sábado

Só importa o que não é para ouvir

Publicado a 23-05-08
Aconteceu. Com uma razão aparente. Com uma sucessão de acontecimentos previsível. Com uma inevitabilidade inesperada. Com uma aceitação surpreendente mas natural. Aquilo que parece impossível e inalcançável, depois de vivido torna-se vulgar, simples, algo que já passou. Laura, Afonso, Sofia e Diogo estão prestes a adormecer. O corpo de cada um cede à exaustão. A mente conforta-se com a excitação e prazer consumidos. Mas na enorme cama de casal de um dos quartos do 2º direito, os dois casais trocam os olhares entre si antes de cerrarem as pálpebras. Num silêncio vagaroso, numa tranquilidade absurda, numa comunicação que dita o que já foi feito. Não há um sorriso, não há um pestanejar mais forte, não há um movimento que caracterize uma reacção. Laura olha para Afonso e depois para Diogo. Afonso cinge o olhar na sua namorada e em Sofia. Diogo fixa o olhar na mulher que o ama e perde-se lá. Sofia faz questão de olhar para os três parceiros sexuais. E cada um deles já tinha olhado antes deste silêncio para Gustavo. O homem, o quinto elemento nas noites apaixonantes dos dois casais já se rendeu ao cansaço. Adormeceu no lado direito da cama, com a certeza de que algo tinha ficado no ar. Sobrou uma sinistra ideia de como se pode desejar o que à partida parece proibido.
Sábado. O lar de Afonso e Laura respirava uma tranquilidade essencial. Sem rotinas adjacentes, sem compromissos por cumprir, sem a menina durante todo o fim de semana, o casal conseguiu receber os convidados numa ligeireza ambiciosa. Haveria tempo para tudo. Haveria espaço para tudo. Jantar preparado com dedicação por Laura. Sobremesa saborosa, com um beijo intenso entre Sofia e Diogo a lançar o resto do serão. No quarto onde Laura e Afonso reservam as suas noites intimas, tudo foi partilhado. A empatia entre os dois casais cada vez é maior. Afonso conhece os desejos de Sofia, Laura sabe exactamente como levar Diogo à loucura. E o casal convidado tem consciência dos limites que existem num envolvimento assim. Apesar de manterem um relacionamento intimo, os quatro adultos não pisam trilhos perigosos. Existe paixão, sem dúvida. Existe desejo pelo corpo que não lhe pertence. Mas a alma tem dono. Ou pelo menos está entregue a alguém. E sempre esteve estritamente proibido abrir portas aliciantes. Esta empatia começa a ser transmitida a Gustavo. O homem, antigo namorado de Sofia, novel amante dos dois casais, é um espectador. Um voyeur presente nos mais recentes momentos escaldantes. De tal forma que penetra na vida intima dos quatro amigos num jeito suave, subliminar, mas intenso. Também ele sabe as regras a respeitar. Também ele tem consciência da atitude a manter num relacionamento swinger. Também ele sabe o lugar que vai ocupando. E é inegável que o quinto elemento tem rompido alguns costumes na actividade intima dos dois casais. Ele é o objecto inteligente que quebra tabus e transmite ocultas sensações.
Meia-noite. A cama já tinha os lençóis usados. A actividade erótica e sexual era intensa. Laura já chupou os dois amantes, guardando um pedaço do seu desejo para o sexo de Afonso. Depois de gozar a masturbação feita pelo namorado da sua amiga, Sofia entregou-se à tesão do seu homem e de Gustavo. Um de cada vez. No topo da cama, entrou primeiro Diogo. Ela estava ainda com a rata a latejar, com a longa provocação dos dedos de Afonso. Estendida nua na cama, ela fixou o olhar no homem que a ama. A penetração sabia bem, mas ela já tinha alcançado um ritmo que exigia sempre mais. Inicialmente, os outros presentes assistiam com desejo à foda que o casal praticava. Os dois namorados sentiam-se vigiados mas isso excitava Sofia. Ele cedeu à pressão e apesar der dilatado o sexo da namorada, sentiu que o orgasmo podia ser libertado com demasiada antecipação. E isto sempre foi um jogo. Diogo deitou-se sobre o corpo da amante e segredou-lhe ao ouvido. Ela abriu um sorriso e beijou-o. Logo a seguir, Diogo sai de cima dela e entrega o lugar a Gustavo. O homem bissexual segurou as pernas da ex-namorada, abriu-a e com uma atitude de desejo carnal, entrou na rata de Sofia. Penetrações veementes. Gestos escaldantes por todo o corpo feminino. Mais penetrações vibrantes. O intimo de Sofia voltou a alcançar um êxtase surreal. Ela agarrou-se aos lençóis e cerrou os olhos. Não importa o que estava na sua imaginação. Ela sabe que tinha três homens a querer possui-la e a jovem mulher fez questão de degustar cada pedaço. Por esta altura, Laura e Afonso acariciavam-se mutuamente. A rata da mulher também foi estimulada pelos dedos dele. E Laura não podia negar que sentia o seu clitóris a inchar. E na cama de casal, na cama do par de namorados do 2º direito, na cama onde imensas coisas são permitidas, os cinco amantes deliciavam-se com uma noite que corria sensatamente excitante. Afonso oferecia um orgasmo sublime à sua namorada, Sofia pediu que fosse Diogo a sentir a explosão da sua rata e Gustavo tinha uma forma peculiar de assistir a tudo isto.
Ameno. Foi com uma madrugada tranquila e uma temperatura primaveril que o ambiente no quarto ameno caracterizou o auge da noite dos cinco adultos. A envolvência dos presentes intensificou-se. Laura entusiasmava-se. Ela sentia o espírito frenético que os corpos dos outros elementos carregavam. Nenhum dos cinco adultos podia negar que o seu corpo respirava sexo. Nenhum ousava confessá-lo, mas todos eles detinham uma vibração sensorial que precisavam de libertar. Surrealmente, era possível ouvir o tacto dos corpos a dançarem entre si. Impossível dizem os cépticos, transcendente dirão aqueles que conseguem imaginar. Sofia. Naquele instante, naquela posição, na sua delicada forma de ser, ela apresentava-se como o membro mais vulnerável aos desejos dos diversos amantes. Deitada com a barriga para cima, a mulher tinha uma das mãos do seu namorado a acariciar-lhe o seu seio esquerdo. Do seu lado direito, Afonso encostava-se a ela e apalpava o seio. Sofia olhava para ambos os homens quando sente Gustavo a acariciar as suas coxas. Mãos aventureiras, ternas, pacientes. Lentamente, o homem bissexual foi abrindo as pernas dela e roçou a palma da mão pelo sexo molhado da loira. O corpo dela já vibrava. Mas agora, Sofia sentia-se volátil. Libertava gemidos suaves e contorcia os membros. E quando ela vagueava os braços pelos lençóis, no topo da cama, encontrou o corpo de Laura. A amiga e amante estava a assistir às caricias masculinas, procurando perspectivar o que iria suceder. Ajoelhada na almofada, encostada ao topo da cama, colada à cabeça da loira, Laura sorriu para a amiga e deixou que as mãos dela invadissem a sua pele. Sofia apalpou as mamas da namorada de Afonso. Brincou com elas, sentiu-lhes o toque, transmitiu a tesão que pulava no seu interior. Por esta altura, Afonso já acariciava o rabo dela e roçava o pénis entre as nádegas. Diogo puxa com ternura o corpo da sua namorada e coloca-a de lado. Olhos nos olhos, o casal comunicava entre si. Ele percebia que Sofia estava excitada e que tudo poderia acontecer. Ela entendia que Diogo estava predisposto a que a noite fosse especial. As mãos de Gustavo procuravam masturbar a rata da ex-namorada, mas ele percebeu que a mulher já fazia parte de uma sanduiche humana. Pressionada entre o corpo dos dois homens, ela levantou uma das pernas, de modo a que os seus dois orifícios estivessem disponíveis. Primeiro entrou Afonso. Ele abriu as duas nádegas e com delicadeza penetrou no ânus da amante. Sofia solta um gemido seco. Cerra os olhos e finca os dedos da mão direita no pescoço do namorado. Depois entrou Diogo. A rata dela já estava suficientemente lubrificada para que fosse fácil para ele deslizar pelos lábios vaginais de Sofia e enterrar a picha no intimo dela. A mão esquerda da loira procurou segurar-se à mulher que a deixava tranquila perante três homens. Laura dá-lhe essa confiança. E a namorada de Afonso segurou a mão fina da amante, consciente de que Sofia precisava dela. Ao mesmo tempo, curvou as costas e pediu um beijo da boca da mulher. A língua de Sofia devorou a boca de Laura e as duas mulheres sentiam-se mais unidas que nunca. Gustavo achava-se perdido. Estava excitado e os corpos unidos deixava-o em polvorosa. Sofia estava ocupada. Demasiado envolvida na dupla penetração. Ele ajoelhou-se na cama e por cima da foda que ocorria entre os três elementos, ele pendeu o corpo para a frente e procurou Laura. Ela sorriu para ele e beijou-o. Trocaram um linguado excitante e deixaram que toda a envolvência em redor deles invadisse o seu desejo. Sofia era penetrada com vagarosidade. Ora penetrava Afonso, ora Diogo aproveitava o movimento das ancas da namorada para voltar a entrar na vagina dela. Quando Afonso segurou as nádegas da amante, puxou o corpo dela para si e sentiu o seu pénis a inchar dentro do rabo de Sofia. Quando Diogo pressentiu o sexo do amigo a foder bem fundo a mulher que ele ama, puxou a coxa dela para si e voltou a reivindicar a rata de Sofia. Era frenética a forma como eles partilhavam a paixão, não havendo um sinal que demonstrasse vontade para cessar tão cedo.
Infindável. A noite dos cinco adultos parece não ter fim. Cada segundo estende-se por largos minutos. Tudo é vivido com dedicação, desejo e gula. As mãos de Sofia continuavam a procurar a sua amiga. E Laura queria dar-lhe tudo. Gustavo deslizava por entre os corpos que se devoravam mutuamente. E quando procurava o seu lugar, encontrou-se deitado de lado, mesmo por detrás de Diogo. Sofia gemia e tentava controlar a respiração com a dupla penetração que lhe era entregue. Os pénis dos dois homens inchavam progressivamente e entravam na rata e no rabo da loira. E ela enlouquecia de tal forma com tamanha excitação, que se perdia ao tentar encontrar um jeito de suportar as investidas carnais dos seus amantes. Laura recebia a tensão da amiga. Com os joelhos fincados na almofada, a mulher abriu as pernas e aproximou a sua rata da face de Sofia. Ao dar de caras com uma visão intensamente excitante, a loira não hesita em libertar a sua ansiedade nos clitóris inchado de Laura. Ao mesmo tempo que levantava o queixo, esticava a língua e com uma mão segurava a coxa da amante pela virilha, Sofia sucumbia progressivamente à dupla penetração que a fodia exaustivamente. Afonso sentia o rabo da amante a ceder. Denotava que a dor provocada por cada entrada deixava a mulher sem forças. Ainda assim, ele levou a mão esquerda por entre as pernas da sua namorada e ajudou Sofia a lamber Laura. Era intensa a forma como todos se conseguiam envolver. Diogo ainda reservava forças para penetrar na sua namorada. Ela colocava a coxa em cima do seu corpo. No entanto, Sofia pressentia algo mais. Uma mão masculina invadia a cintura de Diogo. Por um instante ela abriu os olhos e assistiu ao abraço de Gustavo no corpo do seu namorado. E o homem que a fodia deixava que os braços do homem bissexual o envolvessem. Porque havia um pacto entre os cinco. Havia uma concordância em deixar seguir os sentimentos apaixonantes. Como uma corrente inevitável. Como uma expectativa que tinha que acontecer. Laura deliciava-se com a boca de Sofia e os dedos de Afonso. Mas ainda assim, ela já não conseguia desviar os olhos do que acontecia por detrás de Diogo. Colado às costas do namorado de Sofia, Gustavo entregou um beijo no ombro de Diogo. Ele reage e retira a mão da coxa de Sofia para depois transportá-la até às nádegas de Gustavo. O sinal estava dado. O desejo era assumido. E apesar de haver uma boa dose de loucura insane em tudo o que era feito naquela cama, os cinco adultos estavam cientes de que permitiam com consciência o que ia acontecendo. Gustavo penetrou em Diogo. Laura cortou a respiração. Sofia libertava gritos de prazer. Afonso enterrou o pénis no rabo de Sofia. Diogo sentiu sentiu o mesmo prazer que a sua namorada. Uma sensação nova. Uma sensação diferente. Uma sensação excêntrica. Toda a gente ouviu. Toda a gente sentiu. Mas ninguém largou uma palavra sobre o assunto. Gustavo agia com calma e sensatez. Laura mexia as ancas e gemia do prazer que lhe era concedido. Sofia vinha-se com duas pichas dentro de si. Afonso libertava o seu gozo pelas costas da sua amante. Diogo cerrou os olhos e tentou percepcionar a nova experiência de uma forma que só ele conseguirá explicar. Mas todas as atenções estavam centradas ali. A envolvência sexual mantinha-se. A dupla penetração, o sexo oral, as caricias, os toques, os olhares. Mas tudo acontecia com o propósito de tornar especial e relevante o passo que foi tomado. Porque era um novo nível. Para todos eles. Gustavo tinha relações sexuais directas com um homem que desejava, segurando as nádegas dele e tentando tornar a penetração o mais confortável e prazeirento possível. Laura encaixava a ideia de que finalmente acontecia aquilo que ela tinha a certeza que iria ocorrer. Sofia estava perdida num mundo surreal, onde obtém o prazer divino, uma dor excitante e a sensação de ver o seu namorado ser fodido por um homem. Afonso apertava os braços nas mamas da amante e procurava acreditar que diante de si, dois homens uniam-se numa acção apaixonante. Diogo controlava a sua mente, respirando fundo e deixando o sexo do amante penetrar com benevolência dentro de si. Afinal, aquilo estava mesmo a acontecer. A orgia dos cinco elementos ultrapassou uma nova fasquia.
Memorável. Há uma sensação sinistra nos dois casais. Gustavo cedeu ao cansaço e ocupou o seu lugar. Deitou-se no lado direito da cama e procurou entregar-se ao sono. O silêncio é a palavra de ordem. Depois de terem olhado para o amante bissexual, os quatro adultos comunicam entre si. Ninguém quer falar. Ninguém que sequer ousar dar um comentário sobre o que aconteceu. Foi bom. Sofia recebeu um prazer demolidor. A dupla penetração fez explodir o seu corpo de prazer e ainda teve forma de distribuir a paixão que vulcanizava do seu interior. Deliciou Laura com a sua boca e deu-lhe um reflexo do que recebeu. Nunca até este momento, a mulher loira tinha sido possuída daquela forma. Afonso fez parte disso e não obstante ter sentido a fúria do orgasmo dela, conseguiu ter nas mãos parte do prazer da sua namorada. Mesmo que Laura sinta que se tornou uma mera espectadora de tanta penetração, ela sabe que é a melhor testemunha do que aconteceu. Ela olhou para a relação homossexual de uma posição única. Ainda assim, ela guarda dentro de si o que sente. Só o seu olhar é que não consegue desmentir o fascínio pelo que a sua mente assistiu. Diogo está diferente. Como se depois de ter sentido Gustavo vir-se dentro de si, algo o transformasse. Mas ele é um homem maduro e consciente. Sabe o que aceitou. Entende o que desejou. Interiorizou o que lhe foi dado. E ninguém poderá dizer que se sentiu desconfortável com o que foi partilhado nesta cama. Nem Diogo. Nem Laura. Nem Afonso. Nem Sofia. Muito menos Gustavo. O quinto elemento voltou a ser um dinamizador das noites intensas dos dois casais. A anfitriã aninha-se entre os dois elementos do seu casal amigo. Encosta a cabeça no peito da mulher e olha para o seu namorado, sabendo que ele está muito próximo de si. Todos eles estão colados. É um abraço uniforme. Os olhos vão cerrar-se e sonhos distintos vão transformar a mente de cada um dos presentes. O que se vai passar amanhã é uma incógnita. Mas hoje, com a firmeza da maturidade que eles reconhecem mutuamente, os dois casais e Gustavo partilham a tranquilidade de uma noite. Aconteceu.

sexta-feira

Tentar ouvir o silêncio alheio

Publicado a 20-05-08
É intimo. A água ferve e a humidade acresce a intensidade que se vive no mais recente espaço do Edificio Magnólia. No interior do jacuzzi, os mentores do lugar de lazer procuram finalmente aproveitar as instalações numa maior intimidade. Apenas os dois. Marido e mulher. Ela e ele. Transportar o amor para uma enorme dose de paixão fervilhante. Trazer os corpos quentes e incendiados da harmonia do 1º esquerdo para a excentricidade da piscina no topo do prédio.
- Ainda me amas?
- Da mesma forma intensa que tu me amas e me vês o homem da tua vida.
- Queres comer-me, meu presunçoso?
- Vou devorar cada pedaço de ti, minha cabra.
- Diz que me amas.
- Amo-te!
- Eu preciso de ti loucamente.
Abraçados. No tanque com água morna a borbulhar, os dois corpos envolvem-se num fraterno abraço. Os braços de Helena apoiam-se nos ombros do marido e a mão que está enfeitada com a aliança segura a nuca dele. Os braços vigorosos de Rodrigo envolvem o corpo sereno da esposa até chegar às nádegas formosas dela, onde a mão adornada com a outra aliança aperta a carne firme. E os corpos nus só se querem misturar e consumirem-se mutuamente. A instável linha de água mantém-se pela cintura dela e o sexo dele, um pouco acima do borbulhar, está a roçar no ventre da mulher. Existe um beijo. Um colar de lábios quente, silencioso, que mantém o pacto do amor, da paixão e de todas as coisas que podem faltar dizer. Porque há ainda muito a partilhar neste casamento. Os segredos de Helena, as viagens ocultas de Rodrigo. O amante maduro que ela guarda. A secretária da faculdade do filho dele que se junta às suas paixões. O rapaz que ela nunca ousou pensar em comer. A jovem namorada do filho que traz o fruto imensamente proibido mas escandalosamente excitante. Há tanta coisa por contar. Aquilo que o parceiro não sabe. Ou pelo menos Helena e Rodrigo julgam que o conjugue não sabe. Nem fazem a mínima ideia. Mas o beijo silencia qualquer desabafo que o peso na consciência possa carregar.
- Estás a pôr-me entesado...
- Queres acalmar?
- ....Quero... Quero que brinques com ele.
A boca de Helena descola-se dos lábios do marido. O rasgo superior da boca dela escorrega pelo queixo dele, para depois o rasgo superior brincar com o pescoço do homem. As mãos suaves dela escorregam pelo peito, abrindo caminho para a sua boca deslizar até ao ventre de Rodrigo. Helena está agora ajoelhada no tanque e apalpa o rabo do marido. A picha entesada balança em cima da linha de água e roça nas maçãs do rosto da parceira. Carinhosamente, revelador de um conhecimento intimo profundo, num jeito apaixonado mas também guloso, ela faz o gesto de colocar o sexo do marido entre os dentes de uma forma atrevida. A língua prova a ponta do sexo, os lábios envolvem a carne tesa e os dentes seguram o órgão erógeno do marido. E ao sentir o sabor do pénis dele, Helena movimenta a sua própria mente para uma imagem bem distinta daquele lugar. Ela sabe o que chupa, ela confirma que o marido está a gostar, ela faz o máximo para que ele possa sentir todo o prazer. Ainda assim, Helena só consegue imaginar o homem que ela julgava pertencer-lhe unicamente a si, a ser chupado por uma outra mulher. É uma imagem pouco fiável. Desfocada, quase distante do toque, do cheiro, até da vista. Mas o coração sente. Helena chupa a picha de Rodrigo, mas imagina que é Sandra que delicia o homem. Na cabeça dela, a sua racionalidade leva-a a pensar que a namorada do filho já fez um broche assim ao seu marido. Helena não duvida dos dotes dos seus lábios carnudos e da sua língua perversa. De qualquer forma, é muito forte saber que aquele sexo não é só dela.
- Ohhh... é bom quando fazes isso, amor.... Uhm... És a minha cabra?...
Depois de sentir o movimento da cabeça dela, acenando positivamente à sua pergunta, Rodrigo abre a mão e coloca a palma na nuca da sua esposa. Pressiona a cabeça, por cima dos cabelos negros molhados, e incita-a a chupar mais, quase que a forçá-la, num pacto excitante que Helena aceita. Completamente abocanhado, ele olha para a mulher com um ligeiro sentimento de revolta e nojo. O broche está saber-lhe muito bem. Ele reconhece os lábios fantásticos da mulher e sabe exactamente a forma como ela o deixa louco. Mas na sua mente mantém-se uma fantasia. Quase um assombramento. Talvez excitante, mas deveras doloroso. Ao vê-la naquela posição submissa, chupando entusiasticamente, libertando suaves gemidos de prazer, aceitando as ordens gestuais do homem, Rodrigo só a imagina a chupar um dos melhores clientes da empresa que eles detêm. Pressupõe que ela imagina o sexo de Alberto, oferecendo-lhe um exercício oral carregado de desejo adúltero.
- Cabra....És mesmo cabra...uhm....chupas como uma puta...
O entusiasmo de sentir a picha dele na sua boca e de o momento proporcionar sensações proibidas, ainda mais num lugar tão atrevido, faz a mulher excitar-se e aceitar os mimos insultuosos que o marido lhe entrega. Porque ela sabe que está a chupar de uma forma intensa e até deduz que ele imagina a ordinária da namorada do seu filho a comê-lo. Ainda assim, ela esmera-se. Como se este momento fosse derradeiro. Como se quisesse comprovar algo ao marido. Como se não o quisesse perder, mas ao mesmo tempo relembrá-lo que há poucas amantes como ela.
- Ohhh, sim, amor...chupas tão bem....eu sei que gostas...oohhh!!!
Ele imagina o quanto ela pode gostar de chupar. Não só ele. Porque Rodrigo tem consciência o quanto Helena adora usar os lábios carnudos no sexo que ele confessou pertencer a ela. Mas não pertence. Nem o seu pénis, nem a boca da sua esposa. Helena deve dar a conhecer os seus dotes a homens como Alberto. Deve provocá-lo apenas com um morder de lábios. Deve ajoelhar-se no chão da sala ou então abrir-lhe as calças, sentada na cadeira do escritório. E não obstante o facto de ainda amar a sua esposa, descontando a questão de ela ser infiel, percebendo ao mesmo tempo que ele próprio molha o sexo em outras bocas, Rodrigo vem-se de uma forma apaixonante, sabendo que está a ser chupado por alguém que interpreta a fantasia de mulher debochada.
- Helena...ooohh...chupa-me...ohhh...chupa-me, grande cabra!
Amor, algum. Perversidade, bastante. Rodrigo e Helena sabem que é um amor perverso que eles partilham no jacuzzi. Com a boca recheada de sémen, com o pescoço pintado de suor e com os seios encharcados pela água morna, Helena ergue-se e volta a colocar os braços em redor do pescoço do marido. Um sorriso. Um espelho da paixão que ainda absorve a mente dela. A mulher ainda se sente apaixonada por Rodrigo. Talvez ela tenha uma razão suficiente para o largar. Para começar uma vida do zero, lutar pela custódia dos filhos, pela separação de bens e por uma ferida que irá sempre ficar. Quem sabe até recomeçar com Alberto, um homem maduro que tem uma forma peculiar de mexer com ela. Talvez ela própria saiba que o erro também é dela. Um beijo. Rodrigo recebe os lábios cremosos da mulher e pensa que tudo já poderia ter terminado. É difícil imaginar a sua voluptuosa, carinhosa e sensual esposa, mãe de filhos, na cama com outros homens, na certeza de um adultério provocante. Mas nem ele nega que haveria demasiadas coisas a perder com o cessar de um casamento de quase vinte anos. A dignidade, segredos escondidos no armário, o amor dos filhos, a quebra de uma empresa bem sucedida. Um linguado. Nem Helena, nem Rodrigo, no silêncio dos seus pensamentos conseguem desmentir. As mãos tremem e a melhor solução passa por manter esta sensação. Abraçados, envolvidos, unidos. E assim existe um casamento, uma sociedade, uma paternidade. Talvez ambos saibam que estão a ser falsos. Mas isto é o melhor que eles têm.
- Sabes que me pões entesado, não sabes? Excita-me quando és assim como uma rameira...
- Dá-te gozo chamares-me assim?
- Nem imaginas quanto...
- Então fode-me assim... Fode a tua rameira, cabrão...
Há uma intensa agressividade nas palavras do casal. Excitação, fúria, raiva interior, prazer em provocar o parceiro. Seja qual for o motivo, Helena e Rodrigo acendem-se mutuamente com palavras que num outro contexto seriam ofensivas. Na verdade, se eles não estivessem nus e colados um ao outro, poder-se-ia pensar que estão a discutir. As palavras que ambos trocam poderiam ser caluniosas se cada um deles confessasse o que sabe sobre a vida adúltero do outro. Seria caótico. Mas eles não estão distantes. Rodrigo usa as suas mãos para apalpar o corpo da mulher e empurrá-la contra a parede do tanque. O tronco de Helena pende para a frente e apoiada nos braços dobrados, ela deita-se na pedra fria. O seu rabo fica empinado e com a água a deslizar pela derme macia e a escorrer pelo rego traseiro.
- Não achas que isso é demasiado provocador?....
- Fode-me logo, cabrão...
O casal está a ferver. Corre nas veias um calor atípico. Distinto da paixão que os une e que em grande parte mantém a relação conjugal. Corre no sangue um sentimento fervilhante, prestes a explodir. A sensação de terem sido atraiçoados às escondidas deixa-os perto do descalabro. E no interior de cada um há uma mistura fina de raiva e tesão. Ser enganado transforma a sensação de traição em fantasia. É possível alguém que está casado sentir-se excitado por ter sido traído? Ou será a adrenalina de também ter comido fora? Muito possivelmente será o delírio de momento tão escaldante. Helena continua com o rabo empinado e Rodrigo já penetrou no ânus da mulher. Progressivamente, delicadamente, mas com muita impaciência. Rodrigo quer fodê-la, como se de uma puta se tratasse. Helena deseja ser comida, de preferência com a sensação de submissa ao parceiro. Ele é um palmo mais alto do que a mulher. Isso deve-se ao abdómen mais corpulento do homem. De qualquer forma, a cintura dele coloca-se à altura do traseiro da mulher. As suas mãos colam-se à carne das nádegas. O sexo dele está hirto. Penetra. Sente-se inchado dentro dela. Fá-la sentir possuída. A união que é realizada coloca o casal em dois planos.
- Tu gostas...oohhh amor, eu sinto que tu gostas!...Uhmm...
- Sim...uhmmm... sentes-te que me fodes? Que me fodes toda?!
De pé, com a água a borbulhar por debaixo dos testículos, Rodrigo penetra na mulher que está de costas para si. Ele olha para Helena e apenas consegue visualizar os cabelos molhados dela, as custas suaves e as nádegas ruborizadas. E de uma certa forma, agora que ele a fode à sua maneira, ele não vê ali a sua esposa. Pelo menos, não vê a mulher que o deseja como seu fiel parceiro. Na cabeça de Rodrigo, Helena estará a imaginar outro homem a penetrá-la. Certamente que ela se entrega a outro amante. Até pode nem sequer ser Alberto. Mas ela está com toda a certeza a colocar na sua mente a ideia de ser fodida por um homem possante e que a trate de uma forma submissa. E essa sensação corrói o bom senso de Rodrigo. Por isso, apesar das suas mãos estarem a ser carinhosas com o rabo da mulher, ele fode Helena com uma tenacidade um pouco mais agressiva que o costume. Mais do que nunca, Rodrigo sente-se a foder a mulher como uma qualquer outra amante.
- Rodrigo!!...Ohhh....siiimm...fode-me...oohhh!! Ohhh...uhmmm!!...Ohhh! Sim.
E na verdade, nem Helena consegue distinguir muito bem quem imagina que a fode. Ela não vê a cara do marido. Sabe que é ele. Nem sequer dúvida disso. Mas nesta encruzilhada de traições e pensamentos adúlteros perigosos, Helena procura sentir-se noutro espaço. Procura transformar a picha de quem a fode num sexo de outro homem. Alberto, talvez. Ele tem esta atitude possessiva, directa, que a faz sentir louca e dependente do prazer que possa receber do amante. O seu funcionário da empresa. Miúdo, provavelmente. Inexperiente na forma como controla a tesão, mas sem dúvida aventureiro e incansável. Miguel, certamente. Na sua mente, mesmo que não visualize, é o amigo do seu filho quem a fode no rabo. É isso que ela deseja, que fantasia várias vezes quando está perdida no meio do trânsito. E não sendo a carne de Miguel que ela recebe realmente, Helena fecha os olhos, imagina e deixa que o seu rabo seja levado ao limite.
- Cabrão!!...Ohhh...És mesmo cabrão.... Estava louca por te ter assim...
- Sentes?... Ohhh, Helena, estás a sentir o mesmo que eu? Eu sei o que estás a sentir...Ohh....sei!!
A posição até é tremendamente excitante, atrevida e surpreendentemente vibrante. A dor criada pela dilatação anal chega a provocar-lhe arrepios na espinha, que em última instância transforma-se num sinistro prazer. Aconteça o que acontecer. Ainda que o final da tarde deste casal vá terminar num longo abraço, num beijo fogoso, em palavras amorosas e em promessas feitas para o céu. Ainda que antes de adormecer, Rodrigo e a sua esposa guardem uma sensação fantástica destes momentos no jacuzzi. O certo é que Helena não se sente penetrada pelo seu marido. Sabe que é ele mas não o sente. Talvez não seja Miguel, ou Alberto ou o seu funcionário. É um amante certamente. Nunca o seu marido. E sem encontrar muita explicação para tal, Rodrigo assiste aos gemidos de Helena transformarem-se em gritos. E ele deduz aquilo que é uma certeza. Helena sente-se possuída por uma traição que não chega a ser física. Nunca a mente de Helena foi tão adúltera. E jamais Rodrigo pôde ter esse sentimento a apertar-lhe daquela forma o peito. É uma espécie de orgasmo o que a mulher sente. É uma adrenalina imensa aquilo que Rodrigo liberta assim que cede à intensidade da foda.
- Simmm...ooohhh...Rodrigo!! Eu sinto! Ohhh... sinto-te todo!
- Uhmm!!!...Oohhh...és linda!... Ah! És uma cabra tão linda...uhmmm... és a minha cabra!
O corpo dele pende para frente e cedo ele estará a abraçar a mulher infiel. Há perdão. Talvez haja perdão para tudo. Talvez haja uma forma de passar esponjas sobre os erros imperdoáveis. Porque uma traição assim não merece castigo. Ladrão que rouba ladrão supostamente deverá ter cem anos de perdão. Traidor que trai outro traidor deve estar calado e penitenciar-se unicamente pelo seu erro. Neste caso, cada um ouve o silêncio do parceiro e tira as suas próprias conclusões. Houve prazer, houve uma libertação de desejo, houve um deleite do novo espaço. O jacuzzi caracteriza-se por provocar sensações escaldantes, perversas e excitantes. Aqui dentro, tudo pode acontecer. Até mesmo aquilo que não se perspectivava. Até ser infiel. Até trair só com o próprio pensamento. Até ser traído e não poder acusar. O silêncio de Helena e Rodrigo é um castigo maior que qualquer confissão ou revelação. Na saúde e na doença, na riqueza e na pobreza.
- Levas-me para casa... Esta noite já não quero ser a tua cabra. Quero ouvir-te dizer....
- ...Amo-te....
Ele vai abraçá-la. Ele vai retomar a paixão. Ele vai guardá-la nos braços e sonhar que ela nunca foi infiel. Com a verdade se engana. Um beijo, palavras doces ao ouvido, promessas de amor eterno. Se tudo fosse assim tão simples.

quinta-feira

Ouvir o próprio pensamento

Publicado a 19-05-2008
Caseira. Maria José não pode negar, nem sequer a si mesma, que é uma mulher caseira e que o seu lar acolhe-a. Um hábito, um comodismo, uma forma de viver, uma escolha. A casa que ela mesmo decorou, tornou sua e continua a viver intensamente, é o espaço que a faz sentir tranquila, que a torna menos vulnerável às fragilidades da sua maturidade. Sejam psicológicas, sejam físicas. Protege-a das consequências que o seu carácter reservado tende a proporcionar-lhe. Injecta confiança na sua forma de pensar e decidir cada segundo seguinte. Por essa razão, grande parte dos momentos importantes da vida de Maria José, ocorrem no seu lar. Acima de tudo, a sua intimidade transforma-se na sua casa. O 1º direito do Edificio Magnolia vincou ainda mais esta faceta da mulher. Não é surpresa nenhuma então, se Maria José guardar as suas fantasias e os seus desejos sexuais para o espaço onde se sente mais à vontade. O quarto pertence-lhe. A ela e ao amante. Àquela pessoa que lhe tem entregue felicidade quase à mesma hora que passa o carteiro. Porque ele é funcionário dos Correios mas continua a fazer a ronda em sentido inverso, só para conseguir entrar na rua do Edificio Magnolia em último. Só mesmo para aproveitar minutos essenciais de paixão com a sua namorada, antes dela seguir para a universidade. Só mesmo para sentir que é paixão. E Maria José sabe o que ele sente. Deseja o que ele sente. Pede o que ele sente. Por isso é que ela o considera mais do que namorado. Paulo é um amante. E o seu amante enche o seu quarto. A noite começa a cair e tudo é intenso no lar de Maria José.
- Sim...Paulo...uhmmm.... Sabes tão bem!
- Não pares, Maria José...oohhh, por favor, não pares!...
Em todos os sentidos, não há que enganar. Maria José e Paulo estão a foder. Sente-se, como uma vibração que percorre cada parede do apartamento. Cheira-se, como se um novo aroma fosse criado. Ouve-se, os gemidos incansáveis do carteiro e a respiração descontrolada da mulher. Vê-se, como uma tela animada, pintada com uma tinta apaixonante. Não engana. A professora está sentada sobre a cintura do seu namorado e salta energicamente. Deitados sobre a cama, sempre a lembrar o tom, o cheiro, o toque de lavanda, o casal aproxima-se de um êxtase mútuo. Desde que entraram em casa e despiram as roupas do parceiro. Desde que se empurraram em conjunto até ao quarto e se reaproximaram através de caricias intensas. Desde que o sexo entesado de Paulo foi experimentado pela boca escaldante e terna de Maria José, para depois entrar freneticamente na rata desejosa da mulher. Desde que a sede se transformou numa cópula enfurecida e a fome de pedir mais ditou as regras, é então visível que os corpos do carteiro e da professora experimentam sensações loucas.
- Ohh...Meu Deus...uhmmm...É bom!..Ohhh, é bom!!!
As mãos de Paulo seguram carinhosamente os seios da mulher madura, mas os seus dedos apertam os mamilos cremes e fazem questão de a excitar enfurecidamente. Maria José cavalga. Os seus joelhos fazem força no colchão, os dedos dos pés fincam nos lençóis e as suas mãos seguram-se ao abdómen do jovem. Ela cavalga e sente a picha dele penetrar dentro de si de uma forma cada vez mais intensa. As nádegas dela pulam e esbatem nas coxas dele. As nádegas de Maria José estão firmes mas demonstram a força empreendida na posição. O sexo dele continua teso e ela sente-o. A sua rata incha com cada penetração e parece hipnotizar-se com a fricção exercida. Os olhares entre os dois cruzam-se. Eles comunicam, eles transmitem sentimentos, elas procuram fazer passam o que o corpo deles quer explodir. Porque as mãos dele são carinhosas no peito da mulher. Porque a respiração da mulher demonstra a adrenalina que o seu coração sente. Mas nada consegue fazer passar a mensagem. Aquilo que o cérebro fala. Aquilo que a mente de cada um transforma e não diz. Aqueles instantes precisos antes de um deles se vir. E isso vai acontecer. A qualquer instante, o orgasmo ganhará a forma de um movimento mais seco da cintura dele, para que a picha se cole ao intimo de Maria José. Irá ganhar a força de dez mãos e o estrondo de dez vozes, quando os dedos dela apertarem a palma das mãos de Paulo e os gritos da mulher ecoarem em todo o quarto. Ate lá, cada um goza a sensação única de estar prestes a vir-se e transmite esse toque interior na troca de olhares. E Paulo percebe o que ela sente. E Maria José tem a certeza do que vai dentro dele. Ele sente-se potente. Ela sente-se sensual. O pescoço dela sua, o queixo dele abre-se. O rabo dela continua a cavalgar sobre o amante e as pernas dela mudam de posição, deixando-a dobrada em posição fetal, mas com a planta dos pés assentes sobre o colchão. Maria José sente-se a dominar. Sente que o momento lhe pertence. Sente o amante devoto a si. Sente que aquela posição a transporta para um mundo em que ela não se controla a si mesma. Depois de tanto sentimento, depois de tanta paixão entregue e recebida, depois de um conhecimento mútuo, com o tacto, os ouvidos e a mente, foder assim desta forma empolgante e insaciável, só pode ser fantástico.
- Vais-me foder toda a noite, não vais, Paulo?....Ohhh! Não vais??!
- Sim..uhm...siiimm..eu quero-te mais uma vez...
- Toda a noite! Ouviste? Eu não quero parar!!
Os braços da mulher apoiam-se no peito dele. Ela pende o seu corpo para a frente e Paulo ergue a cabeça. Os bicos das mamas da professora quarentona ficam ao alcance da boca sedenta do jovem. Os pulmões parecem querer explodir, a caixa torácica de um e de outro dilata-se. O suor escorre pelos cabelos. Os gemidos misturam-se. As ancas dela continuam a cavalgar. Só até faltarem as forças. Sim, eles estão a vir-se. Não, eles não se rendem a um prazer inesgotável. Mas sim, está a ser um orgasmo mútuo e afinal, nenhum deles consegue perceber quem começou.
- Ouviste?!...Uhmmm?!...Diz-me...Diz-me que não ouvi a campainha tocar....
- Sim...foi a campainha que tocou, Maria José...
- Ohhh, merda...Uhm, eu não quero parar...Ohhh...eu não quero parar....
Mas não é só a campainha que toca, efectivamente. Assim que Maria José pára de cavalgar sobre o corpo do namorado, tentando controlar a respiração, o telemóvel que está sobre a mesinha de cabeceira começa a tocar. No instante em que a mulher pega no aparelho, o toque volta a cessar.
- Bolas...oh, bolas, bolas!
- Quem é?...
- Oh não!...Isto não está a acontecer!
O telemóvel volta a tocar. Paulo não está a perceber o que está a acontecer e Maria José está demasiado desorientada para contar. Nua e com o corpo suado, a mulher madura sai de cima do corpo do amante. Sensual, numa pose excitante para o homem que acabou de lhe dar um orgasmo frenético, Maria José levanta-se da cama. Enquanto veste a primeira camisa de noite que encontra, ela ouve o telemóvel repetir pela terceira vez o toque. Paulo começa a levantar-se, ainda extasiado.
- Queres que eu vá abrir?....
- E ias dizer o quê?! Que és o carteiro?!! Fica aí e tenta não sair por uns minutos do quarto.
- Mas diz-me quem é!...
Maria José não chega a responder. Sem qualquer outra peça de roupa, ela segue para o hall de entrada do apartamento e abre a porta. Do outro lado está Henrique. Com um saco numa mão, um sorriso na face e a outra mão sedenta de tocar na face da cunhada.
- Estás ocupada?
- Não...um pouco...quer dizer...acho que estou...
- Estou a ver...estás à espera dele...do carteiro...
- Não...
- Ele já saiu...Pois...nota-se no teu olhar... no teu corpo... Deixa estar, não me quero meter na tua vida...
- Henrique...
- Trouxe o jantar, como te tinha dito...
- Pois, mas as coisas mudaram e....
- A sério? Estás-me a dizer que já jantaste...
- Sim, mais ou menos.... Já não tenho fome...
- Pensava que não estavas a falar a sério, quando mandaste a mensagem...
- Eu nunca falo a brincar, Henrique....
- Pois... Mas de qualquer maneira, já trouxe o jantar...e aposto que não recusas um salmãozinho grelhado...é só pôr a mesa e....
- Henrique!...
O homem parece tapar os ouvidos às palavras da sua cunhada. Como se não quisesse perceber o que ela está a tentar dizer. Henrique coloca o saco em cima da mesa de jantar e abre a caixa onde o peixe está mantido. Maria José não sabe muito bem como reagir. Será demasiado complexo explicar que acabou de ter um orgasmo fantástico com o seu novo namorado e que ele até está completamente nu, à sua espera, no seu quarto. Dizer ao homem que lhe arrenda a casa para esquecer o jantar soa a ingratidão. Mas algo tem que ser feito. Ela não pode ficar ali especada a olhar para o homem que também partilhou consigo várias refeições quentes, em noites escaldantes. Numa decisão irreflectida, Maria José dirige-se à cozinha e traz dois pratos, dois garfos, duas colheres, dois copos.
- Não tenho nada para beber... Só sobra o vinho que deixaste da outra vez...
- Também serve. Senta-te aqui....
Não há tempo para ir ao quarto. Não há forma de poder avisar o seu namorado que o outro amante dela está na sua sala de jantar e está decidido a jantar ali. Não há retorno possível na decisão de não ter dito a Paulo que ela já esperava de certa maneira que o seu cunhado surgisse. E tudo isto pode correr muito mal.
- Eu tenho que ir ao quarto... Espera só um instante, Henrique...Eu já volto....
- Não precisas, Maria José.
Paulo entendeu tudo. Aguardou alguns segundos na cama e percebeu que ela tinha aberto a porta a quem tocou à campainha. Levantou-se da cama nu e percebeu que a visita não iria sair. Ouviu a conversa por detrás da porta do quarto e entendeu que o proprietário daquele apartamento não iria sair tão cedo. Ao vê-lo entrar, apenas vestido com as calças de ganga, Maria José corta a respiração. Ao ver o jovem carteiro, amante da sua amante, Henrique abre os olhos, surpreendido. Paulo entra na sala, confiante, com um sorriso, ansioso por ver a reacção do cunhado da sua namorada. Ao mesmo tempo, o seu olhar fica preso nos bicos das mamas da sua amante, por debaixo da camisa de noite.
- Maria José...eu...desculpa...eu pensava que já estavas sozinha....
- Não estou....
- Não se incomode, Henrique... - diz Paulo.
- .... Não sei o que dizer... Quer jantar connosco?
- É desnecessário...Eu já tinha trazido qualquer coisa para comer...
- Eu insisto...Paulo, não é?....Paulo, eu faço questão que nos acompanhe. Afinal, deve haver salmão que chegue.
- Eu vou buscar mais um prato...
Maria José levanta-se e apressadamente vai à cozinha e traz a dita peça de loiça. O ambiente está estranho. Está surreal. É difícil encontrar uma forma de o definir. Não está sinistro, nem tão pouco pesado. Não está agradável, mas também não está de cortar à faca. Paulo acaba por sentar-se na mesa, no lado oposto do outro homem. Henrique percebeu que esticou um pouco a corda, ao forçar um jantar com uma mulher que é comprometida. O problema é que nem o próprio cunhado da mulher está crente que existe uma relação entre o jovem carteiro e a irmã da sua falecida mulher. Maria José procura tranquilizar o ambiente. Torná-lo mais natural, menos problemático e célere quanto baste. Se o jantar terminar mais cedo, mais depressa Henrique terá razões para sair. Mais cedo ela estará de novo sozinha com o seu namorado. Mais facilmente é possível pacificar um inicio de noite bizarro. Os três adultos entendem-se. É certo que paira uma ansiedade em cada um dos presentes. Sem palavras. Cingem-se apenas a estudar as reacções de quem está ao seu redor. Mesmo assim, começam a desfrutar a refeição num silêncio que sendo constrangedor, ajuda cada um dos elementos a pensar para si mesmo no que está a acontecer.
- O salmão está bom, Henrique... - solta Maria José.
- E o seu, Paulo?... Está bom...
- Está perfeito.
O jantar vai prosseguir. É uma certeza. A noite vai cair. Sem sombra de dúvida. Vai demorar um pouco mais do que a inquilina julgava. Inevitavelmente. Henrique irá sair do apartamento. Sem qualquer equívoco. E será logo depois de Maria José recolher as chávenas do café, que tanto gosto têm em servir após os jantares naquela mesa. O serão ainda está reservado para o casal de namorados, de idades distintas, de maturidades diferentes. Talvez haja lugar a uma conversa. Muito possivelmente, Maria José irá procurar sentir de novo o vigor do sexo do seu jovem namorado. Mas não obstante a bonança que a casa serena e graciosa da professora irá viver pelo resto da noite, algo se transformou no ambiente. Apesar de só o confessar a si mesma, uma coisa é inegável. O jantar crivou uma ilação demasiado profunda no coração de Maria José.

quarta-feira

Não sobra ninguém para ouvir

Publicado a 14-05-2008
Quando certos clientes referem que o Espaço Magnólia transforma o dia, há que encarar uma enorme dose de verdade na afirmação. Se sair da boca de algum dos inquilinos do edifício acima do estabelecimento, que é possível assistir a sentimentos genuínos diferentes do que se pode assistir no exterior, não é mentira. Tania sabe que é difícil encontrar outro ponto da cidade onde o pôr-do-sol seja tão fascinante na Primavera, como na mesa onde ela está sentada neste instante. Lúcia, ao manter o olhar encadeado no sol que se esconde por entre dois prédios, sente o mesmo.
- Porque é que temos que estar aqui tanto tempo? - pergunta Lúcia.
- Já te disse!...Não posso chegar a casa tão cedo.
- Mas eu tenho que ir. Preciso de me despachar...
- Se quiseres podes ir...Eu é que tenho que fazer tempo....
- Eu não acredito! É ridículo o que estás a fazer....
- Lúcia...se quiseres podes subir...Mais uns minutos e eu também vou.
- Não! Achas que vou ficar sozinha com o Filipe?
- E porque não?!
- Eu fico aqui contigo....
Ainda há tempo para um lanche. Mais do que um croissant misto com sumo de ananás. Mais do que um croissant com doce de morango e um batido de baunilha. Mais do que a surrealidade que se pode viver no Espaço. Tania e Lúcia querem estar juntas e têm aproveitado todos os momentos possíveis para o concretizar. Mas essa união apaixonante e secreta pode ser gozada no 2º esquerdo. Se neste momento não o fazem é porque de facto Filipe, o namorado de Tania está lá em casa. Provavelmente está a ver um dvd. É possível que tenha trazido o portátil e acabe de sacar um álbum inteiro da banda portuguesa que a sua namorada pediu. Ele tem uma das chaves e Tania pediu-lhe que fosse directo ao apartamento. Ela prometeu que chegaria um pouco depois das sete. Como sempre acontece. Como a rotina de todos os dias coloca Filipe à espera da mulher que o ama à porta do Edifício. Porque ela chega todos os dias úteis do trabalho um pouco depois das sete. Mas hoje não. Tania foi dispensada uma hora do trabalho. E subitamente não sabe o que fazer a esse tempo. Não vai para casa porque não quer mostrar a Filipe que pode chegar mais cedo. As compras já estão todas feitas. E não há nenhum outro sitio para onde ela queira ir. Lúcia passou a ser a melhor hipótese de queimar esse tempo. Depois de lhe ligar, confirmou que a sua amiga e amante estava a caminho de casa. Tania pediu-lhe para esperar por ela no Espaço. Bizarro, talvez. Estranho, sem dúvida. Imaturidade, alguma. O que é certo é que as duas jovens estão sentadas na mesa do estabelecimento a contar os minutos até às sete horas. O lanche está delicioso, o sol vai caindo e elas até gostam de estar juntas. Ainda há tempo para Lúcia apreciar as palavras triviais mas deliciosas de Tania.
- E estou deserta para estar de folga e sair para aquele bar...Tu ias...
- Adorava estar contigo esta noite... - desabafa Lúcia.
- Uhmm...eu também...mas sabes que é dificil. O Filipe vai ficar lá e....
- Desculpa...não quero roubar o vosso tempo...
- Não estás!
- Às vezes sinto que estou...
- Não sejas tonta. Ele nem sequer se queixa.
- Pois....Olha, Tania, já são sete horas. Eu tenho de subir.
- Espera lá...Faltam nove minutos.
- Não sejas tão criança.... Anda embora!
Lúcia levanta-se e vai pagar a Clarisse. Com um sorriso e algumas moedas de troco, ela agradece à funcionária do Espaço e retrocede o passo, em direcção à saida do estabelecimento. Tania não tem outro remédio senão acompanhá-la até à entrada do prédio. Ao aguardar pelo elevador de serviço, as duas jovens trocam o olhar. Na face de Tania há ainda um semblante ansioso. Ela não pretende mesmo chegar a casa antes do tempo. Lúcia entrega-lhe um ar de gozo. Mas assim que a porta do elevador abre, elas entram e a jovem estudante não resiste a pintar um beijo intenso na face de Tania. Talvez por saber que esta noite irá ser vazia, sem a presença cada vez mais frequente da amiga na sua cama. As mãos dela envolvem os ombros da colega e Tania deixa-se levar, arrebatada por tamanha demonstração de desejo. Os lábios carnudos de Tania misturam-se na boca fofinha de Lúcia. Elas são felizes assim, mesmo que o segredo faça parte de um beijo assim. E o elevador do Edifício Magnólia consegue sempre ocultar acções excitantes.
- Fazes-me vir só com um beijo, Lúcia...
- Tonta...
A porta abre-se no segundo andar. Tania retira a chave da mala e prepara-se para introduzi-la na ranhura da porta de entrada. Mas o seu gesto congela e a sua cabeça ergue-se. A sua mão esquerda coloca-se em cima do braço de Lúcia, pedindo para atentar ao que está a ouvir.
- Xiu... Estás a ouvir, Lúcia? - sussurra a jovem, um pouco assustada.
Dentro do 2º esquerdo, na casa que as duas jovens arrendaram quase ao mesmo tempo por motivos pessoais diferentes, passa-se algo que foge ao controlo quer de Lúcia, quer de Tania. Inesperado, talvez. Ousado, provavelmente. Aterrador, certamente. Indecente, demasiado. Filipe tem o portátil em cima da mesa e está ligado à internet. Filipe tem um dvd em exibição na televisão da sala. Filipe tem os joelhos colados ao chão, junto ao sofá e tem a cabeça a pender para a almofada da mobília. As suas mãos agarram duas coxas macias e a sua lingua lambe um rata. O jovem comprometido fá-lo com convicção. Entusiasmado, ele chupa os lábios vaginais molhados ao ritmo dos gemidos da rapariga loira que está sentada no sofá. Ela tem as pernas todas abertas. Sem calças, sem cuecas e só com uma t-shirt vestida, a amante de Filipe leva as mãos suaves à cabeça dele e puxa vigorosamente os cabelos do homem. A boca dele está enterrada no sexo da jovem. Os lábios chupam o clitóris e Filipe está a um passo de fazê-la vir. Neste instante, em que ele se sente completamente deliciado, não lhe passa pela cabeça que está a cometer um acto inusitado, devastador e traiçoeiro à mulher que mora na casa onde ele lambe a rata de Joana. É ela. A amiga colorida de Lúcia, a jovem que apoiou a estudante quando o namorado de Tania se atirou a ela. Joana acaba por ser, ela em si, uma traidora. Deixa-se levar pela sedução do homem e esquece que um dia quis gostar a sério da outra moradora desta casa. Joana geme com o minete de Filipe e abstrai-se do facto de aquele lugar não lhe pertencer. Os seus olhos, que até aqui estavam cerrados com a excitação, abrem-se quando ela deixa de sentir a língua dele no seu intimo. Ela olha para Filipe e percebe que ele parou bruscamente porque algo o chama aterrorizantemente a atenção, por detrás do sofá. Joana vira a cabeça e tudo cede.
- Merda!..... - solta ela.
À entrada da sala, com um ar soturno e inexplicavelmente pálido, as duas moradoras do 2º esquerdo olham incólumes para o sofá da sua casa. Cada uma delas se sente devastadoramente traída. Cada uma delas sente que aquilo não pode estar a acontecer. Talvez Lúcia não duvidasse que Filipe seria capaz de algo assim. Mas ela estava longe de imaginar que Joana pudesse ser uma cruel cabra traidora. Talvez Tania pudesse desconfiar que Joana era um elemento estranho à tranquilidade desta casa. Mas nunca julgou que o seu namorado, declaradamente homofóbico e trocista da relação que Lúcia mantinha com a loira, pudesse traí-la com uma mulher assumidamente amante de mulheres. Lúcia está abismada. Tania sente-se prestes a explodir. É inconcebível que algo assim possa estar a acontecer na vida destes quatro jovens.
- Eu sei o que vais dizer, Tania.... Mas foi ela que veio aqui e que....
- Cala-te!! Por favor, cala-te... Não digas mais nada! Se me vais dizer que foi ela que se atirou a ti, é melhor engolires a merda que queres dizer!
- Tania, ouve o que te digo....Eu sei que isto...Que isto é o que parece....Mas tu sabes que eu amo-te!
- Cala-te! Cala-te!! Cala-te, cala-te, cala-te....Não te quero ouvir, não quero saber...eu não te quero ver!
A jovem não consegue resistir. As lágrimas pulam dos seus olhos e correm pelas maçãs do rosto. Lúcia ainda se mantém impávida. Fixa o olhar em Joana, como se em silêncio a estivesse a chamar todos os nomes possíveis. Ao mesmo tempo, ela pensa como pôde confiar numa rapariga que, vistas as coisas, conhece muito mal. As duas inquilinas aproximam-se do sofá. Há uma enorme tensão no espaço e tudo o que possa acontecer parece imprevisivel.
- A culpa é de facto minha. - intromete-se Joana.
- Tu não digas nada! Ok?! Por favor não digas nada senão eu passo-me!
- Deixa-me dizer, Tania.... Fui eu sim....
- Mas eu não te mandei calar?
- Fui eu que vim aqui. Fui eu que toquei à campainha para vir falar com a Lúcia....O Filipe atendeu e eu pedi para subir. E quando vi que ele estava sozinho.... confesso....deixei-me levar...
- Pára! Pára!...Pelo amor de Deus, já não consigo ouvir a tua voz!....
- Fui eu que me atirei a ele e....
- Amor, eu não consegui resistir...desculpa... - solta Filipe.
- Ainda não te calaste? Eu pedi a tua opinião?
- Joana, por favor...sai... - diz Lúcia, ainda confusa com tudo o que ocorre.
- Desculpa, Lúcia.... eu sei que errei....eu e ele erramos, mas....
- Traíste-me...Eu confiei em ti, Joana.... Trouxe-te aqui para casa. Pus-te à vontade...A Tania confiou em ti.... E depois tu fazes isto...Ainda por cima com ele?! Depois do que se passou?
- O que é que se passou?! - pergunta Tania.
- Ainda não lhe contaste?.... - pergunta Joana ironicamente.
Um silêncio gera-se. Lúcia baixa o olhar. Joana abre um sorriso elucidante. Filipe evade o olhar, algo assustado. Tania olha para cada uma das outras pessoas, tentando perceber o que se está a passar.
- O que é que se passou?! Lúcia? O que é que eu não sei?
- Queres mesmo saber o que se passou? - atira Joana - Gostavas mesmo de saber aquilo que aconteceu e que a Lúcia nunca teve coragem de te contar?
- Joana...por favor, não faças isso...não vai resolver nada...
- Ai vai resolver sim, Lúcia. Garanto-te que vai pôr um termo a isto. Eu mostro-te, Tania.
O ar de surpresa invade os três elementos que assistem agora atentamente aos movimentos de Joana. A loira vai abrir a mala que está pousada na mesa junto ao portátil e retira o telemóvel. Por alguns segundos, ela está concentrada. Carrega nos vários botões do aparelho e navega pelo menu. Volta a abrir-se um sorriso na face de Joana. Lúcia está ansiosa e nem sabe o que esperar. Filipe já nem sequer perspectiva nada. E Tania respira fundo quando a jovem se aproxima dela.
- Como podes ver pela data, isto tem quase dois meses. - diz Joana - Eu estava no quarto dela mas ouvi uns barulhos estranhos fora do quarto. Acho que tu estavas no teu quarto, Tania. Levantei-me e fui ver o que era. É certo que não esperava dar de caras com isto, mas percebi que se passava alguma coisa e decidi filmar.
Joana coloca o telemóvel na mão de Tania e deixou um video, com cerca de dez segundos, a rodar no visor. Com a imagem algo distorcida e desfocada, é possivel visualizar o beijo que Filipe entregou a Lúcia na cozinha, naquela noite de céu nublado. E Tania percebe o que vê. Os seus olhos colam-se à imagem. Com uma duração curta e pouco zoom, ainda assim é inegável que existe um beijo, uma mão no peito da jovem e uma troca de olhares. E estes dez segundos repetem-se. De cada vez que o video chega ao fim, volta a retomar. E Tania assiste várias vezes. Este processo dura quase um minuto. Neste espaço de tempo, algo se transforma nesta casa e por quem a ocupa. Filipe sentencia-se culpado, até porque não esboça qualquer palavra. Joana mantém um ar glorioso. Lúcia procura perceber qual é a reacção da sua amiga a um video que ela própria desconhecia, processando na sua mente as melhores palavras para justificar o que aconteceu há algum tempo. E Tania levanta o olhar. Olha para Joana, depois para Filipe e finalmente para Lúcia.
- És mesmo tu, Lúcia?
- Sim...
- Porque é que não me contaste antes?
- Nunca irias acreditar...Tu gostas demasiado do Filipe para acreditar que ele...Não irias acreditar.
- Ainda não acredito! Não posso acreditar que fui tão ingénua. Eu sempre a pensar que detestavas o Filipe e afinal...
- Tania, eu não gosto do Filipe...Foi ele que me beijou...
- Pois claro...e tu até recusaste!...
- Não consegui... Não estava à espera e....
- Cala-te!... Tu traíste-me!... O que tu querias mesmo era ficar com ele, não era?....E eu estava no quarto?!... Meu Deus, mas quem é que vocês são?
- Estas são as duas pessoas em quem confias, Tania.
- Joana, cala-te, por favor. - reage Lúcia.
- Calem-se todos! Não sei bem o que está a acontecer aqui, mas vocês são... Eu não sei o que vocês são...Vocês traíram-me....Todos.... Eu fiz mal a alguém?
- Tania...não é isso que estás a pensar. Eu não beijei o Filipe...
- Nem tu estavas à espera de ser apanhada por ela, pois não?
- Peço-te, Tania. Ouve-me...Eu não o quis beijar.
- Não? Então porque é que me escondeste?....
Lúcia não tem resposta. Nem ela percebe muito bem como é que pôde deixar um segredo tão frágil manter-se durante tanto tempo. Não entende sequer como o confiou a Joana. Não consegue desvendar como é que Joana se transformou e se revoltou assim, desta forma. O que tem ela a ganhar? O que quer a loira resgatar? Ela? O Filipe? A Tania?! Há uma peça que se perdeu deste puzzle e ninguém a consegue encontrar. O vídeo, por mais inesperado que pareça, compromete muita coisa. E não obstante o facto de ter sido apanhada com o namorado de outra pessoa, é Joana quem parece ficar a rir-se. As lágrimas correm da face de Tania. Lúcia está nervosa e não consegue encontrar uma solução. Filipe sabe que não tem perdão. Procura uma forma de sair dali, sem que o mundo desabe sobre ele. Apesar de alimentar uma fúria dentro de si contra Joana e o vídeo dela, ele tenta calar-se. Nem sequer olha para a sua namorada. Tania dá três passos atrás e procura obter uma resposta que a possa fazer acordar deste pesadelo.
- O que é que vos fiz? Quantas mulheres é que comeste, Filipe? Alguma vez o comeste, Lúcia? Alguma rapidinha no chuveiro?...Bolas, o que é que eu vos fiz?!!.... Joana, eu fiz-te alguma coisa? Ou não te apercebeste que ele tinha uma namorada?...Que raio, eu até engraçava contigo!.... Vocês são loucos.
- Tania...ouve-me...vamos falar...estás muito nervosa e.... - diz Lúcia.
- Não! Eu não quero ouvir mais nada!
- Ouve-me!
- Cala-te! Odeio-vos.... Eu não vos fiz nada!...
A rapariga atraiçoada continua a recuar. Vai-se afastando do centro da sala em direcção ao hall de entrada. Joana consegue manter um ar presunçoso. Pega na sua mala e imediatamente aproxima-se de Tania. Pega no seu telemóvel e coloca-o na mala. Preparada para sair, ela vira-se e procura manter em simultâneo a atenção nos outros três jovens. Liberta um sorriso e cinge os olhos no homem.
- Ah!...E Filipe?!... A Tania anda a comer a Lúcia.
E depois sai. A porta do apartamento encerra e a vingança de Joana é concluida. Premeditada ou não, o que é certo é que a revelação da loira acaba por deixar uma bomba ligada dentro da casa. Lúcia bloqueia a respiração. Tania fecha os olhos. As lágrimas não param. Filipe está boquiaberto. Expira e lança um riso. Um daqueles gestos demonstrativos de que finalmente deu para perceber tudo. A sua namorada mora com uma lésbica. Até ele foi ingénuo em não deduzir que Tania teria que acabar por se envolver com ela. Filipe prepara-se para troçar com a jovem, mas a sua posição ali é muito ténue.
- Sai! - grita Tania - Desaparece da minha casa!
O braço estendido de Tania e o dedo esticado em direcção à porta confirmam a ordem que ela entoou. Filipe volta a rir-se e depois de pegar no portátil, acaba mesmo por sair. Sem mais palavras, sem qualquer outro gesto. Lúcia precipita-se em acalmar a sua amiga, colega e amante. Aproxima-se dela e coloca a mão no ombro de Tania.
- Enganaste-me....
- Tania...Não! Deixa-me explicar-te. Foi ele que....
- Não quero ouvir mais nada!!
- Ouve-me!
- Não!
- Tania, peço-te...estás a ver as coisas ao contrário....ouve-me....
- Enganaste-me!
Tania liberta a sua postura da mão terna de Lúcia. Afasta o corpo e procura tomar uma decisão. Confusa, atraiçoada, com o cérebro a explodir e sufocada com o ar que respira, ela acaba por também se dirigir para a porta de entrada.
- Onde vais, Tania?
- Embora daqui!
- Ouve-me!
E a porta do 2º esquerdo do Edificio Magnolia fecha-se com estrondo. Lúcia fica sozinha no apartamento. Há um silêncio aterrador que invade as paredes e se espalha por todo o espaço. Ela sente-se a sufocar. Procura esboçar uma reacção. Chamar novamente por Tania, ir correr atrás dela, telefonar-lhe, berrar. Qualquer coisa. Mas cada segundo que passa torna tudo demasiado tardio. Lúcia não se sente capaz de chegar à amante. Ao percepcionar que tem que reagir, ela gira sobre si mesma. Respira fundo e procura acalmar-se. Tem a face seca, mas o pescoço humedece com o nervosismo. Só agora é que ela encaixa a ideia de que a casa está realmente vazia. Dirige-se à janela da sala, abre o vidro e olha para baixo. Na rua, Tania já saiu e entra pela estrada, aguardando por um táxi que passe. Como um toque do destino, o transporte chegou rapidamente. Tania entra e deixa de estar ao alcance de Lúcia. Ela até vai tentar-lhe ligar vezes sem conta para o telemóvel, até Tania desligar o telefone. Ela vai pensar numa solução e acalmar. Ela vai esperar até de manhã que Tania regresse a casa e desejar que uma conversa possa esclarecer tudo. Mas Lúcia está ciente. Sabe que há pouco lugar para perdão. Nem ela sabe onde é que o perdão mora neste caso. Algo irá surgir como solução para esta grande confusão que surgiu. Ela não sabe qual, nem quando vai ser posta em prática, nem se irá ser resolvido seja o que fôr. Mas até lá, Lúcia vai-se fechar no quarto toda a noite, numa casa vazia até de si mesma e vai libertar todas as lágrimas até secar.

terça-feira

Seduzir também é ouvir

Publicado a 13-05-08
A noite está reservada. Programada. Delineada ao pormenor. Com pontas soltas para a imaginação e irreverência. Misturada num controlo experiente de cada momento. Embebida de vinho branco requintado. Em tons de uma iluminação ambiente sensual mas também acolhedora. Decorada com uma música de fundo extremamente clássica, extremamente suave. O cliente de Ana já entrou no apartamento da acompanhante, ciente de que estes momentos vão ser únicos. João é um homem paciente, ponderado, calculista, mas muito intimo. A sua vida conta quarenta e muitos anos. Um homem que quase se podia confundir como pai dela. Casado. Comprometido há demasiados anos. Filhos. Adolescentes numa fase confusa. Profissional. Bem sucedido numa vida que foi escolhendo. João é um homem humano. O cliente que Ana gosta de ter como regular. A pessoa que ela gosta de acompanhar, mimar, ceder aos caprichos que ele pede. Uma noite assim não custa a passar. A presença dele tem tendência a proporcionar-lhe momentos agradáveis, quase sublimes, muitas vezes excitantes. Com aquele homem, Ana não se sente prostituída.
- Já ansiava por te poder saborear....
Ana liberta o desabafo. Qualquer outro homem que contratasse os serviços de uma acompanhante de luxo iria deduzir que a jovem está apenas a cumprir o seu papel, a ser profissional. Mas João sabe que as palavras de Ana são sinceras. Fazem parte de um conhecimento mútuo que existe desde os tempos em que ela trabalhava para o clube privado. Pelo menos uma vez por mês, o homem procura averiguar a disponibilidade da jovem, tentando tornar essa marcação um momento descontraído. E só muito raramente é que Ana recusa um pedido de João. Por vezes, nem é preciso ele pedir. Ela conhece-o. Estar ajoelhada no tapete da sala diante dele, com as mãos no fecho das calças masculinas, não é uma obrigação para a acompanhante. É mesmo um desejo. Estar completamente nua, perfumada e esbelta é algo que a faz sentir-se bem na presença do homem. Se isso acontece três minutos depois dele ter tocado à campainha é porque existe desejo. Se a máscara nocturna dela não implica uma única peça de roupa no seu corpo é porque Ana gosta de o surpreender. E se ela se apressa em chupá-lo, é porque tal sentimento de posse pelo sexo dele é inevitável.
- Andei a tarde toda a pensar em tê-lo nas mãos...
Há uma demonstração clara de desejo na expressão de Ana. O seu sorriso impaciente mas resplandecente. O olhar brilhante e revelador. Ana continua a querer mostrar porque é que tantos homens desejam ser chupados por esta mulher. Ela não procura fazer sexo oral ao companheiro apenas para agradar. Não se esforça por abocanhar o pénis de um homem por uma mera questão profissional. Ela efectivamente diverte-se com isso. Esse é o segredo para que ela chupe tão bem. Esse é o truque para que os seus broches sejam tão ambicionados pelos clientes. Depois de baixar as calças, ela segura o sexo de João com uma mão, convictamente. Com a certeza de que vai ser delicioso provar a ponta, navegar a língua na pele dele, encher a sua boca com a carne voluptuosa do homem. Ele vai adorar e possivelmente vir-se com tamanha demonstração de prazer. Ela esfrega o sexo e prepara-se para o colocar na boca. O que depois fará com ele, será a sua tesão que irá esclarecer.
- Desculpa, Ana.... Não me leves a mal...Mas não quero... hoje apetecia-me falar contigo.
- Uhm?!....Claro!....Claro que sim, João....Também pode ser...Tu sabes que sou boa ouvinte.
Ana larga o pénis da sua mão. A carne já estava tesa. A boca dela já fervilhava. Mas dentro de todo o controlo e expectativa que a acompanhante pode ter de uma noite profissional, o cliente tem que ter a mínima sensação de posse. E se um dos seus clientes predilectos pede para parar, ela obedece. Sem contemplações. Antes de se erguer, ela retira os sapatos, as calças e os boxers do homem. Apenas e só para ele se sentir mais confortável. Depois, ela levanta-se.
- O que se passa, então?.... Alguma coisa te atormenta? - pergunta ela atenciosamente.
- Tu sabes o que é...
- O casamento...
- Talvez o problema seja mesmo eu... Mas na verdade, ela é que acaba por nunca estar presente. E são viagens que demoram dias, e são conferências que lhe ocupam noites e são as amigas que têm problemas conjugais....
- Mas afinal....tu sabes sempre que não é isso...
- Ela tem um amante... eu sei.... Mas por mais que eu não possa argumentar contra isso porque tenho telhados de vidro, é uma coisa que me deixa sempre a pensar.
Ana já está sentada na poltrona preta que tem na sala. Ainda nua, ela senta-se e apresenta a excentricidade ao homem que pretende afinal desabafar. João está preocupado com aquilo que lhe atormenta a consciência. Mas não nega que é deslumbrante ver a postura de Ana. Confiante, atenciosa, firme e excitante.
- Ana, a sério...lamento...eu sei que não guardas uma noite só para ouvir os desabafos de um cliente, mas...
- João... sou tua amiga... somos amigos... Melhor do que ninguém, tu sabes que eu não sou só uma foda...
- És uma óptima ouvinte... És praticamente a minha terapeuta...
- Tu é que és o psicólogo....
Há risos. Há empatia. Olhares trocados e desejos mantidos em silêncio. Ana olha para o homem, já sentado no sofá, e não desvia a atenção do sexo entesado dele. Nem ela pode negar que seria divertido dar-lhe prazer. João vai relaxando no sofá. A sua mente tranquiliza assim que se sente à vontade para libertar algumas incógnitas na sua mente. Afinal, ele é que é mesmo formado em psicologia, ganha a vida com isso e um sumptuoso estatuto social. Irónico ou não, a sua acompanhante tem a capacidade de desenvolver uma terapia surreal nos seus clientes. E como homem experiente no estudo da mente e dos seus recalcamentos, ele entende isso como nenhum outra pessoa que usufrui do 3º direito do Edifício Magnolia. A posição assombrosa de Ana na poltrona funciona como um retiro à alma do homem. Linda, com os seios firmes, macios e rijos. Os membros superiores dela estendem-se pelos braços da peça de mobiliário.
- E depois são os meus filhos.... Andam com as hormonas aos saltos e....não sei...tenho medo que eles percebam tudo e sinto que lhes posso dar um péssimo exemplo...
- Como assim?...
- Achas que eles iam gostar de saber que o pai fode outras mulheres?
- Não me estás a foder....
- Ana...tu percebes...
- Achas que eu me sinto à vontade com o facto de os meus amigos me verem como puta?
- Não deve ser fácil...
- São escolhas, João... Não estou a defender que tu e a tua mulher fazem o que está certo... E nem sou eu que posso julgar isso. Mas as coisas não podem ser tão lineares como andares a foder outras mulheres...
- Sentes que és uma puta?... Desculpa...eu sei que não gostas de perguntas pessoais....
- Sim, sinto que o sou. Sei o que sou. Nunca o neguei. Mas recuso a ideia de que o faço por dinheiro ou porque é uma solução fácil.
- Certamente...Tens sempre outras alternativas. És inteligente e cheia de virtudes. Alguns defeitos por certo. Mas falta de auto-estima não será por certo.
Por mais maturidade e confiança que pode ter na sua pessoa, Ana não pode deixar de corar com um elogio intenso, sentido e translúcido. Ela baixa o queixo e coloca os dedos sobre as coxas. As suas pernas abrem-se vagarosamente, deixando descobrir o sexo rapado e pálido. Denotam-se os lábios ligeiramente inchados, mas Ana mantém a postura.
- Admiro-te pelo que fazes.... A sério!... Não só porque me consegues dar um prazer imenso. Não só porque como acompanhante és uma fantástica conselheira, até um terapeuta com eu... E não te posso negar que me excita só de saber que me ouves....
- Estás excitado porque estou de pernas abertas....
- Porque estás aqui...e uma prostituta não faz isso. Às vezes duvida verdadeiramente que sejas acompanhante. Pelo menos que sejas minha acompanhante. Sinto-me bem aqui, gosto de te telefonar e olhar para ti, ver que estás feliz...
- Não te estás a apaixonar por mim, pois não?
- Nada disso... Seria um prazer, conseguir amar-te. Mas sei que é difícil. Sei que nem deves procurar amar, mas que és apaixonada... E isso quase que me faz inspirar.
- E entesar...
O pénis dele ganha vigor. Nem João percepciona tal facto, quanto mais controlá-lo. Porque Ana continua a fazer o seu papel. O cliente não lhe pede para ter relações sexuais. Nem sequer fez questão de exigir um fetiche que substituísse uma cópula. Ela simplesmente ouve o homem que a contratou, o que em si também faz parte da sua ocupação. Mas Ana faz mais do que isso. Torna uma conversa complexa em algo intrinsecamente excitante.
- Eu sei que um dia vais encontrar outra ocupação. Inevitavelmente vais apaixonar-te. Quando menos o esperares. E sei que vai ser difícil para ti libertares desta vida que tens. Porque eu entendo que gostes disto. É vibrante, é cheio de adrenalina, é um poder que tens nas mãos. É quase um dom.... Mas um dia vais querer ter uma família.
- E como se conta a uma família que a mãe foi uma....
- É difícil... Talvez impossível... Mas sabes, acho que te vais safar melhor do que eu. Os meus filhos irão ver-me como proxeneta, possivelmente. E nem sequer quero pensar o que acharão da mãe. Mas tu.... eu sei que irá correr bem... De uma maneira ou de outra, não importa o que a vida fez de ti, serás uma mulher muito madura. Nem que seja por ouvir homens frustrados como eu.
- Quem é que está a ter a consulta aqui?
A conversa continua. Perde-se no tempo e desenvolve-se por entre dois copos de vinho branco. João não bebe mais porque tem que conduzir, mas Ana deixa-se levar. Reflecte em cada palavra que vê sair da boca do cliente e que se incorpora no seu ouvido. Ao mesmo tempo que mantém a postura no seu corpo desnudado, sensual e escaldante, ela vagueia naquilo que a sua mente se perde. Palavras de um homem tão sensato fazem-na pensar na sua condição. Ela adora ser acompanhante, é um facto. Mas desde o primeiro dia em que disse a si mesma que queria fazer aquilo, Ana sempre teve a certeza que aquilo não irá durar para a eternidade. Talvez seja uma grande paixão masculina que a leve. Uma paixão feminina nunca está posta de parte. É possível que a exigência da sua idade a possa fazer abdicar. Ou uma má experiência com um cliente a possa obrigar a si mesma a desistir e pensar no seu amor-próprio. Quem sabe se uma proposta fascinante no mundo da representação ou num projecto do qual ela nem sequer consegue sonhar, não se coloque à frente de qualquer perspectiva. Ela vive apaixonada pela sua capacidade profissional neste ramo excêntrico e complexo. Mas todos os dias, a sua máscara diária confronta-se com uma sugestão interior que a pode fazer renunciar àquilo que ela sabe fazer melhor que ninguém. E por entre dois goles de vinho, Ana pensa no seu vizinho. É inegável que ele mexe com a jovem. Que a obriga a pensar. Que um telefonema dele a entusiasma mais do que um envelope branco. Que deixá-lo penetrar em si é uma adrenalina mais intensa do que procurar vir-se com um cliente. Que a frieza dele é incomparavelmente mais desafiante do que a distância dos homens e as mulheres que a contratam. Mas a pessoa que mora ao seu lado é crua. É calculista e egocêntrica. Uma boa foda, uma paixão inegável, mas não seria homem para casar, formar família, partilhar casa, ter filhos e envelhecer ternamente. Nem tão pouco é homem que a faça abdicar disto que ela tem. Ana é acompanhante e neste momento o cliente que a requereu julga que ela está a ouvir o seu dilema matrimonial.
- Eu sei que um dia vou ter coragem para me divorciar, para enfrentar os meus filhos e virar a minha vida ao contrário.
- Sem querer influenciar nada, eu tenho a certeza que tens uma coragem inolvidável, João.
- Com esse corpo assim, só me podes estar a influenciar... Já é tarde, Ana....
João ergue-se do sofá. Veste as calças e vai atando os sapatos. Ana mantém-se na mesma posição. O seu corpo expira sensualidade. Transborda um calor ousado. Apenas e só pela mera visão que proporciona. O pescoço humedece, tal como o vale dos seios. As mamas mantém a firmeza que realça as formas arredondadas. As pernas continuam abertas e é perceptível que a sua vagina guarda uma louca sensação de excitação. E o seu sorriso é virtuoso. Comunica com a sua companhia e dá-lhe a entender que a noite, apesar de incompleta, está a ser fantástica. João está pronto. É nesse instante que Ana se levanta e encontra a melhor forma para concluir a noite. Pousa o copo e acompanha o homem até à porta.
- Eu sei que a noite não foi como tinhas previsto. - diz ele.
- Foi fantástica. Sabe sempre bem ouvir-te.
- És divina, Ana. Por mim, podes ser sempre acompanhante, mas serás sempre uma boa amiga.
- Resolve isso com os teus filhos... Só te podes sentir bem contigo mesmo.
João abre a porta, mas antes de sair, retira o tradicional envelope branco do bolso do casaco e cola-o ao peito desnudado da jovem. Depois entrega-lhe um beijo terno na maçã do rosto. Ana respira fundo, sorri para ele e dá-lhe um beijo saboroso nos lábios. Não é agradecimento, mas é devoção. É paixão mas não é amor.

segunda-feira

Ouvir a crua verdade

Publicado a 12-05-08
Está calor no Espaço Magnolia. Está demasiado calor para a época primaveril, para o ar sereno que vive na rua e que tem caracterizado os últimos dias na cidade. Está calor. E o Espaço Magnolia torna-se um lugar sufocante a qualquer pessoa que ultrapasse a porta de entrada. Cristina vagueia o seu passo e não consegue deixar de chamar a atenção quando entra no estabelecimento. Os seus óculos escuros ocupam-lhe parte da face e tornam o seu olhar oculto. O seu cabelo escuro preso na nuca incorpora-lhe um ar sensual mas distante. A roupa clara que lhe ajusta ao corpo é presunçosa. Cristina sabe porque é que entra ali e porque é que todos olham para si. E a mulher só pára quando atenta à voz que pretende ouvir.
- Onde é que vais assim tão confiante?
Rafael está sentado numa das mesas do Espaço. Acaba de tomar o seu lanche predilecto, mais uma das especialidades da casa. Ele levanta o olhar e consegue imobilizar o corpo da sua ainda amante. Cola um sorriso presunçoso, como que a convidar a mulher a sentar-se ali, como que se estivesse ciente de que ela se vai sentar. Cristina desvia a cabeça para mesa e lança o olhar, mas sem tirar os óculos escuros. Cristina gira os pés e aproxima-se da mesa. Impávida e serena, Cristina senta-se.
- Eu queria um café, se faz favor.
Depois de fazer o pedido de uma forma ponderada a Vasco, Cristina manteve o olhar fixo em Rafael. O instrutor admira toda a pose da mulher. A maneira como ela entrou, o jeito como se veste, a postura que mantém e tudo o que por detrás daquela máscara se possa esconder.
- Combinámos alguma coisa?
- Temos necessariamente que ter combinado?
- Não sei, para apareceres subitamente aqui...
- O Espaço é um sitio fantástico. É frequentado por imensas pessoas. Acho que também tenho o direito de estar aqui.
- Talvez tenhas razão. Mas não me parece que tenhas surgido aqui só porque te apeteceu vires tomar café.
- Vi que estavas aqui dentro e quis vir falar contigo.
- Estou a ouvir-te.
E denota-se de facto um incremento de atenção na postura de Rafael. Ele aguarda que a mulher lhe faça uma proposta irrecusável para subir ao 3º esquerdo e que ambos possam extravasar o desejo que ambos nutrem sexualmente. Carnal. Sexo. Nada mais. Ele está apenas ansioso para ver a forma como ela o irá pedir. Mas Cristina está silenciosa. Recebe o café que Vasco acaba de trazer. Agradece. Gira a chávena no pires. Pega no pacote de açúcar, repara no motivo publicitário que se insere no papel. Inspira. Abre o pacote. Despeja o açúcar. Pega na colher e expira. Mexe o liquido e olha para o café, procurando perceber qual o gosto que ele pode ter. Rafael continua a aguardar. Deduz que a mulher está com algum receio da forma como deve fazer o pedido. Mas entre ele nunca houve formalismos. O homem abre o sorriso e prepara-se para incentivá-la a pedir. Cristina levanta a cabeça e decide-se, antes mesmo de tocar com os lábios na borda da chávena.
- Andas a comer a prostituta?
Cai o semblante de Rafael. Corre um turbilhão dentro da sua mente. O seu olhar evade-se. E literalmente, depois de ter ouvido, ele não sabe exactamente como responder.
- Vi-a sair daqui e não resisti perguntar-te. E tens mesmo ar de quem acabou de foder com ela. Como sou fantástica em deduções, achei que só precisava da tua confirmação.
- O que tens tu a ver com isso?
- Entrego-me a ti como poucas mulheres o fazem. Sou casada e tenho um amante que me coloca num trapézio sem rede. Evito meter-me com homens que não conheço, ou homens que fodem com qualquer tarada que aí apareça.
- És uma santa!
- Não ando a foder com putas!
- Ela é minha vizinha. É uma pessoa em quem confio. É uma mulher que os vizinhos adoram.
- Não duvido!
- Ela é honesta, ela é limpa, ela não é da tua conta.
- É uma puta!
Rafael cansa-se de procurar responder. Respira fundo e retira a carteira do bolso. Abre o sitio onde guarda o dinheiro e levanta o olhar para Vasco. Em nenhum destes instantes ele voltou a olhar para Cristina. É uma questão de aguardar pelo funcionário e Rafael vai sair daquela mesa. De uma maneira que ele não ousava imaginar, aquela conversa está a incomodá-lo.
- Tens cá uma lata... Que direito tens tu de vir aqui e questionar-me sobre as minhas amantes? Sempre soubeste com quem ando, com quem me meto, com quem não me quero meter, com quem tu própria queres que eu ande... Devo-te alguma coisa, Cristina? Ela deve-te alguma coisa? Queres ir-lhe dizer pessoalmente que ela é uma puta?
- Se pudesse, talvez o fizesse.
- Tiveste essa oportunidade... Porque não entraste aqui antes? Ou achas que não te vi a espreitar antes dela sair?.... O que tens tu a ver se eu ando a comer uma acompanhante?
- Tenho a ver que ando metido contigo. Se uma mulher que fode com qualquer otário por dinheiro, anda a meter a rata no mesmo sitio onde eu ponho, então isso tem a ver comigo.
- Fala baixo...
- Estás com medo? Tens receio que saibam que andas a comê-la?
- Não! Não tenho sequer problemas com quem me envolvo ou não.
- Cabrão...
O olhar de Cristina evade-se. Posiciona a cabeça para se fixar no que acontece fora do estabelecimento. Mas ela quer ouvi-lo. A mulher precisa de ouvir algo reconfortante da boca de Rafael. Algo que lhe diga que foi só uma foda. Algo que lhe transmita que ele não está apaixonada por uma mulher que ele considera acompanhante e Cristina entende como uma vulgar prostituta. Algo que no fundo lhe possa dizer que ele não está demasiado encantado com uma mulher fantástica. Porque nem Cristina consegue negar que a vizinha de Rafael é fascinante e irresistível. Mas o instrutor silencia. Não parece ter gostado do tom com que foi confrontado, por uma mulher que é apenas e só sua amante. Uma mulher que trai o seu próprio marido para estar consigo. Ele não gostou da forma como tudo o que ouve da voz dela parece uma ameaça. Após alguns segundos retraído, agindo defensivamente, procurando perceber o verdadeiro alcance das palavras de Cristina, ele volta a vestir a sua pele preferida.
- Sabes qual é o teu problema?...É seres presunçoso demais...É usares esse sorriso irritante até cansar.
- Tu sempre gostaste...ou não?
Cristina sente-se inconformada. Sente que não consegue ter uma resposta concreta para lhe dar. Sente-se desarmada perante o carácter persuasivo do seu amante. O mesmo amante que ela procura quando sente necessidade de um momento intenso, apaixonante, mas descomprometido. Mas Cristina não se conhece como uma mulher derrotada. Acaba de tomar o café e levanta os óculos escuros. Coloca-os acima da testa e desvenda o seu olhar a Rafael. São olhos intensos, inchados mas ainda assim pequenos. Guardam tudo o que invade a sua alma. Mas o que realmente interessa hoje em Cristina não é o que o seu olhar pode revelar. A sua boca hoje não se vai calar.
- Sim...Eu sempre gostei, Rafael. Sabes porquê?... Porque fui ingénua em viciar-me nesse sorriso. Fui inconsciente em achar que esse teu jeito demonstrava que conseguias fazer uma mulher feliz.
- Não te faço feliz?
- Vais fazendo...Mas uma mulher precisa de se sentir feliz com o homem que ama todos os dias, a toda a hora.
- E?!...
- Tu nunca foste o homem que me poderia fazer feliz a toda a hora, Neves...
- Nem nunca foi essa a minha pretensão...
- Pois, talvez por isso é que me casei novamente com outra pessoa em vez de te procurar a ti.... Felizmente...
- Vens aqui para as fodas e o outro que te dê a felicidade absoluta que pretendes...
- Achas mesmo que algum dia conseguirás fazer alguma mulher feliz?...
- Mais uma vez, isso não é da tua conta....Mas de qualquer maneira, nunca disse que o queria fazer...Nunca o procurei fazer... Pelo menos contigo.
- Eu sei, Neves...Eu sei...
Vasco vem buscar finalmente o dinheiro com que Rafael pretende pagar o seu lanche, o lanche da sua vizinha e o café de Cristina. Por uns momentos, hesita em levantar-se. Respira fundo e faz força nos joelhos.
- Sabes que um dia apaixonei-me por esse teu sorriso? Por essa tua forma fria de chegares a mim. Pela frieza com que me despias, com que entravas em mim. E achava mesmo que te podia mudar.
- Nunca pedi a ninguém para me mudar. Nem sequer pedi que gostassem de mim assim.
- Eu gostei. Gostava de saber que eras diferente. Que eras directo. Que me desejavas pela maneira como eu me fazia a ti. Que era uma questão de tempo até deixares de ser distante. Que mais cedo ou mais tarde irias pedir-me para ficar para sempre. Que só não me beijavas por receio de te apaixonares... Estava enganada. És mesmo assim. Fodes bem... Não duvides que fodes bem. Podes-te vangloriar disso. Nem nunca sequer percebi muito bem como é possível vir-me contigo.
- Do que te queixas então?
- Não me estou a queixar. Estou apenas a confessar-te que nunca nenhum homem me possuiu assim. Nem mesmo aqueles que me amaram e que ainda me amam. A culpa é mesmo minha. Sou eu que morro de tesão de querer essa frieza, essa distância... E sei que é isso que as outras mulheres procuram em ti. Até essa...essa acompanhante. Mas sei que todas elas pensam o mesmo que eu.
- E o que pensas tu?
- És um cabrão. E talvez todas as mulheres que se entregam a ti gostem de se sentir como a tua vizinha o é. Talvez até eu goste de me sentir puta nos teus braços.
- Sabes que és mais do que isso.
- Sim...Sou uma puta casada. Duas vezes. Que se excita quando me fazes sentir assim. Quando me fazes sentir diferente de muitas mulheres que nem sequer têm coragem de se deixar levar por um homem assim. Quando falas comigo ao telefone e parece que me enfeitiças. A tua voz...as tuas palavras. Tens essa carinha laroca e parece que fazes de propósito para bajular o teu próprio corpo. Mesmo que quisesse, é impossível ficar indiferente a isso. Quando tomas conta do meu corpo, parece que nunca mais vou ser a mesma.
- Gosto de te fazer sentir especial...
- Oh, sim...Tu fazes-me sentir especial. De cada vez que saio da porta da tua casa, sinto-me especialmente abandonada.
- Desculpa, não é assim que te quero fazer sentir.
- Mas é assim que me sinto...E isso excita-me... Por mais que me custe, por mais que me possa até custar um casamento, isso é excitantemente viciante.
- Não sei o que te dizer...
Agora Rafael não se levanta. Agora Rafael baixa o olhar e aguarda que a voz de Cristina diga algo aceitável. Algo que gere um entendimento plausível, que permite que ele saia do Espaço sem sentir remorsos.
- Não estou apaixonada por ti, Neves... Mas gostava...Melhor, um dia sonhei que poderias ser meu. Hoje?...Hoje gosto de foder contigo. Adoro. Se a tua casa estiver livre e se quiseres, adoraria que me possuísses no teu sofá. Que me dissesses que me desejas. Que as tuas mãos levassem o meu corpo para onde só tu me sabes levar. Que me fizesses vir como há já algum tempo não me venho....Sim, se quiseres sou assim tua.... Mas descansa...Não estou apaixonada por ti. Nem eu, nem nenhuma mulher vai morrer de amores por ti enquanto agires dessa forma. Nem sequer a tua acompanhante.
- Cristina.... Só quero que saibas que.... Ela é de confiança. Ela pode fazer o que faz. Eu posso nem sequer concordar com isso. Até te posso admitir que aquela mulher me fascina. Mas por favor, não a trates como puta.
- Tudo bem, como queiras...Só não quero que estragues esta merda toda.
- Eu ainda sei que és especial para mim.
A mão de Rafael procura com algum desnorte a mão leve de Cristina que se coloca sobre a mesa. E no mesmo instante que ele aperta a mão da mulher, ela percebe que o café está pago. Percebe que pouco mais há a dizer. Percebe que aquele talvez nem seja o momento adequado para subir ao apartamento do seu amante. Percebe que o circulo vicioso irá continuar. Ela liberta a mão e volta a baixar os óculos escuros. Levanta-se da cadeira e volta a transmitir-lhe algo num tom de voz suave mas intimidante.
- Ah, é verdade...a minha sobrinha aguarda há uma semana pelo teu telefonema.
Cristina sai como do Espaço Magnolia como entrou. Confiante, distante, silenciosa, com todos os olhares fixos no seu caminhar excêntrico. Talvez o objectivo dela quando se dirigiu à rua do Edifício não fosse este. Possivelmente o seu intuito era a esta hora estar despida diante do seu amante. Mas o seu corpo ainda vibra com o facto de ter deixado Rafael preso à cadeira, preso às palavras emitidas pela voz daquela mulher.