sábado

Escola de mulheres

Publicado a 05-01-2009
Onde aprendemos a ser felizes? Onde nos ensinam a ser melhores? Seremos mais audazes que os demais ou julgamos ter conhecido tudo o que o mundo pode oferecer? A vida é um conjunto de peças teatrais onde decoramos as deixas que um coreógrafo nos ensinou e as interpretamos com quem desejamos no palco onde nos sentimos mais confortáveis. Se assim não for, estaremos constantemente a enganarmo-nos e a representar encenações moldadas por quem não nos quer saber concretizados. L'ecole des femmes é uma peça teatral originalmente concebida em 1662, por Móliere, um dos maiores dramaturgos de sempre. Aquilo que a peça conta pouco interessa para o que se segue. Mas a certeza de que algo se aprende nas escolas onde representamos em diversas fases da nossa vida, é preciosa para entender a revelação desta mulher.
Ana prepara-se para colocar a sua máscara nocturna. Passam doze minutos das dezanove horas e o seu corpo está despido. Diante do espelho redentor da casa de banho, a jovem acompanhante vislumbra toda a sua pele e as condições em que o mesmo se encontra. Uma espécie de preparação, de aquecimento, de concentração exigida por ela própria, para que garanta a si mesma a certeza de mais uma noite formidável. Um processo construtivo repetido vezes sem conta, consequência de alguns anos a mascarar-se. A Ana que entrou naquela casa de banho não será a mesma Ana que irá sair daquela divisão. E isso ela tem que confirmar em todos os encontros com clientes. Advogado de renome na cidade. Viúvo, cinquenta e seis anos contados, filhos maiores de idade. O encontro desta noite é uma companhia que lhe garante um serão agradável, sem receios, com uma boa dose de conversa e respeito mútuo. Cliente antigo, este homem procurou Ana pela primeira vez, dois meses após o falecimento da mulher. No final desse primeiro encontro, a acompanhante resignou-se com o facto de que o seu cliente não pretendia sexo. O mais íntimo que houve entre os dois foi um abraço sentido, sem sequer ela se despir. O homem precisava de alguém que o fizesse sentir vivo. E o sorriso dela tornou-se mais importante do que alguma vez ela pôde julgar. Novos encontros repetiram-se. Houve envolvimento sexual. Ocorreram coisas das quais o cliente nunca imaginou ser possível experimentar sexualmente. Surgiram ideias que a própria acompanhante nunca tinha desvendado serem passíveis de introduzir na sua ocupação. Mais do que cliente, o homem tornou-se um amigo. Sem compromissos. Sem sentimentos confundidos. Ele procurava-a. Ela recebia-o. Eles conversavam. Eles fodiam. Ele pagava-lhe. Ela sorria. E nesta noite, isso vai voltar a acontecer. De uma forma ou de outra. Ana capricha um pouco mais para o poder receber como acha que ele merece. O banho já foi tomado. Lavou a pele com pedrinhas perfumadas de Bali. O corpo já se cobriu de um creme rejuvenescedor importado de França. E enquanto as suas mãos percorrem cada recanto do seu corpo, Ana certifica-se que nada em si está adormecido. Ele vai querer comer fora, certamente. Há já algum tempo que se está para proporcionar um jantar num restaurante no topo da cidade. Irão regressar, certamente. Ele vai elogiar-lhe um vestido exclusivo de corte italiano, comprado na sua loja de eleição, peça quase impossível de encontrar noutro corpo feminino. Ele vai despi-la calmamente, com um toque divino que irá fazer a acompanhante sentir-se acarinhada. Debaixo do vestido ele vai querer ser surpreendido. E por isso Ana veste agora uma lingerie capaz de evidenciar todos os pormenores sensuais e erógenos do seu corpo. Ele vai aceitar que a acompanhante o chupe vagarosamente e com dedicação, quando ele estiver sentado no sofá a beber um Porto. Assim, ela escolhe um baton cremoso que evidencia os seus lábios finos mas experientes. O seu cliente poderá com alguma certeza deixar-se dormir e ficar toda a noite. A cama tem um aroma semelhante ao que o seu peito exala agora. Um sorriso descobre-se na face de Ana. Ela olha fixamente no espelho, como que a comunicar consigo mesma. Ela vai comê-lo. Proporcionar-lhe um deleite sexual que se irá manter na memória dele por muito tempo. Na cabeça da jovem acompanhante está a imaginação que ela transforma da forma como ela vai saltar sobre a cintura dele, sentido o seu sexo ainda vigoroso. Sim, pensa ela diante do espelho. Vai ser uma noite poderosa. A confiança que anos de devoção a esta estranha profissão tatuaram no seu corpo evidenciam na postura experiente que ela ainda detém na sua casa de banho, assim que a máscara nocturna de Ana se apresenta. A campainha do seu apartamento toca antes do tempo.
Não é suposto ele chegar tão cedo. Ana é muito rigorosa com a hora marcada e oito em ponto não deixa margem para erro. O seu cliente não costuma contrariar as exigências da sua acompanhante. Ainda assim, Ana não arriscou. Veste um robe branco, de uma seda pura, com um contorno da cor da sua lingerie. Olha em redor e confirma que o seu apartamento está pronto para receber uma visita. Junto à porta de entrada, carrega no botão que a faz aceder ao ecrã do intercomunicador. Na portaria do Edifício Magnólia não está ninguém. Apenas alguns vultos de pessoas que passam na rua. Por descargo de consciência, Ana espreita pelo olho mágico da porta de madeira. Afinal, alguém tocou mesmo à campainha do seu apartamento. Mas não é o seu cliente. É uma mulher. Está de costas para a porta, avistando-se parte de um penteado loiro. Por dois segundos, ela tenta fazer uma associação e figurar quem pode estar inusitadamente à porta de sua casa. Um pequeno calafrio percorre a sua espinha e depois, Ana abre. A estranha mulher que aguardava que a inquilina do 3º direito a recebesse gira o seu corpo, envolvido por um enorme sobretudo castanho e sorri para a jovem.
- Manuela...Mas...Como é que me descobriste? - solta Ana.
- Não foi por teres levado contigo a carteira de clientes, que eles deixaram de vir à minha casa... Por uma noite diferente, consigo muita coisa, minha querida... Consegui a tua morada...
- Estou a ver...
- Vais deixar-me aqui à porta?
Ana desperta. Após a sacudidela na sua alma, Ana recompõe a postura e abre caminho para que a mulher entre em sua casa. A mulher de cinquenta e cinco anos, ar jovial, não obstante as rugas que cortam a sua face bonita, dá três passos e olha sem receio para Ana. Pára por um instante e entrega um beijo meigo e profundo na maçã do rosto da inquilina. Denota-se na aparência dela que é uma mulher vistosa, presunçosa e decidida, para além de evidenciar uma ostentação social. Ao entrar no apartamento, ela parecia querer tomar conta daquele espaço. Ana assiste com alguma incerteza aos passos daquela mulher que não lhe é desconhecida.
- É aqui que trabalhas? - pergunta a intrusa.
Manuela é a gerente de um clube privado de acompanhamento, numa rua discreta mas elegante da cidade. Manuela é também professora universitária num pólo de ensino nos limites urbanos. Manuela é a antiga mentora de Ana, quando a jovem era a coqueluche do seu clube nocturno privado. A mulher que está diante da acompanhante confiante foi a professora da máscara nocturna que hoje Ana se orgulha de colocar. E porque as coisas não terminaram bem, na transição da jovem para esta nova realidade, Ana não consegue esconder o nervosismo que aquela presença surpreendente lhe provocou. Ainda assim, cumpre o seu papel. Segura o casaco que Manuela acaba de retirar.
- Eu perguntei-te se é aqui que trabalhas...
- É...É sim, Manuela... É aqui que trabalho.
- Cheiras maravilhosamente...está a chegar algum cliente?
- Sim...às oito...
- Pois... O que achas?... Estás preparada para recebê-lo?
Ana hesita. O carácter inquisitivo da conversa de Manuela põe a jovem ainda mais desorientada, perdida de confiança. Naturalmente, agora ela não está preparada para receber o seu advogado viúvo. Mas ele vai chegar. E vai encontrar aquela que sempre foi a proxeneta de Ana. Há mais de seis anos, ela era uma rapariga perdida de horizontes. Os desafios que se tinha proposto quando rumou a esta cidade pareciam dissipar-se numa desilusão. A representação era de facto o seu forte, mas os palcos congelavam-na, limitavam-na. Era seu hábito tomar café na esplanada de um lugar reservado e cosmopolita, com a única amiga de infância que estava próxima de si naquela cidade, sendo ela também uma saborosa amante. Na única cadeira que estava vaga na mesa, uma mulher misteriosa, madura e ainda assim bonita, sentou-se, quase sem pedir permissão. Meteu conversa com ambas, mesmo que tivesse dificuldade em receber respostas. Ana e a sua amiga tentavam perceber quem era aquela mulher que fumava com graciosidade e as olhava com um desejo peculiar. O elogio surgiu. Para Manuela, Ana era das jovens mais carismáticas que já tinha conhecido. Uma beleza fascinante e um corpo de cortar a respiração. A amiga da jovem não ficava atrás, mas era Ana que a tinha chamado a atenção quando as viu naquele mesmo café. O convite foi lançado. Manuela pretendia que as duas jovens passassem a noite no clube privado que ela geria em conjunto com o marido. Não era prostituição. Não seria se elas assim o entendessem. Seriam tratadas com princesas, sem qualquer tipo de exigência. Iriam vestir a roupa mais elegante que alguma vez se colou ao corpo delas, iriam tomar as bebidas mais ousadas que pudessem experimentar, iriam escolher o homem que mais as pudesse excitar. Sem compromisso. No maior sigilo que se podia prometer. A amiga de Ana recusou veemente. Manuela lançou um olhar presunçoso para essa jovem e nem sequer se incomodou quando ela quis ir embora. Ana ficou. Não porque tivesse aceite o convite. Apenas e só pelo facto de se ter fixado em Manuela. As duas mulheres cruzaram um olhar inesquecível. A senhora elegante que estava diante de Ana sabia que a podia convencer. Um envelope branco foi colocado em cima da mesa. Manuela confiou na oculta consciência de Ana. Deixou o envelope onde estava a morada do clube e uma nota gorda, levantou-se da cadeira e de pé, deu-lhe um beijo na testa. A mulher estava convicta de que na mente de Ana, ela já tinha aceite o convite ousado mas deslumbrante.
- Não achas que é melhor informá-lo?
- Do quê?!
- De que vais adiar o encontro.
- Porque haveria de fazer isso?
- Diz-me que não me queres aqui.
Ana silencia. Ano e meio após ter saído abruptamente do clube, a jovem não mais entrou em contacto com a sua mentora. Porque ela sempre a considerou mentora. E não encontrava outro substantivo que qualificasse o papel de Manuela na sua vida. Sim, ela quer aquela mulher ali. Sentada no seu sofá. A fumar o cigarro intenso. A oferecer-lhe o sorriso meigo mas violentamente presunçoso. Sim, mesmo após tanto tempo de ausência, Ana quere-a ali e algo mais.
- Nunca duvidei que te pudesses dar bem noutro lado. - diz Manuela.
- Mas desejaste que me arrependesse do que fiz depois de sair...
- Estás arrependida?
- ...Tenho saudades... Mas não estou arrependida. E sim, estou a dar-me muito bem aqui.
- Tens tido problemas?
- É como morar num sitio sublime e poder trabalhar em paz.
- Os clientes ajudam...
- Manuela, se vens exigir que não esteja com os teus clientes...
- Tens o direito de os querer. Sempre foram os teus clientes. Respeito isso e não te quero mal... Por favor, liga ao teu encontro.
Ana resigna-se. Na verdade, dentro dela há uma ansiedade enorme. Ela deseja Manuela ali. Exactamente ali. Mas Ana sempre foi uma mulher de palavra. E não é do seu agrado cancelar um encontro em cima da hora, especialmente com um cliente tão fiel. Mas ela faz a chamada. Diante da sua antiga patroa, a acompanhante cancela educadamente a marcação que lhe iria ocupar esta noite.
- O que queres de mim, ao fim de tanto tempo, Manuela?
- ...Estou bem, obrigada... O clube ainda funciona e as meninas ainda gostam de lá estar.
- ...Desculpa... Como estão elas?
- Tens razão... Não posso querer ser vossa mãe para sempre.
- A Verónica?
- Casou-se...
- E a Bianca?...
- Achava que já não tinha idade para o fazer. Saiu há um mês.
- A Tatiana?...
- Desde que te foste embora que é a nossa melhor acompanhante.
- E o Nuno?
- As mulheres pagam-lhe muito bem. Parece que a idade lhe faz bem.
Ana sorri. Faz-lhe bem saber das boas novas do sitio onde trabalhou durante um período crucial na sua vida. Ela recorda-se da primeira vez que entrou naquele prédio, semelhante a uma pensão. Vestia a roupa mais sensual que tinha no seu guarda-fatos e procurava manter um ar reservado. Foi Manuela quem a recebeu, depois de passar o segurança. Antes mesmo da noite cair, a mulher mostrou o bar restaurante que se situava na cave do edifício. À medida que chegavam, Manuela apresentava as acompanhantes que a cumprimentaram com um sorriso muito generoso. Mulheres bem vestidas, com um ar muito sereno, sensuais e desfasadas do estereotipado modelo de prostituta. Ana conheceu também o único acompanhante masculino da equipa. Um jovem mulato, com um corpo excitante, umas mãos extraordinárias e um sorriso fatal. Faltava conhecer a pensão. Para aquela primeira noite, Manuela tinha prometido um vestido novo e o melhor quarto à disposição. Para concluir, ela só tinha que decidir se queria convidar algum homem que se apresentasse no bar, nessa mesma noite. Ao entrar no quarto privado de Manuela, Ana sentia-se cada vez menos receosa do que estava a fazer.
- E tu, como estás? - pergunta Ana.
- Eu creio que sabes como estou...
- Não, não sei, Manuela...
- O Fernando...ele...
- Eu soube... os meus pêsames...
- Posso saber porque é que não me dirigiste palavra no cemitério?
- ...Nem eu sei, Manuela...
- Uma ova que não sabes, Ana!!...
Ana recua. Nessa primeira noite, no quarto de Manuela, a mulher tornou-se extremamente carinhosa para Ana. Ninguém tinha prometido nada. Seria só uma noite. A jovem não precisava de voltar. Iria receber, mas sem obrigação de se envolver fosse com quem fosse. Ainda assim, o clube tinha regras. E Manuela explicou-a todas, num tom de voz muito calmo, sem deixar escapar nenhum detalhe. Primeira regra, ninguém, mas mesmo ninguém poderia saber da existência e da localização do clube. Segunda regra: os acompanhantes não seriam impedidos de terem relações sexuais fora do âmbito do clube, desde que não houvesse compromisso. Terceira regra: os acompanhantes não poderiam receber dinheiro por encontros sem o conhecimento dela ou do marido. Quarta regra: seria interdito o relacionamento intimo entre funcionários, dentro ou fora do clube. Quinta regra: a gerente tinha que ter conhecimento imediato de qualquer transgressão de uma das regras anteriores. Sexta regra: o não cumprimento da quinta regra implicaria a expulsão do clube, sem qualquer excepção. Ana ouviu atentamente a explicação clara das regras. Ana foi, no entanto, alvo da sexta regra por parte de Manuela. O grito que a mulher acabou de lançar no centro da sala do 3º direito exaltou-a. Manuela levanta-se e investiga o apartamento da jovem. Aprecia o luxuoso e requintado quarto de Ana, onde ela se arranja, onde ela dorme, onde ela recebe os clientes. Senta-se na cama e acaricia a colcha de veludo.
- Tiveste vergonha, não foi?
- Manuela... quando eu soube da morte do teu marido...
- Ficaste tão transtornada quanto eu...Foi isso?
- Sim...claro que tive vergonha de te dizer algo... e obviamente que fiquei transtornada.
- Porque é que não me disseste?
- As regras sempre foram muito claras.
- Só pedi para cumprir a quinta regra! Não tinha que haver a sexta.
- Lamento... A sexta regra sempre assustou qualquer uma de nós...E foi difícil de evitar...
- Fodeste o meu marido!!
Ana congela. Ela aguardava que a mulher a atacasse com esta verdade. Porque aconteceu. E desde o momento que Ana confrontou o olhar de Manuela na porta do seu apartamento, ela sabia que teria que recordar a verdade. Na primeira noite no clube, Ana conheceu o marido da gerente, Fernando. Ele era como um sócio de Manuela naquela sociedade oculta. Era ele que trazia grande parte dos clientes, dando segurança a todos os membros envolvidos, de que apenas estariam ali dentro homens e mulheres sigilosos e de confiança. Um homem sedutor, com quase sessenta anos, galante, bom falante, excelente ouvinte. Ana nunca negou o fascínio que Fernando lhe proporcionou. Mas isso aconteceu depois da jovem ouvir as regras da casa. Durante imenso tempo, Ana resistiu à tentação. O homem seduzia-a secretamente, mas ela cumpria o que tinha prometido. A sua gerente era Manuela e não ele. Fernando era apenas um elemento distante na vida do clube. Mas a obsessão do homem era aprazível, tentadora. Ana não podia negar que se sentia atraída. Aprender a controlar o desejo e a domá-lo não chegou. Ana envolveu-se com o marido da sua patroa, numa noite em que ele se ofereceu para comprar um encontro. Houve um beijo, houve palavras meigas, houve umas mãos soberbas a invadir o seu corpo como nenhum cliente conseguiu fazer. Houve uma masturbação no elevador da pensão que a deixou fora de si. Houve um momento de paixão no quarto de Ana que ficou marcado em todo o corpo da jovem. Fernando penetrou nela, retirando à mulher qualquer capacidade de reagir. E naquele momento, Ana confessou à sua alma que nunca nenhum homem lhe tinha provocado tamanho sentimento.
- Apaixonei-me... Que te posso dizer mais... O Fernando procurou-me. Ele quis pagar e... e eu apaixonei-me... Nunca te poderia confessar isso. Eu amei o Fernando.
- Eu sabia o que estava a acontecer. Desde a primeira vez que ele te lançou o olhar que eu sabia que iria acontecer... O Fernando comia as acompanhantes todas... E eu sempre o soube... Nunca tive ciúmes... Nós éramos assim... Mas...
Ao fim da noite, Fernando deixou um envelope branco. Ana não quis aceitar. Porque estava apaixonada.
- Se eu tivesse aceitado o dinheiro talvez te pudesse contar. Mas até eu sabia que estava a romper com algo. Não poderia aceitar dinheiro depois de...
De uma noite assim tão perfeita, tão cheia de tudo o que uma mulher como ela podia desejar. E ela quis repetir. E tudo foi repetido. Até Manuela entrar uma noite no quarto da jovem e assistir a uma dupla traição. A sua acompanhante de eleição, a fortuna daquele clube, a menina dos seus olhos, estava a cavalgar em cima do seu marido, libertando um orgasmo revelador, suando uma noite poderosa de carne e volúpia.
- Não te queria magoar... Não queria magoar ninguém...
- Foste a menina em quem mais confiei. Sempre quis ser tua amiga.
- Eras como uma mãe para mim.
- Mas traiste a tua "mãe".
- Não me arrependo de o ter amado, Manuela. As tuas regras não podiam evitar isso. Aconteceu... Não to disse... Também estou arrependida disso. Mas não posso voltar atrás.
- Queres voltar atrás?
- Não. Não posso. Não quero... Estou bem assim. Também te amei e não invocaste a sexta regra.
- É diferente... Fui eu que criei as regras.
- Por isso é que o melhor foi ter saído.
- Sinto a tua falta.
- ...Eu também.
- Vem cá...
Ana chora. Solta duas lágrimas. A conversa é tensa. Recordar aquilo que se procurou esconder pode atormentar todo o corpo. E ela está a tremer. Aproxima-se da cama e deixa que Manuela envolva as mãos maduras nas suas ancas. Ela ansiava por aquele toque. A mulher fixa o olhar na rapariga e sorri, como que um perdão silencioso. O tempo cura algumas coisas e deixa sangrar aquilo que nunca se quis curar. O marido de Manuela e antigo amante de Ana já não está cá. E o rancor pouco ou nada irá resolver. Até porque há sentimentos mais fortes a evocar.
- Estás uma mulher. A mulher mais bonita que alguma vez toquei.
Manuela puxa o cordão vermelho que aperta o robe à cintura da acompanhante. Ana solta um sorriso envergonhado.
- Ias receber o teu cliente de robe?
- Não...Comprei hoje um vestido na nossa loja...
- Quero que o vistas... Quero vê-lo como se fosses recebê-lo. Quero senti-lo como na tua primeira noite no clube.
A mulher pede a Ana para se vestir, tal como estava suposto se ela estivesse para receber o seu cliente. A jovem solta-se vagarosamente do abraço da mulher e regressa à casa de banho, espaço de preparação para qualquer acompanhante de luxo. Menos de cinco minutos decorridos, Ana regressa ao seu quarto. No seu corpo já se colou o vestido preto acetinado, ajustado ao corpo, curtinho, uma palmo acima dos joelhos. Evidencia as suas coxas, por debaixo dos collants de vidro, transparentes. Deixa entender as formas do seu peito, cobertas pelo tecido fino que sugere a suavidade da sua pele. E os seus braços descobertos acentuam o tom sensual que a sua derme hidratada lhe incute. Manuela ainda está sentada na cama, impávida com a postura da sua antiga acompanhante. Mas agora, ela tem o peito desnudado. Ousou despir a blusa elegante que ostentava e retirar a peça interior que lhe cobria os seios flácidos mas bonitos. Ana vem confiante, apesar de ainda receosa das intenções da antiga chefe. Ana sabe-se deslumbrante, apesar da luz não amplificar essa beleza. Ana prende a respiração quando desvenda a pele das costas de Manuela. Subitamente, ela transporta-se a si mesma no tempo, ao sabor das emoções que se guardam eternamente.
- É verdadeiramente fabuloso!.... Estás mesmo linda, Ana!... Precisa apenas de um pequeno jeitinho... Deixa-me só...
Ana inspira. Foi sempre assim que Manuela a conquistou. Era o seu amuleto. Era o seu ensinamento. Como na primeira noite. A professora e gerente do clube entregou um vestido radiante para a jovem Ana vestir e sentir-se a mulher mais bela daquela noite. E ela sentiu-se. Despiu-se diante da mulher desconhecida e experimentou a peça de roupa azul, que lhe tocava na barriga dos pés. Manuela assistia a tudo aquilo e entusiasmava-se. Era ela que lhe dava os últimos conselhos, as derradeiras palavras experientes, os decisivos arranjos no vestido, no cabelo e no corpo da jovem, que se arrepiava com o toque das mãos da mulher. Antes mesmo de descer até ao bar do clube, onde iria escolher o seu primeiro cliente, Ana sentiu a palma das mãos experientes a voltarem a despir o seu vestido. Antes do seu teste decisivo, Ana fez amor com a mulher que orientou para sempre a sua vida.
- Perdoa-me, Manuela... Perdoa-me se não te fui fiel...
Ana sonha. Fecha os olhos, aguardando pelas mãos de Manuela. Gira o seu corpo e vira a sua face para o espelho da cómoda diante de si. A mulher madura levanta-se da cama com presunção e um sorriso excitante. Ela está agora nas costas de Ana e agarra o peito dela com firmeza, por cima do soutien carmesim, depois de abrir o botão que segurava o vestido nas costas, junto ao pescoço. A jovem continua a sonhar. A saber que são as mãos carinhosas da sua antiga educadora a tocar-lhe. A desejar repetir essa emoção que atravessou o seu corpo na primeira noite em que vestiu a máscara nocturna. A querer que a mulher possua essa vontade de ser novamente amada da forma mais surreal que já experimentou. Manuela roça os seus mamilos duros às costas suaves da acompanhante e beija levemente o pescoço dela, depois de desviar os cabelos com o queixo. Ana arrepia-se e geme baixinho. A mulher acaricia os seios com prazer, com convicção, trazendo novamente paixão ao peito sublime que sempre clamou por ser tratado com carinho. As mamas de Ana, redondas, perfeitas, charmosas, tesudas, pulam para fora do soutien rendado e colam-se à pele das mãos da mulher cinquentona. Algo explode dentro da acompanhante, quando o seu peito é tocado com toda a pureza.
Ana entrega-se. Fazer amor com uma mulher de cinquenta e alguns anos é, para Ana, como descobrir as fragilidades que o seu corpo consegue esconder na partilha com outras pessoas. Manuela tem a capacidade de revelar as emoções femininas da jovem num jeito que se pinta incansavelmente na pele de Ana. E por isso, seis anos depois de ter entrado num mundo oculto, em grande parte devido à paixão que sentiu pela mulher madura, a acompanhante desperta para um vigor íntimo que não está ao alcance de quem a queira provar levianamente. Ana é despida com carinho e devoção. Manuela mistura o toque dos seus dedos com a leveza dos seus lábios, enquanto vai descendo pelo corpo jovem. Retira o soutien e beija os seios redondos e macios com intensidade. Os gemidos de Ana são ponderados e demonstram o quanto ela vibra com aquelas acções. A mulher beija o umbigo dela ao mesmo tempo que coloca os joelhos no chão. Encosta a acompanhante à cómoda e enfia os dedos por dentro das cuecas rendadas dela. Puxa a peça de roupa e fá-la escorregar pelas coxas suaves de Ana. A roupa intima parece volátil, assim que a boca de Manuela se cola ao âmago da jovem. Caem até aos tornozelos enquanto a boca da anfitriã solta um gemido agudo e que se dissipa nos ouvidos da amante.
Ana balança. Nua e presa no desejo da mulher, Ana está num limiar perigoso. O mesmo que precipitou a sua saída do clube. Ela está entre a adrenalina de se sentir acompanhante e na paixão de querer sentir verdadeiramente aquela mulher. A jovem balança entre a máscara nocturna e a sua representação diurna. E na indefinição de como tudo irá terminar, Ana deixa-se apoderar pela sede de Manuela. Esta misteriosa mulher, que vincadamente fez parte da vida de Ana durante dois pares de anos, que ensinou os virtuosos segredos do mundo da sedução proibida, que de uma forma muito peculiar transformou a jovem numa mulher confiante, altiva e sexualmente fatal, suga agora toda a viçosidade corporal que a acompanhante acumulou ao longo destes meses em que trabalha por sua conta e risco. A sua língua invade a rata formosa da jovem, introduzindo um calor e uma volúpia que atinge exponencialmente todos os recantos que fervilham dentro de Ana. A jovem cerra os olhos e tenta colocar o rabo firme e macio em cima da cómoda, ao mesmo tempo que abre as pernas para que a boca de Manuela se enterre autenticamente por entre os lábios vaginais. A mulher goza os primeiros sucos íntimos da sua acompanhante predilecta e recorda o quanto aquela alma, que agora ela chupa, lhe trouxe momentos divinos, nos tempos em que Manuela como que a possuía.
Ana treme. A mulher já a deitou na cama. Já perfurou o seu sexo com dois dedos da mão esquerda e com três dedos da mão direita. Já devorou o clítoris com os lábios febris da sua boca. Já apalpou as nádegas redondas da jovem e roçou os dedos pelo buraco anal. Manuela já conseguiu dominar o querer de Ana, assim que ela se deita na sua própria cama, com as pernas dobradas, mas dilatadas, com os braços dobrados, mas seguros aos seios, com a alma rendida mas a deliciar-se com cada toque, cada beijo, cada gesto de intensa paixão, promovidos pelo desejo da antiga patroa. A mulher está agora a deslizar pelo corpo da jovem, com os bicos das suas mamas a roçarem pela derme pura de Ana. Elas envolvem-se agora num abraço sereno, onde há lugar para se tocarem e para trocarem um beijo demorado. Porque aquele beijo é mais do que uma mera troca de bocas. Ana gosta de sentir os seios da mulher madura dentro da sua boca, com os bicos entre os seus dentes. Ana adora escorregar os seus dedos pelas costas da amante, enquanto sente a respiração ansiosa dela. Ana delira com os dedos de Manuela a continuarem a masturbá-la, como se tudo aquilo fosse um eterno prolongamento do prazer. Na cama que testemunhou dezenas de encontros profissionais de Ana, as duas mulheres encontram uma forma surreal de expressar a saudade e o fervor que se acumulou em ambos os corpos, à espera deste momento. As mulheres fazem amor e apesar da enorme distinção de idades, elas formam um ser único.
Ana explode. Na imensa vontade de ser amada e emocionalmente compreendida. No desejo de provar o que outros desdenham. Na fúria de entender o porquê do passado não se ter prolongado. Na ansiedade de querer descobrir o que traz o futuro próximo. Ana vem-se. Expele o acumulado de deleite que a boca, as mãos, os dedos e todo o corpo de Manuela provocou dentro de si. A maioria dos seus clientes consegue provocar à acompanhante um prazer superficial. Não significa que não seja um prazer forte, intenso, recompensador. Mas raramente é um prazer que procura penetrar no interior de Ana. Aquele íntimo que nem ela própria conhece verdadeiramente. Manuela consegue alcançar esse âmago. Consegue dominá-lo. Consegue retirar dele todas as virtudes sensuais da jovem e transportá-la para um mundo onírico que poucas mulheres conseguem sequer imaginar. Manuela sempre procurou conhecer os profissionais com quem trabalha. Aprendeu a dar prazer, ensinando a recebê-lo. Foi isso que fez com a sua protegida. Mas Ana elevou essa sensação de poder. Ana extravasou o deleite que Manuela sentia poder dar. E entre elas criou-se uma simbiose admirada por colegas e por clientes. Como uma parceria vitoriosa. E agora, que a mão de Manuela segura o orgasmo de Ana, agora que a rata se desfaz em palpitações húmidas, agora que as mamas estão rígidas e escaldantes, agora que a ela morde o lábio inferior, explode o prazer que ambas reconheceram necessitar, assim que se confrontaram na porta de entrada do 3º direito. Entre as duas mulheres, o orgasmo é uma encenação perfeita, com direito a um encore. Elas irão continuar a fazer amor pela noite fora, mas este instante é para guardar. Para saborear. Para viver em câmara lenta. Para entender nos gestos que se trocam, nas respirações que se acalmam e nas palavras que se querem dizer. Os olhares partilham-se, procurando entender o que se esconder na alma alheia. Os lábios dilatam-se querendo sorrir, assim que se vai ganhando coragem para desabafar.
- Vais dizer-me agora...o porquê de teres vindo aqui?
- Arrancar de ti este orgasmo poderoso não é motivo suficiente?
- Manuela, eu conheço-te... Eu sei o que me queres pedir... Mas quero ouvi-lo da tua boca...
- As coisas mudaram... Desde que o Fernando morreu, perdemos alguns clientes. Não me sinto satisfeita como algumas acompanhantes entendem o negócio. Mas não as censuro. Os clientes já foram melhores e eu também já fui mais selectiva... Não estou insatisfeita com o que tenho, mas... falta qualquer coisa...
- Irás conseguir encontrar um novo rumo... O clube passou por várias crises e tornou-se ainda melhor depois da tempestade...
- Eu quero que voltes, Ana.
A jovem bloqueia. Ela sabia que Manuela iria fazer aquele pedido. Ela aguardou meses por um instante como este. Ela imaginava a mulher a dizer as palavras que Ana presunçosamente tinha a certeza de um dia ouvir. E quando a sua antiga mentora está deitada ao seu lado na sua cama, com o peito excitado por si a pender até roçar na colcha, com a respiração a colar à sua face, com as mãos molhadas pelo seu íntimo, custa-lhe ouvir aquilo que Manuela disse. E nem a própria Ana julgava que afinal, era indiferente que a mulher o confessasse. Porque agora, ela tem outras convicções.
- Era isto que querias ouvir, não era? - diz Manuela altivamente.
- Era...
- Eu sei que errei. Nunca me devia ter precipitado num julgamento sobre algo que fizeste.
- Eu traí-te, Manuela.
- E ele também... No entanto fiquei com ele até ao último dia.
- E eu teria ficado contigo para sempre...
- Por favor, volta.
- O que eu sou hoje foste tu que me ensinaste. Foste tu que criaste a vida que tenho hoje. E não a quero trocar. Pouca coisa me faz querer trocar esta vida que tenho.... Mas não posso voltar.
- Não vai mudar nada... Terás todas as regalias, as que achas que deves ter... eu mudo as regras que tiver que mudar...
- Adoro o sitio onde moro, Manuela. Este é o sítio onde trabalho e onde me sinto livre.
- Volta, Ana. Peço-te.
- Não...
Sim, elas irão voltar a envolver-se. Irão tornar aquela noite interminável. E mesmo que tudo possa ser derradeiro, Ana não vai voltar. Vai ficar na cama onde sente poder controlar aquilo que faz e que sente. Fazer amor com a mulher de cinquenta e poucos anos conduz o seu corpo a uma sensação de pureza. Olhar a sua antiga patroa frontalmente fá-la reconhecer o quanto aquela mulher foi importante na sua vida. Ouvir as palavras dela parecem sempre novos ensinamentos. Mas como em qualquer escola, esta aluna cresceu. Tornou-se independente e acima de tudo triunfadora, na sua forma única de consagrar o seu corpo e a sua alma. Não será Manuela a demovê-la dos seus desejos. Mas entre estas mulheres ficará sempre uma ligação tão profunda como o que construíram.

sexta-feira

Coppélia

Publicado a 29-12-2008
Dança-se sobre a ideia de uma troca de parceiros. Actua na incerteza do amor exclusivo. Interpreta a desconfiança e o ciúme, a paixão e a fantasia, a vingança e a redenção. Coppélia é um ballet com uma dose de comédia, outra de sentimentalismo e uma pitada de surrealidade. Estreada em Paris no século XIX, foi o ballet mais representado na Ópera Garnier, na Cidade- Luz. Conta a história de Swanilda e o seu noivo, Franz, que se interpõem na vida do Doutor Coppelius, que fabrica brinquedos e tem fama de bruxo, bem como da sua boneca Coppelia, tão semelhante à carne humana. A curiosidade e o fervor do que se quer revelar misturam estas quatro personagens.
Quem são estas pessoas que se coincidem numa traição simultânea ao casamento? Que novidade proibida é esta que os tornam insanes por um objecto de desejo tão pessoal, tão escaldante, tão perigoso, tão real? Repete-se agora a dança que Helena e Rodrigo dançaram com os seus amantes, casados um com o outro, a sete minutos das cinco. Quem são eles? Mário é um médico de clínica geral, com um consultório privado na baixa da cidade. Casado há quase vinte anos com uma mulher que lhe deu uma concepção de família, dois filhos lindos e uma estabilidade paralela à sua carreira de sucesso. Colecciona amantes dentro do seu consultório, experimentado aventuras sexuais que se guardam no segredo da sua imagem social. Ainda assim, preza em esforçar-se para que o seu lar seja uma riqueza de sentimentos. Anabela é a devota esposa deste médico. Dona de casa por gosto mas também dedicação, acumula funções escriturárias numa firma de construção civil que pertence aos seus progenitores. Assim, tanto pode ter um inusitado avental a cobrir-lhe o corpo como pode evocar as curvas do seu corpo num fato clássico mas também ousado. Os filhos, esses, trouxe-os ao mundo na forma de casal e todos os dias servem para espelhar a imagem que ela quer dar de si mesma. Nos seus segredos mais íntimos, guarda uma mão cheia de amantes, resgatados nas triviais tarefas diárias de uma mãe e esposa e que se escondem nos libertinos horários que o divergem do marido.
Helena é mais uma das belas mulheres que acorreu ao consultório do Dr. Mário, em busca de uma consulta dispendiosa, mas privilegiada. Começou com o rumor que Helena ouviu de uma amiga de sessões de cabeleireiro, sobre um médico maduro e sensual. Avançou com uma anormal queixa do seu filho mais novo, no joelho dorido. Penetrou no arrebatamento que ela sentiu ao estar diante dele, sentindo a mão direita possante do médico quando o cumprimentou e um olhar devorador em todo o tempo da consulta. Confirmou-se quando ele passou a mão sobre a coxa descoberta dela, por debaixo da sua secretária, com o paciente adolescente ali mesmo ao lado. Gerou-se quando Helena voltou sozinha para receber os resultados dos exames do seu filho. Eles eram casados e desejavam ter em comum a ânsia de serem apaixonadamente infiéis.
Rodrigo é o amante maduro de Anabela. É ele que tem aquele ar de homem sério, comprometido mas infiel. Atrevido mas com telhados de vidro. Os outros são apenas pedaços de um homem perfeito que a mulher tenta encontrar em todo o esplendor no seu marido. Desde o jovem universitário que se torna incansável no saciar das suas frenéticas sedes libidinosas, até ao depravado talhante que lhe satisfaz as mais mordazes fantasias sexuais. Começando no vizinho reformado que faz pequenos arranjos no apartamento e no seu corpo obscuramente lascivo, terminando no inexperiente mas encantador colega de trabalho, recentemente casado com uma jovem católica praticante. Mas Rodrigo é diferente de todos estes amantes. Para Anabela, ele é o intermédio dos outros amantes, porque lhe traz um equilíbrio de sensações proibidas.
Quis entrar quase imperceptível. Ainda assim, teve que enfrentar a assistente do Dr. Mário, uma mulher de cinquenta anos, gélida mas consciente do carácter debochado do consultório onde trabalha. O seu posto de trabalho está assegurado pelo sigilo que ela se compromete em manter de cada vez que permite uma mulher como Helena em entrar pela porta atrás de si. O médico recebeu-a com o mesmo olhar penetrante, com um indesmentível gozo de quem sabe receber. Helena entregou-se como quem pagou para ter aquele homem. Deixou que o seu corpo se tornasse frágil, maneável e volátil. Despiu o casaco, evidenciando a suavidade da sua roupa, descaradamente fácil de retirar. Atrás do biombo branco, Mário abriu a blusa branca da amante e invadiu a mulher com as suas mãos quentes e carinhosas, num abraço intenso, embrulhado na respiração ansiosa dela. Por detrás desse biombo, o doutor examinou a tesão de Helena, certificando-se que os seus seios estavam a arder de desejo. E ela pertencia a todo o querer do seu amante.
Conheceram-se no sapateiro, dois quarteirões acima do Edifício Magnólia. Ela rebuscou um olhar inocente, ele desvendou-lhe a alma sensual e feroz. Partilharam o atendimento do velho por detrás do balcão e imaginaram um beijo voraz em qualquer sítio, desde que fosse imediato. Os sapatos estavam remendados, pela segunda vez no espaço de uma semana. Rodrigo lançou um sorriso indiscreto e vislumbrou toda a postura feminina. Ela não tinha o avental vestido, nem tão pouco o fato profissional. Ainda assim, Anabela mostrava o seu corpo maduro, os seus gestos sábios, o seu peito firme. Regressar pelos dois quarteirões é suficiente para Anabela se sentir novamente conquistada pela adrenalina do seu amante. Subir até ao 1º esquerdo justificava-se na necessidade de extravasar a volúpia sentida em todos aqueles passos. Rodrigo voltou a beijá-la após fechar a porta, com a garantia de que tão cedo ninguém regressava à sua casa.
No ballet, o casal pode fingir ser outro alguém. Nem que fosse para perceber até onde é que consegue chegar. Nem que para isso tenha que surgir algo de diferente na sua vida, algo que revele uma outra personalidade desconhecida. Em Coppelia, a jovem procurou disfarçar-se de boneca, deixando-se entregue aos caprichos do Dr. Coppelius.
O divã do consultório excitava Helena. A ideia de fragilidade, de inocência, de permissão preenchia as fantasias da mulher. A sua blusa branca estava presa junto aos cotovelos, ainda que o seu soutien bordeuax já se estendia no chão. Os seus mamilos arrebitavam em bico, oferecendo-se ao fervor do doutor que a empurrava agora em direcção à cama clínica. Ao mesmo tempo, ele puxava-lhe a saia azul para cima, fazendo-a escorregar pelas coxas meigas de Helena. A mulher casada sentou-se sobre a cama, aguardando os gestos do seu amante. Mário colocou-se vagarosamente entre os joelhos dela, acariciando as mamas excitadas da mulher. Aproximou a sua face do pescoço dela e empurrou-a delicadamente para trás. Leve como uma pena, Helena deslizava os seus membros como um fantoche. As suas nádegas escorregavam pelo tecido da cama, enquanto a sua perna esquerda se erguia ligeiramente. O seu sapato de salto alto descolou-se do chão e cada vez mais, Helena era volátil.
Anabela tinha um peito desconcertante. Assim que ela retirou a camisola de algodão bege, os seios volumosos e descaídos pularam diante do olhar de Rodrigo. Brancas, suaves, com uma ténue transparência dos seus quarenta e alguns anos, mamilos da cor do cabelo curto e castanho claro, as mamas reservavam uma sensualidade invulgar. Misturavam a sua aparência maternal com uma postura apaixonada, evidenciando uma pureza fictícia. O peito de Anabela clamava para ser tocado, para ser beijado, para ser comido, para ser devorado. O peito da mulher casada, mãe de dois filhos e objecto de desejo de tantos amantes, era um tesouro que só ela sabia guardar. A varanda do apartamento de Rodrigo tornava-se um lugar inusitado para despir uma amante fogosa. Ela estava sentada num pequeno banco, encostado ao muro. Conseguia encostar o pescoço no parapeito daquele espaço aberto. Não era de todo impossível que alguém pudesse avistar Rodrigo a retirar calmamente as calças femininas e perceber o que o inquilino estava prestes a fazer. Mas Anabela não se importava. Encantava-se com as mãos dele que entretanto retiravam as cuecas brancas da mulher casada. Ajoelhado no chão, ele aproximou-se do peito da amante e colou a boca no vale apertado, entre as mamas que ele ousou segurar com veemência. Anabela abraçou a cabeça dele e apertou-o contra o seu peito rijo e entesado. As mãos de Rodrigo apalparam as nádegas ligeiramente flácidas da mulher, mãe de filhos. As pernas dela abriram-se e permitiram que a ponta dos dedos dele começasse a deleitar os seus lábios vaginais.
O Dr. Coppelius enfeitiça a sua falsa boneca. Torna-a parte do seu mundo surreal e fá-la dançar no interior da sua casa. Swanilda entende o que é ser manipulada, mas também admirada. Franz aguarda cá fora pela verdadeira boneca doce e cantante. Ainda encantado por Coppelia, não deduz que o seu deslumbramento o cega da outra realidade.
Não havia pressa, mas também não era pretendido que fosse longo. Helena estava à mercê dos caprichos do seu doutor. A sua perna direita erguia-se o mais alto que podia, encostada ao peito do médico. A perna esquerda procurava tocar o chão, equilibrá-la na cama e manter o caminho aberto para que o sexo do seu amante a penetrasse incessantemente. Os seus braços estavam limitados pelo pedaço de tecido branco que ainda não tinha sido do seu corpo. Ainda assim, a mão esquerda segurava o seu corpo, pressionada no colchão da cama clínica. O seu tronco estava assim numa diagonal que lhe permitia sentir cada entrada dele no seu intimo. A mão direita de Helena apoiava-se no pescoço do médico, para que ela não caísse, mas ao mesmo tempo demonstrando o quanto ela se deliciava com cada penetração. Porque Mário entregava toda a sua dedicação à mulher que ambicionava meia hora da sua consulta. De pé, ele exercitava a sua cintura de forma a que cada penetração parecesse imensa, trouxesse calor ao interior do sexo feminino e colocasse Helena nas nuvens. E ela gemia quando isso acontecia. Ela soltava dos seus pulmões a reacção mágica às maravilhas que o pénis duro e longo de Mário trabalhava dentro de si. Como dois loucos, o médico e a mulher fodiam sem parar. Não havia sequer um limite imposto. Ele queria devorá-la. Ela só queria que aquilo jamais terminasse. A face dela derretia, o seu pescoço suava rios de prazer e as mamas desfaziam-se tal era a intensidade exercida pelo seu corpo. O sexo de Mário preenchia a sua rata e ela julgava que ele nunca mais ia parar de inchar. O médico era incitado a não cessar o ritmo das suas penetrações. Fodia a mulher madura, tão semelhante a si, como se fosse a última vez que lhe fosse concedido um momento assim. Apenas e só com as calças dobradas nos tornozelos, Mário segurava o corpo da mulher pelas costas, sugando por vezes os seios molhados e morenos da mulher. Na proibição do lugar, do momento, da acção, Helena incitava o doutor a fodê-la. Procurava olhá-lo nos olhos, mas a cópula era tão vibrante que todo o seu corpo estremecia de cada vez que ele se aprofundava dentro dela. Mário sentiu a mulher encharcada e guardou as últimas forças para aquele espaço de tempo em que Helena sentiu uma tontura vertiginosa e o sexo dele a explodir dentro de si.
Já tinha acontecido anteriormente. Aquela varanda experimentou o desejo carnal entre marido e mulher por um bom punhado de vezes. Mas nunca outrora Rodrigo se sentiu tão descomplexado em provar uma mulher casada num lugar tão inusitado dentro do seu apartamento. E a mulher que estava bela e nua diante de si, não era a sua esposa. Era a conjugue de outro alguém que ele desconhecia. A carne que se entregava a si, aberta e com um aroma único, era uma amante que tinha tanto a perder como ele próprio. Por isso, ele não hesitou em colocar a sua boca na vagina húmida e bonita, que por uns momentos lhe pertenceu. Anabela apertou as coxas contra a cabeça dele, demonstrando que não estava receosa do que poderia acontecer. Ela acariciou os cabelos do homem e fez pressão com os dedos na nuca dele. Rodrigo tinha um convite para lamber o sexo saboroso. Porque os seus lábios sentiram logo a divindade daquela rata madura. A sua lingua deslizou por entre os folhos vaginais e as suas papilas gustativas sentiram os sucos deliciosos do âmago da mulher. E Anabela tremeu. As suas mamas pressentiram os gestos de prazer que eram entregues àquele corpo. Os mamilos pareciam florescer e o vale do peito começou a suar. Anabela soltou um sorriso, cerrou os olhos, e deixou-se levar por aquele minete soberbo. A sua nuca quase que se encostava na parede atrás de si. Apesar de não estar na sua casa, ela não receava que alguém pudesse ver ou surgir de dentro de casa. Aquele era o seu momento. Ela estava a ser lambida, a ser tocada, a ser mimada. Naquele instante em que a língua do homem fazia cócegas alucinantes no seu clitóris, Anabela tinha em mente que só o seu amante maduro, esse que equilibrava a sua sede sexual, lhe poderia lamber como Rodrigo o fazia. Ela tinha vontade de se tocar, de levar os seus dedos a segurarem aquele deleite. Mas deixou esse pormenor à aptidão e fome do anfitrião. Rodrigo comia a rata. Mas devorava-a num jeito que ele não se recordava de querer. Porque colado à sua boca estava um sexo diferente. Maduro como o da sua esposa, sem dúvida. Molhado como a grande maioria das suas amantes proibidas. Ardente como qualquer mulher que ele deseja. Mas Anabela expelia de si uma magia que o enfeitiçava. Ela era tão somente uma mulher que palpitava o coração da mesma forma que o seu. Rodrigo sabia que à noite podia experimentar algo semelhante. Mas ele queria que fosse diferente. E tornou-o diferente. Rodrigo fez um minete memorável até Anabela demonstrar que só ele a poderia lamber assim. O orgasmo que ela preparava para exaltar era a prova de que no adultério não há lugar para fingimentos.
Swanilda temeu os encantamentos do Dr. Coppelius. Sentiu o seu corpo tremer com o pressentimento de que se ela pode desejar ser uma boneca, também o seu noivo pode desejar ser uma boneca. Na iminência desta preocupação, o mágico e fabricante de brinquedos preferiu afastá-la. Voltou a -la no sítio onde a descobriu e no seu pensamento clamou pela presença da sua boneca.
Helena mal se conseguia mexer. Exausta com o esforço físico e emocional, procurou recompor-se. Sentou-se na cama onde o médico acolhia os pacientes e tentou perceber como podia voltar a vestir a camisa. Também Mário levou algum tempo a encaixar a realidade. Levantou as calças com o sexo ainda molhado e fixou o olhar na mulher a quem ele tinha acabado de dar um prazer imenso mas arriscado. Helena tinha a face ruborizada e ainda estava a ajeitar as cuequinhas quando o seu fervoroso amante se sentou calmamente ao seu lado...
Anabela parecia a mulher mais feliz do mundo. Tinha aquela sensação de que as suas energias se convergiram no seu sexo para depois explodirem por todo o seu corpo numa plena vitalidade. Para a convidada do inquilino do 1º esquerdo, os pequenos problemas da sua vida podiam aguardar. Rodrigo, o homem que a lambeu sem pudor, ergue-se e fez-lhe uma leve caricia nos seus seios frenéticos. Ele encostou-se ao muro da varanda, deixando a cabeça da mulher encostar-se à sua perna. Por uns segundos, Anabela abriu os olhos e inspirou fundo...
- Ele tem uma amante... - confessou Anabela.
- Vou deixá-la... - soltou Mário.
- Acho que até deve ter várias... - disse Anabela.
- Não suporto a ideia de que ela me possa enganar... - desabafou Mário.
- Não sentes o mesmo? - perguntou Anabela.
- Nunca achaste que ele também te enganava? - questionou Mário.
Tanto Helena como Rodrigo ouviram as confissões dos seus amantes com um nó na garganta. As incertezas que tanto Mário como Anabela detinham, foram e iriam continuar a ser os seus maiores tormentos. O casal que os inquilinos infiéis do Edifício Magnólia procuraram para satisfazer os seus caprichos fantasiosos eram o espelho do que eles sentiam. E no momento em que procuravam formular uma resposta, Helena e Rodrigo sentiam-se como o espelho de Anabela e Mário. Também eles desconfiavam da infidelidade do parceiro. Também eles eram culpados. Também eles pensaram terminar tudo, sem sequer meditar sobre o que havia a perder. Depois de alguns momentos de silêncio, Helena puxou a saia para baixo, recompondo-se dentro do que era possível. No instante em que ele recolheu a roupa da sua amante, Rodrigo aproximou-se dela.
- A vida continua... Todos nós queremos ter amantes... Tu não és mais perfeita do que o teu marido... - respondeu Rodrigo.
- Tu não vais querer perder aquilo que tens...Agora apetece-te deixá-la, mostrar-lhe que ela é uma cabra e que nunca te amou... - respondeu Helena.
- Nunca vais deixar de cobiçar outros homens...e vais sempre pensar que ele come outras mulheres... - continuou Rodrigo.
- Amanhã vais perceber que a única mulher que te pode amar é aquela que no silêncio te pode perdoar...esquecer...ignorar... - continuou Helena.
- Somos todos iguais... - concluiu Rodrigo.
- Não somos melhores do que eles... - concluiu Helena.
No pecado de querer algo mais do que se conquistou, eles fecham os olhos ao que fazem, julgando que cometem adultério para justificar o que outrem também faz. Mas tudo isto é um ciclo vicioso e eles só procuram uma desculpa. Anabela e Mário apenas têm uma vida demasiado igual a eles próprios e jamais seriam um espelho perfeito para se olharem e redimirem. Ainda assim, o desejo ultrapassa qualquer culpa. Helena sai do consultório com o pescoço húmido, a face ruborizada e a blusa com botões mal presos. Cumprimenta a assistente desconfiada e cúmplice e termina a sua consulta com um sorriso na face. Rodrigo despede-se da amante com um beijo quente nos lábios fervorosos femininos. A sua boca irá manter aquele sabor cremoso até ao final da tarde, minutos antes da sua adorada esposa chegar a casa.
Franz acordou do encantamento e subiu até à casa do Dr. Coppelius. Encontrou a sua noiva na varanda, sozinha. Ambos perceberam que uma boneca, irá ser sempre fruto de uma imaginação. O que os olhos não vêem, perdoam, esquecem. Assim, Swanilda aceita receber o seu noivo nos seus braços. E apesar de Franz e Swanilda alcançarem o auge do amor que ainda os une, a magia de terem experimentado uma outra alma encantada atravessou para sempre as suas vidas.

quinta-feira

A Casa da Cascata

Publicado a 11-11-2008
sitios que nos fazem sentir bem. Há espaços que tornam a vivência mais inspiradora. Há recantos construídos com um espírito inovador, feitos a pensar na comodidade, mas acima de tudo, desenhados para serem únicos e especiais. A Casa da Cascata é uma obra do arquitecto americano, Frank Lloyd Wright. Foi construída em 1936, nos Estados Unidos da América, com o intuito de servir de casa de férias de um homem de negócios, mas dado o seu carácter revolucionário foi transformado em museu. O que a demarcava de todas as outras obras arquitectónicas era a sua envolvência com o meio florestal e possuir uma queda d'água que corria por debaixo da casa. O aspecto estético hoje pode ser considerado vulgar, mas na época foi uma quebra com as correntes arquitectónicas existentes. The Fallingwater House é um lugar que respira tranquilidade, imponência e uma peculiar sensualidade.
A casa do jacuzzi no Edifício Magnólia tornou-se parte essencial da vida deste empreendimento. Criou um espaço de lazer consignado a todos os moradores. Permitiu proporcionar momentos relaxantes a cada um dos utilizadores. Trouxe novas experiências aos já ousados inquilinos, especialmente para aqueles que nunca imaginavam uma piscina interior e todo o equipamento envolvente, como um local de fantasias excêntricas. Quando a administradora do condomínio propôs a construção de um jacuzzi no topo do Edifício, os inquilinos consideravam-na louca. Agora, eles assumem a loucura de querer gozar naquele espaço, quantas vezes a imaginação lhes permitir.
Rafael delira com a casa do jacuzzi. Vive-a quantas vezes puder. Sonha das formas que for possível. Reserva o seu lugar quase todas as semanas. Seja para um prolongado banho no chuveiro retemperador. Seja para um mergulho sublime na água borbulhante do tanque. Seja para trazer companhia que possa entender a surrealidade que ali dentro se pode viver. Ao final da tarde, a luz ainda entra pela janela diagonal. Ele ainda está vestido com a indumentária profissional. Chegou há dez minutos do clube de equitação e entra com a ansiedade a brotar da sua pele. Ao seu lado vem Carolina. A jovem amante do inquilino do 3º esquerdo quis conhecer a outra face do Edifício. A irmã da outra jovem amante de Rafael quer voltar a entregar-se aos caprichos escaldantes do homem. E tudo decorre como ela pretende. A sós com ele, Carolina percepciona que o lugar espalha a mesma magia sensual que a fez seduzir por Rafael, no Espaço Magnólia. A piscina é apelativa, o chão é tépido e a tranquilidade reina de uma forma surreal.
- É para aqui que queres trazer a minha irmã? - atira Carolina.
- Como é que?!!...
- Somos unha e carne...Sempre o fomos...
- Então porque é que estás aqui sozinha?...
A pertinência da questão desarma a mulher. Carolina, a faceta mais madura das duas irmãs percebe que Rafael não tem rodeios. Ela está ali e a irmã não. Ela quer o homem e não consegue sequer criar um jogo persuasivo. Ele tira a camisola suada e chega-se junto a ela. As mãos femininas colam-se à pele húmida do amante. Um sorriso transparece o desejo consumado dela em deter o homem, antes mesmo da sua irmã chegar. Rafael é impulsivo. Rafael é inusitadamente atrevido. Não há nada a enganar. Carolina teve ciúmes por ele ter combinado um encontro no jacuzzi com Alexandra. Carolina queria confrontar o amante com a curiosidade. A resposta dele, quanto ao facto de a querer comer, estava na forma como ele abre violentamente a blusa da mulher jovem. Ela solta um suspiro. Ele sorri ao ver Carolina com o soutien branco e com o peito erguido. Envolve as mãos na cintura dela e cola os lábios no cimo do vale dos seios. Carolina salta para o colo do homem aguerrido.
- Fode-me...Ohhh, fode-me, Neves!...
Ele transporta-a até ao chuveiro peculiar da casa do jacuzzi. Deixa a porta de vidro entreaberta e encosta-a na cadeira longa de madeira. Puxa as calças de ganga dela com ímpeto, deixando a mulher jovem com o soutien e as cuecas. Apesar de ter as ancas largas, ela exalta uma figura excitante e apelativa. Rafael abre a torneira de água quente, que molha imediatamente todo o corpo de Carolina, ainda com a lingerie vestida. Ela solta um gemido, sentido que a água desperta toda a sua libido. Demasiado depressa. Ele está sentado na cadeira e acaricia as nádegas da mulher. Os dedos dele parecem penas a escorregar junto às virilhas femininas. Os lábios dele passeiam no ventre dela, junto ao elástico das cuecas.
- Era a minha irmã que devia estar aqui, não era?...Uhm??!!
A dúvida de Carolina mantém a pertinência dos curtos rasgos dialogais. Enquanto Rafael beijava as cuecas, junto ao sexo dela, a mulher provocava o seu amante. Na verdade, ele passou a tarde inteira a imaginar a forma como iria receber Alexandra. Com dois dedos, Rafael puxa as cuecas para o lado.
- Ohhh!!...Era ela...Era ela que querias foder aqui...
- Sim...era!...
Ele entra no jogo e quando descobre os lábios vaginais de Carolina, lança o que a sua imaginação processa. Passa levemente a língua pela fenda erógena da mulher jovem e ergue o olhar.
- Ias meter-lhe os dedos?...Assim?!...
- Não!...
- Então?!...Uhm?!!...
- Ia encostá-la aqui...Exactamente como estás agora...
- E depois?!....
- Desviava as cuecas dela e enfiava-lhe...
- O dedo?
- Não!...
- Cabrão!!
Enquanto dois dedos de Rafael escorregam por entre os lábios vaginais molhados, Carolina delicia-se com a água que lhe escorre pelos cabelos, pelos ombros, pelas costas, pelos seios ainda cobertos pelo soutien. Ele masturba-a, mas não deixa de atentar no que a amante poderá estar a imaginar sobre a sua irmã.
- Não a tocavas?!...
- Eu sei que ela ansiava para que eu a penetrasse...Para que eu a fodesse assim de pé...
- Estás a mentir!... A minha irmã gosta de ser tocada..ohhh...assim como o estás a fazer...
- Ela já não precisa...
- Porquê?!...Ohhh!!
- Ela já se tocou... Enquanto estava ao telefone comigo...
- Aaahhh!!...
Rafael volta a escorregar a lingua pelos lábios vaginais inchados de Carolina, roçando brevemente pelo clitóris. Apalpava com a mão direita as nádegas redondas dela, ao mesmo tempo que a mulher colocava a perna esquerda sobre o ombro dele. O duche era mesmo relaxante. Parecia que ela era lambida por debaixo de uma cascata surreal.
- Vou fodê-la... Vou penetrá-la profundamente até sentir que ela treme toda...
- E depois?!...Ohhh... E depois??...O que lhe fazes, Neves?!!!
- Vou agarrar-lhe os seios e prolongar aquela tesão toda. Vou encher-lhe a rata e não saio...
- Ohhh....mais...mais!!!
- Ela vai sentir-se cheia...vai querer que eu me venha...
Nos intervalos em que Carolina geme, Rafael coloca a boca na rata da mulher. Puxa o clitóris dela apenas com os lábios e suga toda a excitação da mulher. Ele sente-la frenética. Sente que ela está a vibrar em toda a pele, em cada pedaço do seu corpo. As mãos dela seguram o cabelo dele pela nuca. Empurram a cabeça do homem para dentro de si. E quando a língua invade a doce profundeza de Carolina, ela solta um gemido forte.
- Ohhhh!...Cabrão!...Vais comê-la por trás?
- Uhmmm...Sim!...Vou virar o corpo dela, passar os meus dedos por entre as pernas....uhmmm... e sim...Vou enchê-la por trás...
- Aaahhh...oohhh...és louco!...Ohh...És louco!
- Sim...e eu vou fodê-la até ela gritar! Vou encher as minhas mãos com as mamas...
- Cala-te!...Ohhh...Cala-te e come-me...Come a minha rata, por favor!!
Rafael está excitado com a cena. O corpo encharcado e húmido de Carolina. A posição que ela ostenta. A entrega que ela se predispõe ao ter a rata mesmo diante da boca do amante. Quando a mulher alcança o auge da sua excitação, ele enterra a boca ainda com mais intensidade. A tensão na perna de Carolina é evidente. Ela está a vir-se. E não sabe se é a forma como a língua dele invade a sua vagina, se são os dentes dele que seguram o clítoris inchado, se é a imaginação dela que a transporta para um estado de demência excitante. Imaginar a irmã a ser penetrada e tocada naquela cadeira inovadora, deixa Carolina fora de si. Mais do que ciúmes, mais do que a ideia de que tal poderá mesmo vir a acontecer. A irmã de Alexandra adorava estar presente para ver a cena. Talvez a excite mais do que aquela masturbação fenomenal.
Rafael entrega-lhe uma toalha. Ela tomou um duche peculiar. Com alguma vergonha, ela retira as cuecas. O clima intenso já serenou. Ele estava de pé e tirava também as calças, imensamente encharcadas. Olhava para a sua amante, que se despe totalmente, ao tirar o soutien. As mamas molhadas dela transpiram sensualidade. Mas tudo parecia aligeirar.
- Desculpa!...Não posso mesmo faltar...
- Se tens que ir...
- Tenho...E acredita que adoraria ficar aqui...
Carolina acaba de se limpar com a toalha e vai buscar as suas roupas. A caminhar nua pela casa do jacuzzi, ela sabe que a irmã pode surgir a qualquer momento. Afinal, a mulher jovem está definitivamente com pressa. Mais do que uma rapidinha. Carolina trouxe Rafael para um devaneio emergente. E a masturbação que ele lhe ofereceu foi uma ofertada minada. Ela volta a aproximar-se dele e arranca-lhe um beijo. Ele olha para ela, sabendo que raramente teve tanta excitação com um minete. A sua efémera amante volta a sair do seu espaço, encantada com a magia do jacuzzi.
-//-
O homem mantém os boxers. Ainda não teve a astúcia de os retirar. Aguarda pelo melhor instante para o fazer. Está sentado no pequeno degrau da piscina redonda. A água borbulha no seu peito. O ar está imensamente húmido, tornado a respiração um processo mais rígido. Sobre as suas coxas, Rafael tem a jovem mulher sentada ao seu colo. Alexandra chegou sete minutos depois da irmã ter abandonado o topo do Edifício Magnólia. Os braços da irmã mais nova de Carolina apoiam-se nos ombros do inquilino. Os cabelos de Alexandra ainda estão secos, apesar de carregarem o vapor do ambiente. Ela está nua, tendo espalhadas no chão as suas roupas. A jovem amante do professor de equitação está impaciente. Aguarda pelo momento em que ele lhe possa entregar o prazer que está implícito na sua face. Eles trocam o olhar, parecendo comunicar desejo entre ambos. As mãos de Rafael, que seguram as costas macias dela, deixam o corpo dela pender para trás. Os enormes seios de Alexandra apresentam-se viçosos e entesados, perante a atenção do homem. Ela deixa que o cabelo mergulhe na água. Jamais ela poderia imaginar um lugar tão intenso, como o jacuzzi onde Rafael a trouxe. Ele descreveu-o ao telemóvel, duas horas antes. Disse-lhe que era possível concretizar as fantasias sexuais que só residem nos sonhos que ocorrem em ilhas paradisíacas. Os dedos de Alexandra cruzam-se por trás do pescoço do homem, suportando peso do seu corpo que quase flutua na linha de água borbulhante. O sexo do homem roça por entre a sua rata, mas ainda cobertos pelo pedaço de tecido. Ele não consegue descrever para si mesmo o calor que brota daquela vagina. Ela olha para a janela surreal e apercebe-se do cair da noite. Inspira fundo e cerra os olhos.
- Fodeste-la mesmo?...
É inevitável. Carolina era incapaz de suportar estar cinco minutos sem contar à sua irmã a aventura que teve com Rafael. Mas era também incapaz de lhe contar tudo o que ocorreu dentro daquele espaço. É esse desconhecimento que faz palpitar o íntimo de Alexandra.
- Diz-me...Fodeste-la aqui?...
- Sim...
- Aqui?!!
- Sim...Comi a tua irmã dentro desta piscina....
- Como?
- ... Como?!!....
Alexandra ergue de novo o corpo dela. Coloca o peito saliente e palpitante junto à cara de Rafael. Acaricia levemente os cabelos do homem, mas não deixa de transparecer um ar apreensivo. A curiosidade devora o seu estado. A mão do professor escorrega por debaixo da água nas coxas fofas da jovem. Vazia de roupa por entre as pernas, Alexandra sente os dedos do amante a roçarem nos seus lábios vaginais.
- Ela pediu-me...
- Pediu o quê?
- Estava demasiado entesado para não o querer...
- Pediu o quê, Neves?!...
A ansiedade acumula-se no peito de Alexandra. A mão esquerda de Rafael apalpa o seio dela, esfregando o bico entesado na palma da mão. A mão direita já se apoderou do sexo feminino. E o leve gemido dela estava no intervalo entre a surpresa da acção que possa ter decorrido com o amante e a irmã, e a introdução do polegar masculino dentro da sua rata inchada. E assim que o dedo escorregou profundamente na vagina, ele olhou a jovem com um toque de malícia.
- A boca dela sugou-a...Uhmmm...Tinha assim os lábios como os teus...
- A minha irmã pediu para te chupar?!!!...
- Sim....
- E ela -lo?!
- Sim...
- Aqui?!!...
- No preciso sítio onde estou sentado...
- Não pode ser....
- Durou alguns segundos. Mas ela aguenta muito bem com a cabeça debaixo de água....
- Gostaste?!...Uhmmm?!!...
- Ser chupado debaixo de água?...Delirei...
E agora Alexandra era possuída por uma fantasia emergente. Uma ideia chocante, na medida em que parece ter sido estonteante, ver Carolina chupar aquele homem, em lugar tão inusitado. Mas Rafael estava a ser trapaceiro. Nada daquilo tinha acontecido. Mas enquanto o polegar fazia curtas viagens dentro da rata de Alexandra, ele não deixava de pensar que poderia ter sido poderoso receber sexo oral da mulher jovem. Talvez tão bom como sentir os lábios carnudos de Alexandra a abocanharem a sua picha. Todavia, neste instante, Rafael está entretido com a rata daquela irmã. E ele sente que pode continuar assim até anoitecer por completo. Penetra várias vezes por entre os lábios grandes e estimula o sexo de Alexandra.
- Ohhh...isso sabe bem, Neves....Uhmmm....Não pares!...
- Ela também não queria que eu parasse.
- Quando?!! Também a masturbavas?
- Não...
- Não?!...Uhmmm...oohhh...não lhe meteste os dedos??
- Só quando a penetrei...
- Fodeste-a mesmo!...Ohhh....
- Claro que sim....Achas que conseguia resistir àquele rabo?
- Vocês são mesmo...ooohhh...Podiam ter esperado por mim....
- Sim...podiamos...Mas eu queria enchê-la...
Alexandra procura ter uma ideia concisa do que pode ter acontecido naquela piscina. Mas não importa o que ela possa imaginar, nunca irá passar disso. Uma intensa e pródiga imaginação. Mas dentro daquele jacuzzi climatizado, só Rafael sabe o que verdadeiramente aconteceu. No entanto, a ideia de ter Alexandra na sua mão, entesada e devota ao seu desejo, -lo prosseguir a inofensiva mentira. Retirou o polegar de dentro da rata dela e introduziu dois dedos.
- Encostei-a aqui ao muro. Ela quase que se deitou....Consegues imaginar?....
- Sim!!....uhmmm...Sim...Não pares...
- Segurei o rabo dela e acaricei-o...A tua irmã tem um....
- Eu sei!...Uhhmmm...Eu sei..ooohhh...está a saber tão bem!!....
- Foi tão fácil enchê-la....Se tu visses...Escorregava...
Rafael apercebe-se que é mais fácil pôr qualquer uma das irmãs fora de si, se colocar a presença da peculiar cara metade, no meio da cena. Ele deixa o polegar esticado enquanto Alexandra cavalga sobre o colo do amante. O inquilino não conseguia deixar de sorrir, ao mesmo tempo que os seus dedos faziam palpitar a rata da jovem. Ela cerrava os olhos e imaginava a irmã a ser comida naquela piscina.
- Ela gemia...Ela gritava...Ela chamava-me nomes...
- Ohhhh...
- Eu sentia-me apertado e empurrava o corpo dela contra a parede...
- Neves!...Ohhh...Tão bom!!....
- Estava tão excitado...O rabo dela apertava-me...E houve uma altura em que não consegui parar...
- Vieste-te nela?!...Ah?!...Vieste-te nela?
- Vim-me em cima do rabo dela...
- Ohhhh!...Neves...Uhm...Neves!!... Ahhh!!
Ela descontrola-se. Não pára de cavalgar e abraça-se ao homem. Os seios grandes de Alexandra apertam no pescoço do professor enquanto ela se vem com a masturbação profunda e intensa dele. O polegar roça no clítoris redondo e duro da jovem. Na mente de Alexandra está a ideia da pele suave da irmã a ser salpicada com o sémen do amante que ela partilha. Ao invés, Rafael sente o suco vaginal da convidada a misturar-se com a água da piscina. As paredes do sexo feminino palpitam contra os dedos dele e quanto mais ela salta, mais a bolinha entesada de Alexandra roça no dedo de Rafael e mais a excitação a arrebata. Ela tenta apertar as nádegas, tenta apertar-se contra o corpo dele, tenta suportar a tesão que invade o sexo. Na humidade que se apodera da casa do jacuzzi, a carga sexual era frenética. Rafael acaba de masturbar a duas irmãs num espaço reduzido de tempo. Ele nem sequer quer tentar comparar com a primeira noite com as duas mulheres. Possuí-las e fazê-las vir-se em tempos diferentes tornou-se épico. Acordar as fantasias mais profundas, mas ainda assim mais familiares das irmãs revela-se grandioso. E ainda que tudo não passe de duas grandes mentira, é inegável que os três amantes envolveram-se como se estivessem juntos. Alexandra quase viu a irmã se penetrada analmente, numa posição excitante. Carolina tem quase a plena ideia de que a jovem irmã foi penetrada duas vezes na mesma cadeira onde ela se veio. E no fundo, Rafael sentiu que podia mesmo ter possuído as duas mulheres. A seu tempo, as duas irmãs vão confrontar a ténue linha entre realidade e fantasia. Mesmo que não tivesse usado o seu pénis excitado e imponente, Rafael tem a certeza que dificilmente poderia ter levado aquele fim de tarde para uma experiência tão intensa e prazeirenta.

quarta-feira

Nua

Publicado a 21-10-2008
Há uma fotografia que guarda o intimo feminino numa concha, explorando toda a sensualidade de uma mulher na sua essência. Não se exibem seios, não se demonstra o sexo e as nádegas apenas e só são sugeridas. A nudez desta fotografia está exposta na melancolia da postura, no obscuro dos sentimentos e na necessidade de carinho que o modelo transmite. Nude, de 1936, é uma obra artística de Edward Weston, fotógrafo americano. Pinta numa imagem concreta o invólucro feminino. Molda um objecto sensual numa harmonia gestual, carregado de emoções, segredos e palpitações. Faz imaginar uma dança estática, ansiosa e definida. Há uma fotografia, com uma sombra indesejada, que retrata a emoção feminina num único sentimento.
O Espaço Magnólia mistura o corrupio habitual de clientes stressados de um final de tarde com a serenidade do ambiente próprio do estabelecimento, pormenor que o torna num lugar surreal. É possível relaxar num sofá enquanto funcionários públicos pedem uma sandes mista. Há vagar para ouvir as músicas entoadas na jukebox, ao mesmo tempo que o gestor empresarial bebe o décimo café do dia. Existe tempo para sonhar por entre um batido e uma tosta de queijo, mesmo sabendo que um grupo de jovens fala num tom de voz muito alto. Aqui dentro ainda é assim. A rotina diária pode esperar entre um café e um pedaço de sonho, inscrito nas mesas surreais do Espaço. Lúcia procura o melhor de dois estados de espírito no estabelecimento por debaixo do apartamento onde reside. Para estudar, ela precisa de tranquilidade e abstracção do mundo real. Mas para conseguir absorver o objecto de estudo e consumir as suas potencialidades, a jovem aceita rodear-se dos melhores colegas de turma no seu curso. Lúcia está sentada numa mesa, num dos cantos do Espaço Magnólia. Bebe o enorme batido de morango que lhe arrefece a garganta frenética. Divulga as conclusões da leitura e interpretação de mais uma obra psicanalista às colegas que se sentam na mesma mesa que ela. Três jovens que partilham os conhecimentos com uma das melhores alunas da turma. E desta forma, é possível beber o ambiente do Espaço, relaxando a mente, ao mesmo tempo que se corre em contra-relógio para a assimilação de uma matéria que exige concentração. O ritmo intenso do curso assim o dita. Desde o inicio da tarde que as quatro mulheres debatem os vários pontos de estudo. As amigas de Lúcia já incorporaram a mítica envolvência do café sitiado no Edifício Magnólia. Clientes entraram. Clientes saíram. Pessoas com pressa. Pessoas com tempo. Pedidos rápidos. Pedidos exigentes. Mulheres que trocam segredos. Homens que lêem o jornal. Mas ninguém se mantém tanto tempo dentro deste lugar como as quatro jovens. O cansaço abate-se naturalmente de uma forma progressiva. Há intervalos cada vez maiores. Há conversas que se estendem um pouco mais. Não foi marcada uma hora de conclusão do estudo, mas é notório que a vontade já cessou. Lúcia procura sustentar as poucas forças que lhe restam. Termina a última linha da vigésima segunda folha de apontamentos escrita. Devoção não lhe falta e o seu olhar está embutido entre o caderno, os dois livros que enchem a mesa e um breve dispersar discreto.
- Lúcia...ainda não paraste de escrever... - diz uma das colegas.
- Estou só a acabar este capítulo. - responde Lúcia.
- Já é a quinta vez que nos dizes isso...
- Quero acabar isto e sair daqui, tanto quanto vocês...
- Estou farta de olhar para este livro e....
- Já repararam na mulher que está ali? - notou a colega de Lúcia do seu lado esquerdo.
- Quem?!
- Shiuu...Não dêem nas vistas... Ali...Junto à jukebox...Há uns bons vinte minutos que está a olhar para este lado.
- O que tem? - pergunta Lúcia.
- ....O que tem?!!... Não gosto que fiquem a olhar assim para mim... Ainda por cima com uma máquina fotográfica...
Uns metros à frente, junto à máquina de música do Espaço, está sentada uma mulher. Sozinha. Sinistra. Lúcia já tinha reparado nela. O olhar disperso da jovem apercebeu-se de uma atenção que estava efectivamente a ser direccionado para a sua mesa. A mulher respira um ar inquietante. Na casa dos trinta anos, mas ainda jovem. Cabelo curto preto, lábios finos pintados num vermelho aguerrido mas ainda assim discreto, e uns olhos escuros penetrantes. Sim. Lúcia já tinha denotado a presença peculiar que mantinha a atenção entre a sua mesa e a máquina fotográfica profissional que segura nas mãos. Parece ajustar as definições da lente ou algo parecido. Parece visualizar as imagens já conseguidas, fazendo uma selecção pessoal. E depois, volta a erguer o olhar.
- Achas que ela está a olhar para alguma de nós? - pergunta uma das colegas de Lúcia.
- Porque raio haveria de estar?! - questiona outra.
- Provavelmente está a olhar para a rua... - atira Lúcia.
Na mesa encostada aos vidros da fachada, as jovens procuram ser discretas. Mas já é demasiado evidente que elas percepcionaram o olhar indiscreto. E quando Lúcia pretendia voltar à sua concentração, o seu olhar encontra-se com os olhos da mulher. Alucinante. Como uma força demolidora que a arrastou, a jovem congela a sua postura. A mão direita pousa sobre o caderno e tal como tantas vezes no Espaço Magnólia, a surrealidade invade a sua envolvência. Deixa de existir o estabelecimento. As suas colegas parecem não estar ali. Nem sequer a mesa sobra, no mergulho que a sua mente efectuou. O olhar da mulher agarrou-a. Lúcia nunca a viu. Nem sequer consegue ter uma ideia de quem possa ser ou o que queira. Mas no fervilhante movimento do café, a mulher prende a sua atenção. Ela tem um ar casual, muito descontraído. Veste uma blusa de algodão fina, com dois botões abertos, salientado ligeiramente o peito. As mangas estão dobradas quase até ao cotovelo. Nela, resiste uma ideia muito ténue de feminidade. O olhar entre elas não se cruza. Choca. Consome a respiração de ambas. E na intimidade desse olhar é captada mutuamente uma chama que já se desejou numa altura indecifrável.
- Ela está a olhar para a Lúcia... - refere uma das jovens.
- Muito esquisito...
- Achas que ela é lésbica?
- É lésbica.
Os comentários das amigas de Lúcia são apenas vozes soltas na mente da jovem. Ela já não está ali. Até mesmo a música que se solta da jukebox se desfaz na concentração imensa no olhar da mulher estranha. Quente, misterioso, viciante. O sorriso da mulher começa a abrir-se ligeiramente. E num gesto muito sereno e descomprometido, a mulher levanta a enorme máquina fotográfica, coloca-a junto à face e aponta-a na direcção da mesa das jovens. Na mente de Lúcia, mais rápido que a surpresa do gesto, mais inconsciente que a interpretação do acto, entra o som trovejante do disparo da máquina. E ela sente-se retratada. A mulher baixa a máquina e liberta o seu melhor sorriso. O ar incrédulo das colegas de Lúcia não pode ser maior. Ainda assim, ela mantém-se calma no exterior. Finge que não deu relevância à acção e volta a cingir o olhar no seu caderno. Mas tudo aquilo já aconteceu. Uma mulher sensual, de aparência arrapazada e com um olhar magnético, acaba de a fotografar e retirar parte da sua essência para dentro de uma máquina.
- Lúcia!...
- O que foi?!- responde Lúcia veemente.
- O que vais fazer?
- Tenho que fazer alguma coisa?!...
- A mulher está-se a atirar a ti...
Por entre risos trocistas, olhares dispersos e confusos, misturado na confusão do Espaço, Lúcia não sabe o que fazer. Alguém teve a ousadia de lhe tirar uma fotografia no meio de um lugar público, sem a prévia autorização. É proibido, certamente, pensa ela. Mas excitante. E antes que ela pudesse pensar. Antes que ela decidisse se iria levantar-se e repreender a mulher ou ficar calada. Antes que ela conseguisse deduzir o que deveria fazer, a mulher misteriosa levanta-se. Pega numa enorme mala onde devia guardar o material fotográfico e afasta-se da mesa onde tomou o café. O coração de Lúcia pula. O entusiasmo das suas colegas aumenta. E a mulher aproxima-se, no seu caminhar conciso, da mesa das quatro jovens. Há um ambiente apreensivo naquele canto do Espaço. Lúcia fecha o caderno e ergue o olhar assim que percebe que a mulher se encosta a si e a fixa. Um breve silêncio antecede a curiosidade da jovem.
- Porque é que me fotografaste?
- Para te dizer que me fixei a ti.
- E precisas de tirar fotografias para o dizer?
- Costumo falar pelas imagens que capto.
- ...E o que dizem as tuas imagens?
- Se as conseguisse descarregar, dizia-te...
A surrealidade do Espaço Magnólia atinge o seu auge. O olhar troca-se de novo em silêncio. O magnetismo entre ambas é embriagante. Há um feitiço que paira no ar que se respira. E Lúcia sabe que só quem entende este clima se deixa fascinar por ele. A mulher teve uma atitude indiscreta, algo intimidante. A jovem entendeu-a de uma forma completamente distinta das suas colegas. Absorvida no encanto misterioso da mulher, ela entrega-se.
- ...Eu moro aqui em cima e...
- Preciso de um computador...
- E do que precisas mais?
- Preciso de ti...
As amigas de Lúcia não conseguem abrir a boca. É tudo demasiado insólito. Lúcia levanta-se da cadeira, segura nos cadernos e dirige o olhar para as colegas de turma. Elas têm dificuldade em entender o que ali ocorre, mas percebem que Lúcia está prestes a sair do Espaço, na companhia daquela mulher.

O quarto de Lúcia respira o ambiente normal de uma jovem universitária. Sozinha, aprumada e responsável, a divisão está pronta a receber as vivências da jovem. A luz do dia já custa a entrar por entre a janela com os cortinados corridos. Esbate na parede uns tons de cinzento e realça as sombras que se movem no quarto. Lúcia está de pé, nua. Não esconde o seu corpo, mesmo por entre a ténue iluminação. A sua postura está a um palmo da presença da mulher fotógrafa. Também ela de pé. Também ela nua. Frente a frente, os dois corpos deixaram para trás as roupas que as separavam. A palma da mão direita da mulher cola-se à face redonda e suave de Lúcia. Os olhares continuam a chocar, mas desta vez misturam-se um no outro. No silêncio da ansiedade, a jovem aguarda. Ela quer saber se o feitiço do Espaço não se desvaneceu.
- Sou a Luísa.
- ...Lúcia...
E os lábios ainda vermelhos da mulher colam à boca carnuda de Lúcia, sedenta de um beijo maduro. Uma das mãos da jovem envolve as costas brancas de Luísa. A outra acaricia os cabelos curtos na nuca da mulher. Os peitos esbatem-se mutuamente, os ventres roçam e a perna de Luísa embrulha-se na coxa da nova amante. O mistério continua vivo na presença da mulher. Lúcia pouco sabe sobre a pessoa que ela conheceu há pouco mais de quinze minutos, dois andares abaixo. Percepciona que ela é fotógrafa, talvez profissional. Deduz a sua idade, a partir dos contornos faciais, maduros mas ainda jovens. Desconfia da sua faceta lésbica, ainda que raramente tenha visto uma mulher galanteá-la da forma directa como ocorreu. De uma coisa Lúcia sabe. Ela deseja Luísa. Assume o deslumbramento pela face bonita da mulher. Aprofunda o conhecimento do corpo dela, nas suas formas ligeiras mas nos seios desenvolvidos, ligeiramente descaídos, no rabo firme que ela quer apertar, no pescoço que liberta um aroma apaixonante. Sim. Lúcia convence-se de que neste final de tarde, Luísa é a conquista que se segue, no quarto do 2º esquerdo.
- E as fotografias? - pergunta Lúcia.
- Queres ouvir-me ou queres sentir-me?
O convite é preciso. Não esconde nada, nem deixa rodeios intrometerem-se. O beijo prossegue numa troca de línguas, enquanto os lábios se acomodam um ao outro. Lúcia prova um sabor doce. Luísa come a macieza dos lábios fofos. As mãos das duas mulheres fabricam um abraço envolvente. É perceptível o encanto de Luísa perante o carinho intimista da jovem amante de cabelos compridos. A cama é já ali. Traz uma intimidade ainda mais assombrosa, na mistura do branco e do preto. Porque a pele de Luísa é branca. Imensamente branca. Porque a pele de Lúcia combina uma tez ligeiramente morena. E porque tanto os cabelos da jovem como da mulher se pintam de negro naturalmente. E o abraço que elas trocam em cima do colchão é a simbiose de uma sombra quente. Luísa enche as mãos com os seios volumosos da estudante. Sente as mãos dela apalparem-lhe o rabo, em caricias excitantes. Ao mesmo tempo, deixa que a boca carnuda de Lúcia invada o seu pescoço fino. Muito magro, mas com a pele hidratada. A inquilina delicia-se com a macieza e o sabor que retira da amante. A excitação dela aumenta, à medida que chupa com veemência os ombros da mulher. E quanto mais ela pensa que quer saber sobre Luísa, maior é o desejo em consumir o corpo dela. Um ligeiro empurrão faz deitar o corpo da fotógrafa. Suavemente, com tranquilidade. Ela estende-se na cama da anfitriã e sorri para ela. Lúcia embriaga-se com o sorriso da mulher. Fino, ligeiro, mas figurativo. Os traços da face de Luísa são definidos. As pestanas negras dela salientam o movimento dos olhos e toda a tenção que a mulher entrega à jovem.
- És linda, Luísa...
- Hoje sou tua...
As mãos da estudante lésbica agraciam as coxas de Luísa com carícias extenuantes. A mulher sente a palma das mãos a deslizar até tocarem nas suas virilhas. As suas pernas dilatam ao mesmo tempo que os cotovelos fincam no colchão, deixando o seu tronco levantado. Lúcia deixa cair o corpo sobre a postura da nova amiga. As mamas da jovem caem sobre a barriga de Luísa e os bicos deslizam na pele dela. A mulher liberta os primeiros gemidos intensos. O corpo dela quer libertar-se. Algo nela afirma a necessidade de encontrar algo diferente. E os seus seios descaídos, voláteis, sensuais, descobrem a paixão dos lábios femininos, sedentos de chupar os bicos entesados. Desde que encontrou pela primeira vez a presença da fotógrafa no Espaço, Lúcia apercebeu-se da firmeza dos mamilos da estranha mulher. Salientes, bicudos e sugestivos. Agora que se depara com as mamas descobertas, ela realiza a peculiaridade do peito de Luísa. Auréolas muito grandes e os bicos saídos. Parecem pequenos caroços de cereja. E colocá-los entre os dentes torna-se sublime. Luísa solta um gemido arrebatador. A mão esquerda dela procura acariciar os cabelos longos de Lúcia. O baton na boca da mulher vai desaparecendo e ela trinca o lábio inferior. A anfitriã percepciona a ingenuidade sexual da amante, bem como a confrontação com algo especial. Entusiasmada pela voz de Luísa, a jovem beija o vale húmido da mulher, acariciando os seios com a mão cerrada. Depois, aventura-se pela barriga da mulher. Um abdómen mole, muito sensível e rugoso, destoando do resto da derme corporal. Mais alguns beijos e Lúcia conquista o ventre de Luísa. Mais um gemido seco e a mulher deixa cair a cabeça para trás. Abre um pouco mais as pernas e sente os lábios cremosos de Lúcia tocarem por entre os lábios vaginais. A jovem toma conta de todas as peculiaridades dos órgãos erógenos da convidada. O clítoris de Luísa é saliente. Com a excitação proporcionada, ele parece querer saltar por entre os lábios húmidos. A mão esquerda da mulher está agora a pressionar a nuca de Lúcia, incitando-a a comer-lhe a rata. A tarde vai dando lugar à noite e os jogos de sombra vão deixando de existir. Na imensidão da escuridão, uma mulher entrega-se aos desejos carnais de Lúcia. E ela, afectivamente fragilizada e psicologicamente frenética, devora o sexo de Luísa de uma forma impulsiva. Por entre a boca que chupa os lábios grandes e a língua que penetra dentro da vagina, o clítoris da fotógrafa está preso entre os dentes meigos da jovem. Os gemidos começam a dar lugar a gritos tremidos. Os olhos redondos de Luísa fecham-se e as pálpebras macias vibram de tanta tesão. As mãos de Lúcia seguram o fundo das costas da mulher, ao mesmo tempo que a puxam um pouco mais para cima. E quando a boca da estudante já está enterrada na rata da amante, Luísa ainda empurra a cabeça de Lúcia um pouco mais para dentro. O minete é intenso. Jamais a mulher experimentou sexo oral daquela forma e Lúcia consegue perceber no êxtase do seu trabalho. Luísa vê-se e sente-se completamente molhada dentro da boca da rapariga. O seu clítoris escorrega na ponta do nariz de Lúcia.
- Ohhh!!...Lúcia!...Lúcia...Ahhh!...És poderosa!!...Ohhh...estou-me a vir...oohhh!!
Lúcia sabe o que fazer. Sabe o que quer. Entende o que precisa. Age conforme o que crê ser a melhor forma de concluir aquele momento explosivo. Pára de lamber, descola a boca da rata de Luísa e ajoelha-se em cima da cama, deixando o corpo da amante por entre as suas pernas. Imediatamente ela coloca o seu ventre diante da face da mulher. Segura a nuca de Luísa, pelos cabelos curtos e puxa a cabeça dela contra o seu sexo. A fotógrafa experimenta agora o calor e a humidade da rata da jovem, entusiasmada pelo orgasmo que Luísa ainda solta. A mulher vai perdendo força nos braços e deixa-se cair na cama, mas não deixa de querer chupar o clítoris da amiga. O seu corpo estende-se na cama e as suas mãos apalpam as nádegas da estudante. Possuída, ela entrega o último pedaço sexual de si a Lúcia, que solta um gemido apaixonante. Na rata da jovem sobrevive o derradeiro suspiro de excitação da convidada.
Já é noite. Já não há jogos de sombras. Já existe uma luz artificial que acrescenta uma nova iluminação. Às imagens de Luísa, à curiosidade de Lúcia. Deitadas na cama, as duas amantes voltam a trocar olhares, misturados entre beijos meigos, na mistura entre os lábios finos e a boca carnuda. Lado a lado, elas experimentam conhecer-se. Olhar para o corpo que têm diante de si e percepcionarem depois da consolação o que realmente consumiram. Lúcia realiza que trouxe para casa uma mulher sensual, diferente e com um perfil tipicamente lésbico. Luísa encaixa a aventura em que se deixou levar. A atracção por uma jovem desconhecida que mantém discrição quanto à sua opção sexual, acabou por confirmar-se como uma fantasia concreta. Com os corpos de lado no colchão, tanto os seios de Lúcia como de Luísa esbatem, dando uma elegância sensual ao momento. Há tempo para ter tanto. Mas a curiosidade é o que ainda resta de tanto prazer.
- Eu nem sequer sei quem tu és! - diz Lúcia num tom baixo de voz, misturado com um sorriso.
- Sou a Luísa...
- Pois, isso já eu sei, mas...
- Sou fotógrafa...Repórter fotográfica.
- Isso também eu já percebi.
- O que queres então saber?
- Porquê eu?...
A pergunta torna-se demasiado subjectiva para responder. No Espaço, a atracção foi mútua. A acção inusitada de Luísa a nenhum momento foi recusada pela jovem. E se Lúcia aceitou a fotografia e a consequência dela, não havia justificação quanto ao motivo que fez a fotógrafa escolhê-la a ela. Afinal de contas, Lúcia é lésbica, nunca o pretendeu esconder e correspondeu ao olhar. A pergunta era assim difícil de responder com coerência. Luísa levanta-se da cama. O seu corpo nu vai de encontro à mala preta que pousou junto à porta do quarto.
- Importas-te que volte a fotografar-te?
- ...Não... Mas porquê?
- Já te disse...É assim que eu falo.
A mulher retira a máquina fotográfica e depois de voltar a fazer os seus ajustamentos, senta-se ao fundo da cama, colocando a perna direita dobrada sobre o colchão. Encosta o aparelho junto à face, cerra um olho e dispara. Baixa a máquina e olha para a sua amante.
- Queres saber se costumo engatar raparigas em cafés, é isso? - diz Luísa a rir-se.
- Não!...Foi tudo muito de repente e...
- Senti uma atracção muito forte por ti... Não sei como te explicar, mas foi assim que aconteceu. Estava há meia-hora a reparar em ti...a pensar que te queria fotografar...
Luísa volta a procurar o melhor ângulo e fotografa duas vezes. Lúcia ainda continua deitada na cama. O facto de estar a ser fotografada nua parece uma sensação incómoda, mas ela não impede a acção. Ao invés, olha em direcção à lente, procurando chegar à mulher.
- És lésbica?...
- Não...Quer dizer, acho que não.
- Primeira experiência?
- Segunda. A primeira foi com a minha madrinha, dois dias antes do casamento.
- És casada?!!
- Separada...Ele saiu de casa há três semanas. Casámo-nos há um ano e meio... As coisas não correm bem desde que tive o meu filho...
Mais um disparo. Lúcia está abismada. A mulher que está nua, dentro do seu quarto, é uma história em si. Ela em si torna-se uma fotografia complexa, com um compromisso anexado. Descomprometida, talvez. Lúcia repara nas mãos da amante e na verdade, não existe aliança. É dificil decifrar alguma marca no dedo anelar. Mas está tudo a parecer demasiado confuso na cabeça dela. A mulher é sensual. Tem uma beleza invulgar e uma personalidade misteriosa, por detrás daquelas sobrancelhas negras. Faz amor de uma forma intensa. E mesmo que não se considere lésbica, procura o corpo de uma mulher como se fosse uma. Parece madura e apresenta uma ocupação fascinante. Na verdade, as fotografias estão a deixá-la ansiosa e excitada. Luísa tem tudo para encantar a jovem estudante e ela realiza essa percepção. Seria perfeito. Mas Luísa tem um filho, um casamento a meio e sabe-se lá que outras histórias. Por outro lado, ninguém se comprometeu. É apenas um final de tarde estonteante. Ouve-se outro disparo e Lúcia volta a despertar.
- Estás a pensar no quê? - pergunta Luísa - Que sou uma devassa que vai para a cama com a primeira rapariga, tendo um filho em casa?
- Não, Luísa... Não é isso que estou a pensar.
- Estás a pensar que não te poderias apaixonar por uma mulher ainda casada?
- Uhm?!...Ah..não....ah!..Hum..
- Eu falo a partir da lente, mas também ouço com a lente.
A fotógrafa é perspicaz. A jovem não consegue responder. Porque neste momento, nem ela sabe o que há-de pensar. Teve um dos melhores momentos carnais que se recorda de ter experimentado, mas também um dos mais impulsivos. E ela não quer justificar o desejo de repetir tudo outra vez com o vazio emocional que sente dentro de si.
- Estou a ser aborrecida em fotografar-te?
- Não!... Estou a adorar, Luísa... A sério...Posso ver?
- Sim, claro...
- O computador está ligado. É só ligares o monitor e encontrares a porta para o cabo.
Rapidamente, Luísa conecta a sua máquina fotográfica ao computador da amante. Lúcia já está sentada na cama, curiosa para ver as imagens captadas pela mulher nua. Após o descarregamento, começa a correr uma apresentação de slides no ecrã do computador.
- Estas fotografias tirei-as antes de te conhecer. Sim, eu sei. Falta algum sentido artistico nelas. Quando rebenta uma conduta de água nesta cidade, eu estou lá...
- E essa?
- Desculpa, já te tinha fotografado antes... Não podia deixar de captar esse ar concentrado enquanto estudas. És linda quando o fazes, sabias?
Lúcia sorri, gostando do elogio. As imagens de Luísa parecem mesmo falar. Falam com ela. Antes de encontrar a presença de Luísa, a jovem demonstra um ar cansado, algo perdido, delicadamente triste. A fotógrafa passa a imagem, alcançando a fotografia que Lúcia autorizou.
- Se te pedisse para olhares para mim assim, talvez não o conseguisses fazer...
- Se soubesse que me ias fotografar, tinha posto um olhar diferente.
- Foi isto que eu quis... Foi isto que eu desejei.
- ...Obrigada... Essas a preto e branco também estão muito boas...
O corpo nu de Lúcia. A transparência das suas emoções. A maturidade dos seus gestos. A ferida que ainda sucumbe no peito escondido. O desejo que desperta no seu ventre meigo. Em sete fotografias, Luísa espelhou digitalmente aquilo que vê na amante. E Lúcia reconhece. De tal forma, que ela deixa de olhar para o monitor. O seu corpo despido é sensual. Mas torna-se doloroso identificar um espelho. E assim, a jovem agacha-se. Envolve os braços nas pernas dobradas e encosta a testa nos joelhos. Parece querer esconder o seu corpo. Luísa ouve um suspiro e procura entender a amante. Com a máquina ligada ao cabo, ela segura-a e escolhe os melhores ajustamentos. Preto e branco. Lente próxima. Relevo às sombras definidas. Clique. Disparo. Revelação. Num simples botão, Luísa repete o processo de descarregamento, mas desta vez para uma única fotografia. Aquela em que Lúcia - a sua amante - guarda em si uma melancolia apaixonante. Essa melancolia que a fotógrafa agarrou intemporalmente. Nesse tempo em que Lúcia se fixou. Ficou. Aceitou. Entregou. Nua.