terça-feira

1º Direito

Do lado oposto do apartamento onde o casal infiel vive há seis anos, estava uma fracção desabitada. Pertence a um gerente bancário que possui três imóveis na cidade. O seu investimento é alugar os apartamentos para rentabilizar o investimento que efectuou. O 1º Direito do Edifício Magnólia foi adquirido há oito anos e desde então estava arrendado a uma senhora reformada que subitamente faleceu. Estava. No momento em que Maria José abre a porta do apartamento, a casa volta a estar habitada. A brisa que traz o vazio, o odor que relembra que a casa precisa de uma limpeza e escuro misturado no silêncio são as segundas sensações que a professora universitária recolhe. A primeira é um enorme alívio.
Maria José conseguiu na semana passada a oficialização do divórcio com o homem que moldou a sua vida durante vinte e dois anos. Agora que a mulher de 46 anos procura o interruptor para acender alguma luz, um arrepio atravessa-lhe a espinha. Uma nova vida está a recomeçar. Como se hoje ela voltasse a ter dezoito anos.
A mulher percorre as paredes e tarda em encontrar um interruptor que lhe traga luz. A noite já tinha caído e é impossível ter um fio luminoso que fosse. Os estores estão fechados e o cansaço vai-se apoderando do seu corpo. Na mão direita, Maria José carrega uma mala com as roupas que conseguiu trazer da casa que partilhou com o ex-marido. Tudo o resto que lhe pertence de alma e coração será recuperado num outro dia. Hoje serve apenas para respirar fundo e esquecer que um dia se julgou feliz. A professora de Psicologia de Aprendizagem não pode ter filhos. Após um ano de variadas tentativas, um médico conceituado informou-a que apenas um milagre faria nascer em si o milagre da vida. O ex-marido nunca aceitou a infertilidade da companheira que jurou amar na saúde e na doença. E durante todo o casamento, a humilhação e convicção de que o problema estava nela, feriram de morte a estima de Maria José. O divórcio, a saída de casa e a chegada ao Edificio Magnólia, é sem sombra de dúvida a porta de saída urgente da mulher. Após uma infrutífera tentativa de encontrar o quadro eléctrico, dirige-se ao primeiro quarto que encontra com uma cama e deita a mala para cima do colchão. Sem electricidade, ela ainda pensa se liga para o homem que lhe entregou a casa para arrendar, mas a hora já é tão avançada que é inusitado tal contacto. O único artefacto que lhe permite oferecer alguma luz é o telemóvel, com a luminosidade libertada do ecrãn. Maria José parece presa à escuridão no seu novo lar. As forças que lhe restam apenas lhe permitem tirar lençóis lavados da mala e fazer apressadamente a cama. Às apalpadelas no escuro, a mulher usa a casa de banho rapidamente e a última coisa que se recorda no fim deste dia longo é de cair na cama e cerrar os olhos. O longo sonho eleva-lhe o espirito numa brisa de felicidade vazia.

A manhã acorda na face de Maria José com a luz que provém da pequena casa de banho privada do quarto. A sua pele branca mas ruborizada, suave mas queimada da idade, respirava um novo amanhecer. Uma madeixa do seu cabelo castanho alourado curto colava-se aos seus lábios finos. Ela acorda e a primeira coisa que faz, mesmo antes de ligar o quadro, mesmo antes de abrir os estores, é enfiar-se no chuveiro que lhe permite tomar o primeiro duche das últimas trinta horas. Maria José não fugiu. Maria José não se escondeu. Maria José procurou apenas levantar-se e impedir que por mais uma vez o seu ex-marido a convencesse a ficar. Sozinha na casa, ela limpa-se delicadamente com a toalha e saboreia a nova cor do seu corpo. Vai para o quarto e veste umas cuecas limpas. Agora sim, ela tinha tempo de ir ligar o quadro e abrir os estores. Volta ao hall de entrada com a toalha segura na mão, quando sente o trinco da porta da sua nova casa a abrir. O tempo de reacção permite-lhe apenas colocar a toalha branca defronte do seu peito desnudado. Vindo do corredor do Edificio, o senhorio entrou sem aviso em casa. Existe um silêncio pertubador entre ambos. Mantém-se uma troca de olhar intensa e que ultrapassa o brilho da retina de cada um. Os olhos verdes de Maria José silenciam por fora mas explodem no seu interior. Defronte de si, está o proprietário do 1º Direito. À frente da toalha que protege o corpo da mulher está o seu cunhado, viúvo da sua irmã mais velha.
Ele bem procurou justificar-se com o facto de ter batido à porta, de ter visto que os estores estão fechados e de ter pensado que ela ainda não tinha chegado a casa. Mas Maria José tem a alma arrebatada. A entrega do corpo de Maria José ao seu cunhado é apenas uma questão dos gestos que se seguem num curto espaço de segundos. Foi o dono do 1º dto que convenceu a professora a deixar o ex-marido. Foi ele que lhe entregou as chaves para quando ela precisasse. Foi aquele homem de cinquenta e dois anos, humilde e cativante que despertou uma nova paixão em Maria José. Por mais ousado que isso pareça. A toalha branca caiu no chão...
Novamente na cama, o corpo despido do homem já cobriu a fragilidade das formas dela. Ouvem-se os sussurros libertados dos lábios dele. Os gemidos dela sopram nos ouvidos do amante. As mãos inseguras dela seguram-se às costas protectoras dele. E aquilo que Maria José sente dentro de si é mais do que o sexo dele a preencher a sede do seu desejo. Ela sente cada pedaço do seu corpo a libertar-se. A sua pele cola-se ao fulgor fisico dele. Os seus seios rosados excitam-se a ponto de chamarem pela boca dele, com os mamilos a despontar. As suas pernas entrelaçam-se na cintura do seu novo senhorio. Maria José entrega-se de corpo e alma ao sol que acorda o seu novo despertar. E o seu orgasmo é um grito de felicidade exacerbada. Ela não está a sentir. Está a sonhar. Porque o sexo do seu cunhado cresce dentro de si e diverte o seu ego. Alimenta a sua paixão. Preenche a sua necessidade de ser amada. O homem apodera-se da lingua da cunhada, assim que ela exprime o êxtase da cópula emergente. Num beijo longo, Maria José abraça-se ao homem que significa tudo para si, menos a realidade. Ele não é o seu cunhado. Ele não é o pedaço de memória que restava da sua irmã. Ele não é o seu novo senhorio. O homem, que volta a arrendar o 1º Direito do Edificio Magnólia... era o anjo erótico dos sonhos mais vibrantes de Maria José.




9 comentários:

Moçoila* disse...

Ideia super original!

Estou anciosa pelos próximos capítulos, afim de tentar descobrir qual a história da vida real!

Gostei!

Beijinho

joana.c disse...

Parabéns, vai prender qualquer um ao ecran. Muito bem!
Bjos

Magnolia disse...

A pouco e pouco revela-se cada porta, cada fantasia, cada pedaço de uma qualquer vida possivelmente real. Obrigado a quem já procurou descobrir. Espero que mais do que prender, possa entusiasmar activamente quem aqui passe JOANA

Red Light Special disse...

Estou arrepiada... completamente!
Parabéns!!!

Shelyak disse...

E vou espreitando em cada porta, plena de vida...
:)

Anónimo disse...

Diz-me a intuição que é esta a história verdadeira :-)
Mas vou continuar a ler.

Ana disse...

Acho que este vai ser o meu apartamento favorito.

Sexhaler disse...

Ouvi alguém dizer, um dia, que nunca é tarde para começar a viver...

Beijo

Cristina Paulo disse...

Ainda não visitei os outros andares mas será sem dúvida um dos meus preferidos :)
bjos meus