sexta-feira

Sobreposição inversa

Publicado a 04-07-08
A noite pertence à intimidade. Entrega-se ao desejo. Chama a paixão. Esconde a traição. A cama do casal do 1º esquerdo pinta-se de um ambiente intenso, desenhado ao pormenor para carregar uma aura apaixonante. As cortinas estão corridas, o abat-jour espalha uma luz creme sóbria, os filhos não estão em casa e não existem amantes que possam ligar a qualquer um dos inquilinos a esta hora. A mão de Helena segura o sexo entesado do seu marido. Deitada na cama nua, com os pés virados para o topo da cama, ela mantém o olhar fixo no objecto de desejo que lhe pertence, percebendo a ansiedade do homem. Rodrigo coloca um ar de entusiasmo pelos gestos que a mulher lhe oferece. Já passou por beijos meigos na sala, pela mão carinhosa a envolver-lhe o corpo, pelo convite ousado que ela lhe propôs. Depois de olhar para o corpo despido da esposa, com curvas sedutoras, com a pele hidratada, com os seios firmes, Rodrigo atinge o auge da sua tesão, ao sentir o seu pénis crescer entre os dedos de Helena. Deitado com a parte superior das costas sobre a sua almofada, ele tem os pés virados para o fundo da cama.
- Estou preparado.
- Eu também...
- Não páras até eu parar...
- Veremos se aguentas...
Com a mão fixa no sexo do marido, Helena arrasta o corpo para cima dele. Sempre a agarrar o pénis, ela abre as pernas e coloca os joelhos colaterais ao tronco do homem. Os dedos esfregam suavemente a picha de Rodrigo e o rabo da mulher está defronte da face dele. A palma da mão absorve o calor do pau entesado do inquilino e as mamas de Helena roçam junto ao umbigo dele. O homem aprecia o que surge diante do seu olhar. Faz algum tempo que a rata da sua mulher não fica tão próxima da sua boca. Parece uma redescoberta. Parece um assombramento que se evidencia no entusiasmo que a sua face agora revela. Um sexo bonito, com os lábios vaginais rosados, ligeiramente carnudos e salientes. O clitóris está escondido, mas o sorriso dele demonstra que ainda sabe como o descobrir. As mãos dele apertam as nádegas de Helena, redondas, suaves, maduras. Os polegares tocam nas virilhas, os dedo médios fincam-se com mais força na carne do rabo feminino, os mindinhos quase rasgam a pele dela e a força dos dez dedos puxam o traseiro da mulher um pouco mais para cima. Mesmo colado à boca dele. Rodrigo está numa posição entre estar deitado e estar sentado. O corpo de Helena fica assim mais levantado. Ao sentir a ponta do nariz dela roçar nos lábios vaginais, ela inspira fundo e entende que a excitação só começou realmente agora. A posição é sublime. Os dois corpos envolvem-se mutuamente, numa posição inversa. Helena gesticula a sua mão para cima e para baixo, com uma ligeira pressão, no ponto que ela entende ser o certo. O polegar toca no dedo médio e a palma dão mão roça em grande parte do membro teso e palpitante. Ela esfrega o sexo do seu marido e toca agora com a língua na ponta do órgão. As unhas das mãos dele cerram um pouco mais na carne das nádegas da mulher. Tanto o buraco anal, como a vagina de Helena dilatam um pouco mais. Tornam-se vulneráveis à sede dele. A boca de Rodrigo absorve parte da rata da mulher e enterra-se por entre os lábios vaginais. Ele sabe onde encontrar o clitóris, mas prefere enterrar a sua língua um pouco mais profundamente. Os lábios de Helena latejam. Incorporam o desejo de querer roçar a sua pele ligeiramente seca na volúpia do pénis do seu marido. Os seus dedos assumem agora um papel diferente. Tanto o polegar como o indicador e o médio em conjunto procuram empurrar o sexo para dentro da sua boca. Ligeiramente, carinhosamente, suavemente. A sua lingua encarrega-se de receber a tesão carnuda no seu interior e agraciá-la com caricias molhadas. Rodrigo saboreia o denso conforto vaginal, assim que a sua lingua efectua movimentos dinâmicos. Ele sente no imediato o aroma exalado pelos lábios vaginais que esfregam em toda a envolvência da sua boca. Porque o sexo da sua esposa começa a estar frenético, processando acções instintivas que demonstram excitação. Até os músculos das nádegas acusam o toque preciso da boca do amante. Helena chupa suavemente, ainda que aumentando progressivamente o ritmo dos movimentos. A boca que se torna um êmbolo, umas vezes cheia, outras vezes vazia. Os lábios carnudos que sugam vertiginosamente a energia do sexo. O polegar que faz um pouco mais força nos testículos dele. Os outros dedos que progridem a velocidade gesticular. E tudo isto é uma actividade onde os vários elementos em funcionamento transformam actos isolados como um broche e um minete numa singular e poderosa sobreposição de desejo oral em posições inversas.
Fellatio. Na forma como ela devora o pénis. Como morde com os lábios toda a excitação da carne do amante. No jeito com que a sua língua brinca dentro da boca com o orifício de onde se libertará o prazer que ela também anseia. Na atitude progressiva que determina a paixão com que ela chupa. A sua cabeça movimenta-se em círculos, procurando obter mais deleite para o parceiro. Os cabelos roça junto às coxas masculinas. E a mão que apoia todo o peso corporal dela tem ciúmes da mão que aperta e esfrega com vigor as bolas do homem. É um broche, sim senhora.
Cunnilingus. Quando ele perverte a sua língua por toda a extensão da racha erógena. De cada vez que os lábios chupam os papos latejantes por entre as pernas. Assim que os dedos indicadores roçam nas margens anais, adicionando uma dose extravagante de excitação à mulher. É nesse instante que ele começa a alcançar o seu objectivo. O pequeno apêndice nervoso, molhado e ruborizado, palpitante e sensível, irrompe agora dos lábios vaginais e apresenta-se ao exterior na ânsia de também ele conhecer o poder do toque dos lábios, da língua e no final, se possível dos dentes que farão explodir o prazer que ele irá transmitir. É um minete, sim senhor.
Dar e receber. Porque tudo isto não é mais do que uma partilha. Tem pequenos detalhes que acrescentam algo mais ao que se concebe aqui. Tem desejo a percorrer as veias que por sua vez alimentam o calor exalado pelos corpos. Tem paixão tatuada nas mãos que ditam o ritmo imposto. Tem sede e fome na gula com que as bocas comem. Tem fervor, quando se vê o corpo dela movimentar, o ventre a mexer-se para a frente e para trás, incitando ele a lamber mais e ela a chupar com mais força. Tem tesão sublime, quando as mamas dela roçam na barriga dele provocando um curto circuito no controle de ambos. Mas partindo do principio que todos estes detalhes são inerentes a uma envolvência desta magnitude, Helena e Rodrigo limitam-se a partilhar-se mutuamente. Como se necessitassem de entregar ao parceiro o desejo que constantemente transborda para parceiros adúlteros. Como um pacto que a noite trouxe para que eles se redimissem em silêncio. Helena e Rodrigo têm uma vida sexual activa, algumas vezes irreverente. Mas há a tendência de faltar sempre algo excêntrico que alimente o vulcão que vive dentro de cada um deles. Há uma visível falta de espontaneidade e prioridade em certos momentos na entrega de prazer magnânimo à pessoa que um dia juraram amar para sempre. E este pacto é uma atitude instintiva de ambos em não afastar o desejo sexual que é necessário haver num casamento. Esta partilha é a imagem que eles querem espelhar numa única sobreposição.
O prazer que se reflecte. Aquilo que Rodrigo entrega à rata de Helena, é aquilo que a sua esposa recebe e lhe retribui de forma mais intensa. O clitóris incha e a língua de Rodrigo encharca-se com a fonte que brota dela. Se ele saboreia os fluídos dela, a sua boca quer mais, pede mais. Se ela delira com o prazer que se incendeia, a sua boca dá mais, exige mais. Ao chupar com vigor a picha do marido, apertando os testículos com intensidade, Helena pressente o sexo dele a jorrar. Agora, que ambos alcançaram em uníssono o reflexo do desejo, a dupla imagem que eles espelham torna-se mais incisiva. Atinge um foco que só é possível porque ambas as imagens se sobrepuseram. Numa forma invertida, numa prática de sexo oral soberba, Helena e Rodrigo conseguem focar o prazer. E nenhum deles desperdiça uma gota do néctar que deleita derradeiramente a sua sede. Porque eles querem entregar-se, demonstrá-lo e recebê-lo. Assim que a energia de um esgota as forças do outro, há uma rendição. Podem chamar a isso um orgasmo simultâneo. No caso de Helena e Rodrigo é uma conquista vingativa. O prazer que podem oferecer a qualquer outro amante jamais poderá ser tão genuíno como o que eles entregam ao cônjuge. E este é o sentimento de pertença que ambos escondem dentro de si. Abraça-se. Os membros superiores de Helena envolvem as coxas do seu marido e os braços de Rodrigo rodeiam a cintura da mulher. O pénis vai perdendo vigor, encostado ao ombro suave dela. A rata exala um odor ainda excitante e deixa cair dois pingos sobre o pescoço dele. Ao respirar fundo, eles fazem uma introspecção sobre o que os une.
- Ainda consegues aguentar... - solta Helena.
- É só porque o consegues fazer tão bem.
- Ainda gostas que eu te chupe?
- Tanto como gosto de comer a tua flor.
- Eu notei... Foi tão bom... É sempre bom, Rodrigo. Como a primeira vez que o fizeste.
- A tua ratinha também ainda tem o mesmo sabor...
- A sério?....Amor, já não tenho o corpo de uma menina...
- Ainda bem...senão irias pedir que também tivesse o mesmo sexo imponente do que quando me conheceste.
- E ainda tens...
- Somos uns velhos à procura do que já não temos.
- Talvez...mas eu gosto que ainda gostes de mim.
- Eu amo-te, Helena.
- Vou fingir que acredito...
- E adormeces comigo?
- Para sempre...
Hipocrisia. Na mente sobreposta de cada um dos dois, há uma enorme sensação de hipocrisia e falsas confissões à solta. Ainda assim, há uma enorme vontade de manter uma relação, quer física, quer sentimental, na base de um desejo que de facto ainda existe. Não é exclusivo, mas ainda existe. Reflecte-se em pequenos gestos de paixão que nunca são descurados nem pelo marido nem pela esposa. Incide sobre o amor que procuram sentir pelos filhos, não obstante os erros cruéis que se misturam. Transparece na sensação de uma relação sólida, frutífera e rentável. Talvez os vizinhos até saibam que cada um deles é infiel. Mas nenhum inquilino do Edifício pode negar o sorriso que os quatro membros da família solta quando sai do 1º esquerdo.
Há um ruído que vem de fora do quarto. O filho mais novo acaba de chegar a casa e sabendo que os pais estão no quarto, aproveita para ligar a televisão e pegar no comando da consola de jogos. Perante as circunstâncias, Helena e Rodrigo concluem a sua noite. Irão adormecer num abraço fraterno e entrar conjuntamente num sonho tranquilizante. Mas no final de tudo isto, a pergunta irónica que se coloca é: Se é tudo tão intenso e perfeito, que razão existe para trair um casamento?

5 comentários:

Sarah disse...

Os anos passados juntos, a rotina, as responsabilidades, o dia-a-dia... ou simplesmente a necessidade de algo novo?
beijo doce

Lize disse...

Em relação à pergunta, concordo com o que a Sarah disse... Principalmente a parte da necessidade de algo novo, de aventuras... Talvez até é possível que seja o facto de nós humanos termos que estragar aquilo que está bem... às vezes parece que não resistimos ou assim... O que é estranho.
Gostei especialmente dos dois parágrafos em que começas com "Fellatio" e "Cunnilingus" e acabas com "..., sim senhora." e "..., sim senhor."
O 1º esquerdo não é o meu apartamento favorito, mas a história de vida deste casal põe-me sempre a pensar imenso.
Quanto ao que disse no último comentário em relação a um misterioso Edifício Magnólia numa bela de uma cidade Portuguesa, não, ainda não lá entrei porque... eu vivo nos Estados Unidos :P O meu amigo é que reparou e disse-me, mas por acaso já fizemos planos de ir lá dar um saltinho dentro de poucos dias quando voltar a Portugal. ;) Vamos lá ver o que por lá encontro... :P

Beijocas

luafeiticeira disse...

Talvez a razão que os leva a trairem-se não seja exterior, mas esteja dentro da personalidade de cada um, talvez eles se traiam como trairiam ouras pessoas se namorassem/vivessem com pessoas diferentes e talvez seja essa forma de ser que leva à procura do prazer em outras pessoas que os ligua, pois no fundo eles, nesse aspecto, são iguais.
beijos

Magnolia disse...

SARAH, decifrando as tuas respostas ou até qualquer uma que se possa dar, o que é dificil de entender é porque é que se tenta tornar tudo perfeito...
LIZE, ainda bem que gostaste dos dois parágrafos. Uma pequena brincadeira narrativa. Sim, é mesmo possivel que os humanos gostem de estragar aquilo que está bem, que tenham apetência para o drama e para pôr em causa aquilo que se quis tornar esplêndido. Acho que os humanos se aborrecem facilmente da harmonia e bem estar. Talvez assim seja...
Nos Estados Unidos haverá certamente um Magnolia Building, ou algo semelhante.
LUA FEITICEIRA, em vários aspectos Helena e Rodrigo são iguais. E isso reflecte-se nas opções que tomam. Nos desejos que idealizam. Nas atitudes que reflectem. Talvez seja a personalidade, mas a busca por algo de novo a nivel exterior ajuda à procura de novas aventuras.
beijinhos

Shelyak disse...

Helena e Rodrigo...sem dúvida, os meus preferidos...:)