a rata. Uma ruiva senta-se em cima da cintura dele, de costas para o homem e agarra o sexo ainda flácido. Procura entesá-lo e dá a carne às outras duas mulheres morenas. Estas encenam uma excitação histérica, na ânsia de poder chupar o pénis com a maior dedicação possível.
- Aquele homem é meu cliente. - sussurra Ana com alguma surpresa.
- Acredita, ele não é só teu cliente...
- Eu imagino o que ele faz em todas as viagens de negócio à Arábia Saudita...
Mas assim que Ana encaixa o facto de conseguir encontrar neste lugar gente com quem se sente estranhamente familiarizada, ela já tem o olhar a divagar por outros recantos do salão. Há um homem, próximo do trono do Bispo, que fixa a atenção em si. Como se a estivesse a vigiar há algum tempo. Ele está de pé. Tem um corpo atlético, de ombros largos, e uma face atraente, com o queixo vincado. Uma das mãos segura o tecido do hábito preto. A outra segura na nuca da jovem rapariga que está ajoelhada no chão a chupá-lo.
- Outro Padrinho. - solta Elisabete - Um dos mais desejados nas festas do hotel. Como deves perceber pela ansiedade com que a futura psicóloga o chupa.
- Ela parece tão novinha...
- Dezanove anos. Já não é a primeira vez que a vejo naquela posição com o seu Padrinho. Ele é instrutor...
- Desculpa?! Instrutor?...
- Sim. Instrutor de vôo.
Ana engole em seco. Algo a atormenta. Enquanto assiste ao broche que a jovem estudante, ainda fardada, desenvolve no pénis do homem excitante, ela congela a postura. O Padrinho continua a olhar para a convidada de Elisabete e mantém um breve sorriso. Com a mente confusa, Ana tenta esquecer a bizarra sensação de todos lhe parecerem conhecidos. Talvez seja o facto de se sentir vigiada e ansiosa. Ela não nega que o sexo masculino inchado dentro da boca da jovem rapariga a deixa húmida entre as pernas. No entanto, ela decide desviar o olhar. Dá cinco passos em frente e encontra outros pontos de interesse. Elisabete acompanha-a.
- E aquela ali em frente? - pergunta Ana.
- Qual? A que está ser lambida pelos três Burgueses? É Madrinha. Professora de História no Liceu. Viúva. Parece que descobriu o que realmente era o sexo aqui dentro.
Possuída. A melhor forma de descrever o estado de espirito da mulher a chegar à casa dos cinquenta anos. Enérgica, com um rabo largo e empinado para trás, com o corpo cheio de vivacidade, uma boca de lábios finos mas largos, uma entrega despudorada, cabelos curtos castanhos, uma aparência de mulher madura mas pouco sensata, umas mamas grandes, descaidas e com os bicos dos mamilos completamente entesados e rijos, e uma tusa inesgotável. A professora está presa a seis mãos masculinas. Um dos homens convidados pende o seu corpo em cima do peito dela, ao mesmo tempo que segura as costas dela e chupa as mamas com devoção. Os outros dois homens seguram na cintura dela, colocando uma mão no rabo excitante da mulher e a outra mão no sexo dela. A professora prolonga um estado de êxtase, onde a sua rata incha com dois indicadores a penetrá-la e dois polegares a manusearem o clitóris saído e inchado.
- Não te deixes enganar. Eles são amantes dela há algum tempo. E todos eles aceitam a presença do outro. O orgasmo que ela vai ter é partilhado para os três.
- E eu que achava que já tinha visto tudo.
- Aquela ali ao fundo...Em cima daquela mesa de centro... Outra Madrinha. Trabalha na loja de roupa da mãe, mas ganha uma mesada maior que o meu salário.
Magrinha, com os lábios viçosamente carnudos, um ar jovem, esta súbdita do Bispo está sentada em cima de dois homens. As pernas deles estão entrelaçadas e os sexos deles são duas hastes que penetram com firmeza na rata e no rabo da jovem. A cavalgar sobre os dois amantes prostitutos, ela delicia-se ainda com dois pénis inchados diante da sua face. Os cabelos negros dela estão a pingar do suor, consequência da intensidade do que ela já viveu nesta noite. Mas ainda assim, ela chupa uma das pichas, ao mesmo tempo que masturba o outro Burguês. Um, dois, possivelmente algum oculto. A jovem já tinha perdido ao número de vezes que alcançou o auge do seu prazer. Não contando, obviamente com esta que as duas mulheres conseguem assistir. Ela vem-se ao mesmo tempo que desvia o olhar de qualquer um dos homens. Ela liberta-se de si mesma. Vezes sem conta. Como uma montanha-russa. Os quatro homens possuem-na. Ana está incrédula. Tudo lhe parece sinistro. Surreal. Onírico. Transcendente. E o seu olhar vai navegando por todos os recantos. Mesmo ao lado da tenebrosa sessão sexual entre os cinco adultos, está um canapé, onde se senta uma jovem. Cabelos pretos, a boca carnuda, com o lábio inferior mais inchado que o superior. Um corpo esguio, magrinho, de peito pouco saliente. Um olhar introvertido mas excitante. Ela está sentada na cadeira, com as pernas de fora e as costas quase deitadas no assento. Existe no semblante dela uma ideia de prazer. Uma fantasia estonteante. Um delírio inigualável. Uma Acompanhante nova, bonita, sorridente e com uma pele suavemente brilhante, está ajoelhada no chão diante do sofá. Tem as pernas da Madrinha em cima dos seus ombros e a rata dela à frente da sua boca. Ao mesmo tempo, a prostituta cavalga em cima de um homem que está deitado no chão, com as mãos nas mamas da mulher que o fode. O Burguês assiste ao minete que é feito à sua Madrinha e delicia-se com a envolvência a três. O olhar da súbdita do director do hotel coloca as mãos em cima do seu peito, liberta gemidos entusiasmantes e olha para oque está em seu redor. Especialmente para o orgia diante de si. Ana percebe que as duas jovens são semelhantes. Talvez nas opções sexuais que demonstram nesta orgia não. Mas tem traços físicos aproximados. Inclusivamente, parecem trocar olhares entre si.
- E quem é aquela, mesmo ao lado?
- Lésbica... Bissexual, não sei. Também é Madrinha. Eu acho que ela estuda. Arquitectura, creio eu. Acho que ela já conhecia o Bispo...De outra forma...Tu sabes...
- Elas duas conhecem-se?
- Acho que não...Porquê...
- Deixa...estou só um pouco abismada com isto...
Assim que o copo de champanhe de Ana fica seco, no instante seguinte aproxima-se, por entre todas as pessoas que se envolvem, o funcionário com a bandeja. Novamente composta de copos de champanhe, Ana só tem que escolher. Porque ela já percebeu que essa é a regra a cumprir. Olha em redor, olha para Elisabete e depois para o funcionário. Agradece gestualmente a entrega de mais uma bebida e vê o homem sair dali.
- Então, mas diz-me.... - pede Ana - Ainda não percebi...Como é que os Padrinhos conseguem distinguir os Burgueses dos Acompanhantes?
- Fica descansada, eles sabem...
- Como?....
- Agora não digas nada...Vem ai a minha Madrinha.
Envolta no hábito. Debaixo do capuz negro só é visivel a boca da mulher. Pele macia, mas ar maduro. Lábios fofinhos e ruborizados, mas olhar escondido. Baixa estatura, mas um corpo bem esculpido. Passo por passo, a mulher percorre o seu caminho para se aproximar das duas mulheres. Ana está ansiosa. Este poderá ser o momento em que ela é escolhida. Pelo menos assim o deseja. Mas a mulher tem um ar intimidante. Elisabete procura manter uma certa distância da sua amante, mas ainda consegue sussurrar-lhe.
- Casada com outro Padrinho. Duas filhas adolescentes. Empresária. Infiel quanto baste. Olha para as mulheres com desejo mas entrega-as a homens que ela já comeu.... Esta é a minha Madrinha.
A mulher está quase a alcançá-las. Ana cerra os olhos por um breve instante e tenta abstrair-se de tudo. Há um certo nervosismo no seu corpo, o qual ela não consegue dominar. E ela própria estranha esse facto. Afinal, a sua máscara nocturna preparou-a para as excentricidades da vida. Mas algo toma conta de si.
- E eu?... Ainda não percebi, Elisabete...estou aqui como Burguesa ou Acompanhante?
Ao voltar a abrir os olhos, percebe que Elisabete já não lhe presta atenção. Ao percepcionar o que acontece, Ana entende que aquela Madrinha não a escolheu a si. A mulher envolve os braços em Elisabete e cola o seu corpo ao da jornalista. As duas mulheres são da mesma estatura. Trocam um sorriso ansioso. Espelham um desejo comum. A noite de Elisabete começou agora. Verdadeiramente.
- Olá, minha doce Burguesa...
- Boa noite, querida Madrinha...
Ana está apavorada. Antes mesmo de ser abandonada, a jovem sente-se sozinha. Percebe que a mulher que a convidou é como que tirada das suas mãos. Num gesto impulsivo, a mulher misteriosa abre o hábito da sua Burguesa e descobre o corpo da jornalista. Uma lingerie preta adorna o corpo esbelto de Elisabete. Arrebita-lhe os seios vigorosos e sugere a magnificiência da sua rata. Ana percebe que a outra mulher está entesada. Vê a mão da Madrinha segurar com firmeza a mão da sua amante. Assiste à outra mão de Elisabete segurar a face macia da mulher por debaixo do capuz. E a Madrinha que não é a sua começa a arrastar a jornalista para outro local. Ana sente-se extremamente confusa. Pela primeira vez, ela encaixa a ideia que ainda não conseguiu perceber que lugar é o seu ali.
- Diz-me, eu sou uma Burguesa ou Acompanhante?!
A cinco passos da sua amante, Elisabete ainda retorna um olhar. Silencioso. A Madrinha fixa o olhar escondido em Ana, como que a confirmar que aquela mulher, daqui em diante, só a ela lhe pertence. Perdida, confusa, desorientada, Ana bebe de um gole só a bebida que segura na mão nervosa. No meio do salão, numa noite de deboche, a jovem acompanhante está presa num filme que parece ser demasiado o seu, mas do qual ela não sabe que personagem é. Ainda coberta com o hábito e com o olhar algo protegido com o capuz, Ana gira sobre si mesma. Não obstante tudo o que já viu dentro deste espaço. Esquecendo o facto de que ela já consegui perceber a surrealidade do que aqui acontece uma vez por mês. Ela rodeia com o olfacto, algum tacto, audição e essencialmente visão, o que estão à sua volta. As orgias continuam. As pequenas loucuras e grandes fantasias sucedem-se. Fornicações violentas, fodas soberbas, fellatios sublimes, cunnilingus misturado com outras tantas formas de comer carne sedenta e entesada. Homens ricos que penetram por trás com convicção prostitutas servis. Ou Burgueses a cederem aos caprichos dos Padrinhos, com a ajuda de Acompanhantes profissionais. Ana sabe que vive num mundo à parte. Sabe que as duas máscaras que lhe entregam uma dupla personalidade são apenas uma construção da sua mente, adaptada à realidade. Sabe que a sua vida é um teatro que ela própria montou. Mas isto que ela assiste, é uma enorme encenação. No entanto, ela foi absorvida por uma Farsa de paixão ou um Auto de fantasia.
- És minha!
Nas suas costas, uma presença masculina, escondida num hábito preto que cheira a sexo, aconchega-se a si. Os braços dele envolvem o corpo de Ana e subitamente ela sente-se possuída. Pelas palavras, pelo gesto, pelo cheiro, pelos assombramentos que invadem a mente da jovem. Ela entende que um Padrinho acaba por a resgatar enfim. Elisabete já está longe e Ana sabe que existem regras a cumprir. E ela sabe que quando alguém entoasse tais palavras, ela teria que subjugar-se aos desejos do súbdito do Bispo. O Padrinho faz girar o corpo ténue de Ana e num movimento brusco, ela fica diante do olhar dele. O seu capuz escorrega um pouco para trás e descobre o olhar. Uns olhos brilhantes, impávidos, receosos. Não era suposto ser possível a Ana sentir isto, quando a noite pede a sua máscara nocturna. Quando tudo a transforma numa verdadeira Acompanhante de luxo. Mas neste instante, nem ela sabe verdadeiramente o que é. Agora, nas mãos do homem que ainda há pouco estava a ser chupado pela outra rapariga, Ana assume-se dominada. O homem invoca um mistério charmoso. Aquela cara é-lhe demasiado familiar. Tudo ali é surrealmente familiar. De pé, com a distância de um palmo, eles absorvem-se mutuamente. E num gesto impulsivo, o Padrinho abre o hábito da jovem, descobrindo-lhe o corpo. Ela não reage. Mantém apenas o olhar fixo nele. Debaixo daquele tecido preto há apenas o corpo feminino voluptuoso. Os seios excitados, o ventre húmido. Ele sorri, ela guarda-a para si. A noite intensa de Ana começou agora. Declaradamente.
É uma mesa de centro. Semelhante à que Ana adquiriu para colocar na sua sala. Esta é um pouco maior. É colocada próximamente a um dos cantos do salão do hotel. Serve de apoio aos três sofás e à poltrona que foram sitados ali pelos funcionários. Não há um lugar vago. Nem um sofá, nem a poltrona, nem mesmo o chão. A mesa de centro está reservada para um Padrinho. O Padrinho de Ana. O detentor do corpo da jovem. O mago da alma dela. Porque Ana sente-se enfeitiçada. Atenta ao que a rodeia, mas enfeitiçada. Na sua mão já está um novo copo cheio. Desta vez vinho verde. Suave mas traiçoeiro. O olhar dele mantém-se na nova aquisição. Estuda-lhe cada contorno do corpo. As curvas das ancas, a bondade carnal das nádegas, o carinho do umbigo e do seu ventre, a supremacia de uns seios redondos, firmes e excitados. Decora-lhe a face, até mais do que já fez desde que a jovem entrou nesta enorme sala. O queixo confiante, os lábios finos e românticos, as maçãs do rosto eternamente rosadas, a testa longa e madura, o olhar constantemente apaixonado. Ele molda a face da mulher à sua medida. Isto tudo, ao mesmo tempo que apalpa as mamas dela e penetra dentro da sua rata. Ana cavalga em cima do corpo do Padrinho. A pedido, por desejo, ou por mera excitação carnal. Ele está deitado na mesa de centro. Os seios dela pulam sobre a palma das mãos masculina. O sexo dele só pode inchar dentro da vagina da mulher. E ela geme. São gemidos de entusiasmo, de loucura, de fascínio, de incredulidade perante a sequência de acontecimentos. Porque ela fode. Ela fornica. Ela une o seu sexo ao pedaço de desejo que a escolheu. Ela faz aquilo que lhe dá carácter, que a apresenta a um mundo distinto, que deposita a sua estabilidade financeira mas também mental. Não é sexo. É sedução. O primeiro orgasmo de Ana caracteriza-se pela entrega ao homem que a prendeu a uma escolha que não a dela. O homem excitante, charmoso, mas também presunçoso, trouxe-a para esta mesa de centro. E este é o local para onde o Padrinho, instrutor, traz as suas fodas.
Ela ainda cavalga. Os seus olhos mantêm-se abertos. No sofá defronte da mesa. Ana é profissional. Mantém a distância certa. Goza do prazer que lhe é dado. Saboreia os caprichos que manuseia. Com a mão direita, ela pega no copo de vinho que já foi substituido. Mais uma vez. Com a mão esquerda, a sua habilidade estimula o pénis de um Burguês, que foi chamado pelo homem que está debaixo do seu corpo. E mesmo que a boca dela esteja cheia da carne tesa masculina, o olhar de Ana prende a atenção no que está diante de si. A jovem rapariga, que parecia guardar um enorme prazer em chupar o Padrinho de ambas, está envolvida com outro homem. Um senhor charmoso, com mais de quarenta anos, certamente. Cabelo grisalho, homem de negócios, certamente. Uma postura firme, homem comprometido, pai de filhos, certamente. A atitude demonstra que é um homem experiente nestas andanças, amigo do director do hotel, Burguês, sem toda a certeza. Enquanto chupa o homem que está de pé ao seu lado. Enquanto geme com as constantes penetrações que ela deixa o seu Padrinho realizar. Enquanto todo o seu corpo vive uma incandescente tesão. Ana admira o envolvimento da rapariga sensual e o homem charmoso que a come. É uma jovem encantadora. Cruzando com ela numa rua da cidade, passaria por uma rapariga ingénua, serena, pouco dada ao desconhecido. Trocando o passo com ela no centro comercial, seria possível perder o olhar por uns segundos e quem sabe, tomá-la como a mulher perfeita. Ana está a vê-la a ser comida por trás. Sentada sobre o colo do homem, com o tronco a pender para a frente, a ponta dos dedos a tocar no tapete, o rabo empinado para trás, a rata à disposição do desejo masculino. Ana molha a picha com os seus lábios e movimenta as ancas, estimulando a foda que decorre. Mas os seus olhos comem a boca fofa da rapariga, a pele suave, os olhar escondido por detrás do capuz e dos óculos, os seios esbeltos. A outra súbdita sexual do seu Padrinho tem umas mamas fantásticas. Com a pele brilhante, perfeita e meiga, os seios ganham uma forma sublime e excitante. Fruto da idade que ainda tem, a jovem de dezanove anos tem um corpo doce. E isso põe Ana fixa nela. Presa aos gritos finos, à respiração controlada, aos movimentos dos lábios gelatinosos, ao pêndulo das duas mamas, às penetrações incisivas do homem charmoso. Talvez seja esta imagem soberba, talvez seja a estimulação que o seu próprio corpo sofre. Mas Ana sente-se fascinada. Encantada. Hipnotizada. Deliciosamente enfeitiçada. O Burguês que está de pé vai entendendo o motivo pelo qual Ana chupa divinalmente. Assim que sente o seu Padrinho a vir-se, ela abocanha o outro parceiro sexual, tatuando o pénis dele com a lingua frenética e os lábios molhados. Exposta ao sémen dele na sua face, ainda assim, Ana mantém o olhar na rapariga que é devorada pela fome do homem misterioso.
É uma orgia progressiva. Os Burgueses acumulam-se em redor de Ana e do seu Padrinho. Ela ainda continua em cima do corpo do instrutor. Ele enche a palma das mãos com as nádegas tenebrosas e quentes da jovem. Ajoelhado em cima da mesa de centro, está um homem com cerca de cinquenta anos. Sedento de jovens dispostas a sexo sem compromisso, ambicioso na procura de corpos que lhe entreguem o prazer desejado. Ele penetra no rabo de Ana como mais uma sobremesa nesta noite longa. Ana nem quer saber quem é ele. Ana nem precisa de sentir que ele tem capacidade para lhe entregar um pedaço de prazer. Ana sente-se cheia. Ana enlouquece. Ana absorve tudo o que homem que a conquistou decidiu que ela iria receber. Ana questiona apenas o seu papel. Burguesa ou Acompanhante? Ela é fodida por dois homens e chupa outro ao mesmo tempo, diante de si. Agora não interessa a personagem que representa. Ela já não está aqui. Mesmo que à sua frente, na poltrona um pouco mais ao fundo, em redor da mesa de centro, Elisabete esteja a usufruir do seu prazer. Também ela enfeitiçada, também ela perdida num mundo de prazer, também ela absorvida numa bolha de paixão. A jornalista está sentada de costas, em cima de um Burguês sedado em álcool. Ela só precisa de cavalgar e esperar que ele se venha. Pela primeira vez, Ana vê a sua amante entregue à paixão masculina. As mamas salientes, carnudas, escaldantes e com tez morena pulam conforme ela salta. Elisabete nem sequer abre os olhos. Sabe que atrás de si, a sua Madrinha coloca a rata em cima da boca do homem. Sabe que mais cedo ou mais tarde, outro homem, talvez Acompanhante, irá encher a sua vagina com um pénis comprido, largo e cheio de vigor. O que Elisabete ainda não percebeu é que Ana olha compenetradamente para si. As mamas da jovem podem estar na boca do Padrinho. A dupla penetração pode estar a fazer explodir o seu interior. A sua boca pode estar cheia com outro sexo. Mas Elisabete nem desconfia que Ana se vem só de olhar para o prazer que a própria jornalista obtém.
As bebidas não param. Ana sempre se soube controlar no que toca ao álcool. Ana desde cedo criou mecanismos que a impedem de ser derrotada por bebidas oferecidas por clientes ou por pessoas desconhecidas que se queiram envolver com ela. Mas os copos oferecidos pelo funcionário do hotel são mágicos. Imediatamente após um orgasmo, a jovem recebe mais uma bebida na sua mão. A que estiver disponível. Porque neste momento, Ana só tem um membro disponivel. Em cima da mesa de centro, ela está de gatas, com a face erguida virada para o enorme sofá em frente. O seu Padrinho ainda não esmoreceu. Após algum compasso de espera, onde carícias foram trocadas, olhares foram partilhados e sorrisos foram falados, o par volta a gozar de uma união carnal. O homem viril está de pé na peça de mobiliário. Agarra nas ancas da amante, empina o rabo dela e após uma ginástica muito flexivel, onde os joelhos estão ligeiramente dobrados, o Padrinho penetra o seu sexo no rabo da nova convidada da orgia sumptuosa deste hotel. Ana resiste. Ana coloca um cotovelo na base almofadada da mesa e a outra mão transporta o copo até aos seus lábios. Ana morre de sede. O seu interior pede por mais álcool, mais adrenalina, mais frescura sensual. Ana sente que a bebida a alterou por completo. Ana não o nega. Ana até sabe o intuito de ser distribuido constantemente uma mistura entre champanhe e vinho verde. Ana percepciona que é explosivo. E a impetuosa carga que o corpo do homem exerce por cima do seu rabo obriga a jovem a suportar alguma dor. Mas ela está sedada. As suas mamas pulam por cada penetração. As mãos do homem percorrem o seu rabo, abrindo cada vez mais as nádegas. Numa posição submissa, Ana sente-se desorientada. Ciente da intensidade da foda, mas com o campo de visão a mirrar. Ela procura ter os olhos abertos. É dificil. É uma viagem alucinante num sentimento surreal. Ela geme e ela grita. A sua atenção corporal mantém-se na foda que recebe. Mas a sua percepção mental ainda não se afastou das duas mulheres que já perceberam o prazer que ela não se cansa de obter. Elisabete consegue olhar esporádica e subtilmente para Ana. Ao mesmo tempo que continua a ser comida pelo Burguês, saboreia entusiasticamente o enorme sexo do Acompanhante de tez negra que está diante de si. A boca dela, os seus lábios finos mas cremosos, a língua perversa, as mãos possessivas, abocanham o prostituto incansavelmente. Elisabete ansiava por este momento. E enquanto se vem, percebe novamente que Ana a olha com deleite. Mas a jovem, que não consegue entender qual o papel que ocupa neste lugar, está um pouco longe. E quando a sua visão começa a ceder, o sentido da audição interpõe-se na racionalidade da jovem. Ana é chamada à atenção com os gritos constantes da rapariga que está agora deitada no sofá, mesmo à sua frente. Depois de virar a cabeça, Ana procura focar a atenção no corpo da jovem. Surpreendentemente, ela só consegue percepcionar as formas dela. Tudo se desvanece na sua mente. Ainda assim, ela consegue perceber como a jovem é possuída. Com o rabo e a parte inferior das costas deitada na almofada e a cabeça a pender para fora do sofá, a rapariga com cabelos castanhos lisos abre as pernas por completo, encostadas ao peito do Padrinho charmoso e deixa que ele a foda exaustivamente. Ao mesmo tempo, Ana guarda uma estranha sensação de conhecer a jovem, de desejar beijá-la, de querer tocar-lhe. Na verdade, a jovem de dezanove anos também foi arrastada pelo álcool que flui nas gargantas da maioria dos presentes. E a paixão e desejo dão lugar a uma tesão enlouquecida. Na cabeça de Ana, nem a mulher que está diante de si, tem a plena consciência da forma como é comida. E ela tem esta certeza, porque ela própria se sente a perder o controle sobre si mesma. Pousa o copo no tapete e procura erguer a mão, tocando no cabelo da parceira diante de si. O homem que lhe penetra no rabo está praticamente a libertar o seu prazer, mas Ana está anestesiada. Não vai sentir nada, porque os seus músculos, os seus nervos, o seu corpo, o seu cheiro, o seu olfacto, a sua visão e a sua mente perdem toda a energia. Subitamente, Ana sente-se a desligar.
É um corpo que a segura. É um corpo que a abraça. É um corpo que sustenta aquilo que ainda resta da lucidez de Ana. Ela procura abrir a custo os olhos. É um homem que a abraça. É um homem que lhe segura os braços. É um homem que a acorda. Ela sente um ardor no ânus e um inchaço na rata. É um pénis que a penetra na vagina. É um pénis que ainda a fode com insistência. É um pénis que já a comeu por completo. Ela vagueia uma mão pelo seu próprio corpo. Sente a presença de um homem que a abraça por trás. Possivelmente o seu Padrinho. Ela percorre a outra mão pelo tecido que teima em cobrir o homem que a segura na sua frente. Ao tentar abrir os olhos, Ana denota um tom branco. Na sua cabeça está a ideia que é o Bispo que a segura.
- Estás bem? - pergunta o vulto que Ana vê.
- Sim...Estou bem...Estou muito bem... - responde ela com a voz embriagada.
- Estou chocado...És um mulher incansável...Sabes...A Burguesa falou-me muito bem de ti....E não consegui tirar os olhos de ti toda a noite.
- Quem és tu?...
- Não sou ninguém. Aqui dentro sou eu que mando em ti. Mas fora daqui não sou ninguém.
Confirma-se. O Bispo sustém o corpo de Ana. Afectada pelo álcool. Adormecida numa embriaguez previsivel, a jovem procura segurar-se ao homem de hábito branco. A picha do Padrinho ainda a penetra. Mas desta vez, Ana está praticamente sentada no colo do director do hotel. Ela já consegue sentir pouca coisa. O seu campo de visão é quase nulo. Os seus olhos vêm branco. O seu olfacto só cheira humidade sexual. Os seus ouvidos sintonizaram a voz do Bispo. E as suas mãos apalpam o corpo do homem. Estuda-o, procurando identificar algo palpável. Quando toca na face dele, fixa cada pormenor. O queixo definido. A barba leve, os lábios finos, os óculos que tapam os seus olhos. Ana não se consegue manter desperta. Tudo no seu corpo cede. Ela quer adormecer. Ela quer abraçar-se ao homem. Ela quer que ele a segure toda a noite. Apesar de sentir as coxas do Padrinho na suas nádegas e o sexo dele enterrado na sua rata, Ana sabe que é o Bispo que a acolhe.
- O que é que eu sou? - pergunta Ana com voz arrastada.
- Diz?
- O que é que eu sou aqui dentro?... Há Burgueses....Há Acompanhantes...O que é que eu sou?
- Um dia, serás Madrinha...
E na incerteza da afirmação do Bispo, Ana deixa de sentir a ponta dos dedos. É incapaz de sentir a sua vagina. Os lábios ficam dormentes e deixam de sentir, mesmo o beijo leve do homem. Os ouvidos encerram e os olhos pesam demasiado. Neste lugar, ela recebe um abraço amistoso e paternal. Nesta noite, ela já não acorda.
É uma luz forte. Penetra pelo seu sonho, rasga as pálpebras e incedeia o escuro que o seu sono lhe proporcionou. A luz do sol que entra pela janela obriga a jovem a abrir um pouco os olhos. Ela ouve respirações. Sente movimentações e balanços no mesmo local onde o seu corpo está deitado. Não é uma mesa de centro. Não é o chão. É uma cama, certamente. Ana procura perceber onde está, quando está, com quem está e de que forma está. Ela sente-se nua. Sente um leve toque de lençóis lavados a cobrir os seus pés. A luz que teima em entrar pelo seu olhar é inequivocamente natural. É o raiar do dia com toda a certeza. Um toque de pele suave roça nas suas coxas. É um toque leve, claramente feminino. E após um instante, ela consegue recordar o toque das mãos da amante, Elisabete. Impulsivamente, ela cria um sorriso na sua face. Depois de uma noite intensa. Surreal. Única. Irrepetível. Depois de um serão que rompeu com qualquer percepção de experiência sexual de Ana, ela sente-se repousada. A mão da jornalista a irromper pelo seu sexo, abrindo as suas pernas, é talvez a mais sublime sensação que ela pode desejar. Ana imagina o que pode estar a acontecer. Elisabete deve tê-la levado para sua casa. Deve ter-se deitado ao seu lado e adormecido junto de si. Deve ter acordado e aberto os estores. Talvez tenha preparado o pequeno-almoço. Deve ter-se deitado ao seu lado, admirar o seu corpo e desejar possui-la. E a palma da mão que esfrega os seus lábios vaginais é um chamamento. Ana ordena aos seus braços que se mexam. Que procurem o corpo de Elisabete. Mas é nesse instante que os dedos da mulher se abrem. É nesse instante que Ana sente um corpo carnudo penetrar na sua rata. É um homem. Com as pernas abertas, com a mente sã, Ana não esperava sentir um pénis a entrar de novo dentro de si. No imediato, ela abre os olhos e a percepção do que ela já estava a tomar como certo, modifica-se. Deitado em cima do seu corpo, está um Padrinho. O homem que fodeu inesgotavelmente a rapariga de dezanove anos, no sofá em frente. O homem charmoso que lhe a obrigou a conceder alguns segundos de atenção e algumas vibrações interiores. O homem misterioso, súbdito do Padrinho, está agora a fodê-la, ainda nem sequer a manhã acordou por completo. Ao lado deles, está Elisabete. Com um enorme sorriso na face, com o corpo nu, com um encanto apaixonante, com um desejo a transpirar na sua alma. A jornalista abriu caminho para que o homem fodesse a sua amante. Incapaz de perceber por inteiro o que se passa ali. Estonteada pelos acontecimentos da noite anterior. Confusa quanto ao papel do Padrinho ali naquele sitio, nesta manhã. Encantada pela forma como ele possuiu a rapariga. Ana deixa. Nenhuma pergunta consegue justificar o que ocorre tão cedo. Por isso, embalada nas mãos de Elisabete em todo o seu corpo, ela saboreia o momento.
Depois da foda. Depois da fornicação. Depois da posse carnal. Depois do homem charmoso se ter vindo dentro do sexo da jovem. Depois de todo o corpo dela ter vibrado com uma penetração suave. Depois de pedir loucamente o abraço da sua amante. Ana está deitada ao lado de Elisabete. Já percepcionou que está num quarto de hotel. Possivelmente o hotel onde a noite começou. Já entendeu que a orgia já parece um acontecimento distante e surreal. Já aceitou a ressaca que ainda enche o seu corpo. Já viu o Padrinho levantar-se e entrar na casa de banho, para um longo banho. Já libertou um sorriso e beijou Elisabete. Daqui em diante, ela só quer voltar ao mundo real.
- Deves ter imensas perguntas a fazer... - pergunta a jornalista.
- Estou certa que não irás conseguir responder a todas. - diz Ana.
- Tenta.
- Estive a sonhar.
- O quê?
- A noite passada.
- Como assim?
- Sonhei tudo o que se passou na noite de ontem.
- Achas que foi um sonho?
- Não. Não é isso. Acho que foi bem real... Talvez não acredites...Mas revivi tudo o que aconteceu naquele salão.
- Não sei o que te dizer.
- Quem é ele? - pergunta Ana apontando para a porta da casa de banho.
- Um Padrinho.
- Mas ele não é o meu Padrinho.
- Não.
- Nem o teu.
- Não.
- O que está a fazer ele aqui, então?
- Ele é casado com a minha Madrinha.
- Estás a brincar?!
- É tão infiel quanto ela.
- E ela sabe?!... Sabe que ele está aqui? Sabe que tu o fodes? Sabe eu o fodi?!
- Como é que eu te explico?.... Ela sabe. Sabe que eu sou amante dele. Fora deste hotel. Sabe que ele tem outras amantes.... Mas ele não sabe disso.
- Mas os dois fodem com qualquer um.
- Exacto. Mas como te disse...Há regras a cumprir.
- E o Bispo sabe?
- Não! Nem sequer pode saber! Os Padrinhos não podem foder Burgueses de outros Padrinhos sem autorização. Este homem até pode ter deixado o teu Padrinho comer aquela rapariga. Mas o Bispo não iria autorizar que na primeira noite tu estivesses envolvida com dois Padrinhos.
- Mas se nós estamos aqui! E logo no hotel do homem! E eu acabei de foder com ele! E ele não é o meu Padrinho.
- Pois....
- E se alguém nos viu?! E se ele sabe?!
- O Bispo a esta altura deve estar a tomar o pequeno-almoço com a minha Madrinha. Na casa dela. O teu Padrinho veio deitar-te aqui quando perdeste os sentidos.
- Foi ele que dormiu comigo?
- Não. Fui eu...
- E o que aconteceu?
- Tentei acordar-te. Tu abriste os olhos e pediste para eu fazer amor contigo.... Eu fiz amor contigo. Voltaste a adormecer ferrada. Ele ligou para o meu telemóvel e eu abri-lhe a porta. Diz que ansiava foder-te desde que entraste.
O banho do homem charmoso terminou. As mulheres cortam a conversa e aguardam alguns segundos, até ele abrir a porta da casa de banho. O Padrinho, completamente nu, olha para Elisabete com um ar saciado. Ao aproximar-se da cama, fixa a jovem e sorri presunçosamente para ela. Há uma vibração estranha a comunicar entre os dois corpos. Ana não consegue perceber como é que aceitou foder com um homem que para além de não conhecer, não o viu. Apesar do seu charme, ela não se sente mulher de se entregar a alguém do qual pode não ter confiança. E enquanto repara no homem a vestir-se, tenta desvendar porque é que a sua máscara nocturna não funcionou desde que entrou no hotel. Há uma pergunta que se desenvolve na mente de Ana. Algo que lhe invadiu a racionalidade durante toda a noite. Mesmo nos sonhos dela. Ainda ninguém a elucidou do seu papel naquela orgia. Na sua lingua, por entre os seus dentes, pressionada pela garganta, ansiada pelos lábios, as palvras estão prontas a serem entoadas. A pergunta magnânima tem que ser feita. E a resposta tem que finalmente entrar pelos ouvidos de Ana e guardar-se na sua mente. A jovem percebe que o homem charmoso acabou de se vestir. Visiona os seus movimentos e aguarda por uma reacção. Ele pega nos seus objectos pessoais em cima da mesa de cabeceira e segura com dois dedos um envelope. Antes mesmo de Ana ter tempo de fazer qualquer pergunta, o homem charmoso lança um olhar forte à jovem.
- Até uma próxima vez...Foste magnífica. Isto que está aqui é para ti...
Estava pousado propositadamente junto à cama do quarto de hotel reservado a Ana. Um envelope vermelho. Com classe. Ana segura nele, ao mesmo tempo que o homem sai do quarto. E ao olhar para a parte da frente do envelope, a sua dúvida é dissipada. A resposta está ali, numa simples palavra. A noite de ontem confrontou Ana com uma realidade que ela não estava acostumada. A confiança estava lá. Acompanhava-a a todo o momento. A certeza também. Ela aceitava com firmeza o que ia ocorrendo, o que lhe propunham, o que espontaneamente acontecia. Mas as regras não eram dela. Os parceiros sexuais não eram escolhidos por si, estudados ao pormenor. A sua máscara nocturna escondeu-se. Ficou guardada. E isso, numa certa medida desorientou-a. Apesar de ter si convidada, Ana nunca chegou a perceber se entregava o seu corpo e a sua alma como Burguesa ou como prostituta. Ninguém lhe colocou um rótulo. Ninguém lhe exigiu um pagamento por estar naquele espaço requintado, selectivo, privado e luxuoso. Nada deixava entender o que esperavam de si. A um determinado momento, Ana não sabia se estava ali para receber ou dar prazer. Ou ambas. Foda. Fornicação. Cópula. Queca. Sexo. Numa noite assim, é irrelevante o papel profissional que Ana vem assumindo há algum tempo. Num lugar assim, o hábito preto que vestiu não a protegia da dedicação apaixonante que sempre caracterizou a sua máscara. A resposta está ali. Diante do seu olhar. Preso nas suas mãos. Ana sabe exactamente o que está dentro do envelope vermelho, onde na parte da frente está escrito apenas e só, pura e simplesmente, a negro e sublinhado... Acompanhante.
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A cada leitor, a cada visitante, a cada um que já guardou ao menos uma palavra do Edificio Magnolia...Muito Obrigado!